O grau de civilidade do município afere-se por uma série de fatores. Um deles, o que seus moradores fazem com aquilo que descartam. Em regra, o brasileiro desperdiça muito. Joga fora algo que tem valor e que poderia reverter em benefício da coletividade. Sinal de parca educação. Nem se fale em educação ambiental. Falta é aquela educação de berço, que antigamente era transmitida pelas mães zelosas e que produziam gerações conscientes e éticas.
A sujeira é uma característica das cidades brasileiras. O povo não tem noção de que o custo da varrição e da coleta do lixo é dinheiro desviado de outras destinações mais nobres. O Poder Público não fabrica recursos financeiros. Ele funciona à base daquilo que arrecada. Uma comunidade ajuizada cuidaria de contribuir para que o montante amealhado com a tributação atendesse, prioritariamente, a questões como educação, saúde, mobilidade e moradia. Não é, infelizmente, o que acontece.
Ouve-se um rumor constante de queixas em relação a lugares imundos. Em pleno centro das cidades. Cobrança à Prefeitura, que tem de fazer sua parte. Mas existe cobrança idêntica à população?
Reportagem de Fernanda Mena (FSP, 28.1.25) noticia que, a cada dia, o equivalente a seis caminhões de lixo são lançados na bacia do Alto Tietê. O volume de resíduos sólidos arremessados diariamente é de cinquenta e oito toneladas. Isso gera problemas de saúde, ambientais e agravamento do flagelo ocasionado pelas emergências climáticas.
Joga-se de tudo diretamente nos córregos e afluentes, mas também neles chegam o descarte irregular. Aquilo que as pessoas acreditam já não sirva para nada, vai entupir bueiros, causar enchentes e poluir as águas, pois ali se decompõem. O gesto insano de arremessar ao chão uma embalagem, diante da dimensão demográfica desta insensata conurbação, vai produzir prejuízos incalculáveis.
O recolhimento do lixo flutuante, apenas no trecho de vinte e cinco quilômetros do Rio Pinheiros, afluente da Bacia do Alto Tietê, significou o montante de setenta e sete mil toneladas, desde janeiro de 2023, ao custo de cento e quarenta milhões de reais.
Retira-se do Pinheiros, que já foi apontado como o exemplo de requalificação, o equivalente a duas piscinas olímpicas diárias de sujeira. Em dois anos, houve retirada de quase três milhões de metros cúbicos de imundície, ou sejam, cento e oitenta e cinco mil caminhões que, enfileirados, iriam de São Paulo ao Uruguai.
É imperativo que as empresas concessionárias do serviço de varrição e coleta cumpram o seu papel de conscientizar a população, assim como aprimorem a prestação fazendo com que a faixa ainda não atendida venha a sê-lo. Mas a responsabilidade é de todos. As pessoas são ácidas em críticas, mas muito acomodadas em mudança de atitude. Lastimável constatar que pessoas ditas escolarizadas, eruditas até, sejam cúmplices dessa exagerada produção de resíduos sólidos.
Existem organismos internacionais que estudam exclusivamente o descarte do resíduo orgânico. É incrível que, a cada dia, um bilhão de toneladas de alimentos manipulados, a comida cozida que sobra nos pratos de pessoas que se dizem educadas, mas que não hesitam em jogar alimento no lixo, sejam descartados.
Mais um sintoma da enfermidade social que acomete a humanidade. Milhões passam fome, outros milhões desperdiçam comida pronta para o consumo. Dessa quantidade absurda, calcula-se que oitenta por cento provenha do âmbito doméstico. O costume de colocar no prato uma quantidade muito maior do que aquela que será consumida. Sem qualquer remorso, essa comida vai parar no lixo.
O problema é que o resíduo orgânico é emissor de gases causadores do efeito estufa, em grau de moléstia até superior aos emitidos pelos automóveis. Problema climático, portanto.
Enquanto não houver comoção nacional, para que a excessiva produção de resíduos sólidos seja encarada como enorme problema, as coisas continuarão como estão. Cidadania pronta a criticar, mas omissa em mudar seus hábitos. Em educar suas proles como pessoas que cultivam a limpeza, a higiene e se preocupam com o futuro da humanidade.
O mundo, aos poucos, vai se convertendo numa esfera suja, coberta de coisas que desperdiçamos e que não aproveitamos na economia circular, embora exista lei de logística reversa. Quando já não se puder mais respirar, talvez as pessoas acordem. Será que existem inocentes que não enxerguem o que estamos fazendo com a nossa única morada? Chego a duvidar, muitas vezes, de que os humanos são racionais e superiores aos demais animais.