O Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), veiculado pela Lei nº 14.148/2021, foi instituído com o objetivo de mitigar as perdas decorrentes do efetivo estado de calamidade pública trazido pela disseminação da COVID-19 às pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos, assim definidas como aquelas que exercem, por exemplo, atividades de realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, hotelaria em geral, administração de salas de exibição cinematográfica e prestação de serviços turísticos.
Dentre as medidas, destaca-se a redução a 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, a contar de 18 de março de 2022, das alíquotas do IRPJ, da CSLL, bem como das contribuições PIS e COFINS, incidentes sobre as receitas e os resultados relativos a estas atividades.
Ocorre, entretanto, que, com a promulgação da Lei nº 14.859/2024, foi estabelecido um novo critério para o fim do programa: sua extinção a partir do mês subsequente àquele em que demonstrado, pelo Poder Executivo, que o seu custo orçamentário acumulado atingira o valor máximo de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais).
Seguindo estas prescrições, a RFB atestou, por meio do Ato Declaratório Executivo (ADE) nº 02/2025, que o benefício fiscal em comento tinha atingido o limite orçamentário no mês de março do ano em curso, razão pela foi declarada a sua imediata extinção, a partir do mês de abril de 2025.
Diante desta notícia, vem sendo ventilada a impossibilidade de revogação do benefício antes do prazo de 60 meses originalmente previsto para a sua vigência, sob o argumento de que isenções concedidas por prazo certo e sob condições específicas não podem ser alteradas antes do prazo estipulado, nos termos do art. 178 do CTN.
Nos parece, contudo, que a extensão do PERSE até março de 2027 esbarra na interpretação que o Judiciário vem dando ao termo “determinadas condições” previsto no CTN, que, como visto, vem a ser um dos requisitos aptos a impedir a revogação imediata de benefícios fiscais concedidos por prazo determinado.
Isto porque, ao se pronunciar sobre o tema, o STJ se posiciona no sentido de que somente benefícios fiscais que estabeleçam contrapartidas onerosas para o seu usufruto devem ter seus prazos de concessão respeitados, o que não se verifica na hipótese do PERSE, que tão somente lista os contribuintes aptos ao programa (que exerçam as atividades ali especificadas e possuam cadastro no CADASTUR), afastando sua concessão em caráter geral. Logo, embora concedido por prazo determinado, o programa não se caracterizaria como uma isenção condicionada/onerosa para os fins que ora se analisa.
Por outro lado, entendemos que a revogação do benefício não pode ser imediata, sob pena de afronta ao princípio da anterioridade tributária, por implicar em aumento indireto de tributos.
Decerto, princípio da anterioridade busca concretizar a segurança jurídica, assegurando a previsibilidade da relação fiscal, de forma a evitar que o sujeito passivo seja surpreendido com um aumento súbito de encargo, sem que lhe seja oportunizado um lapso temporal para a realização de um mínimo planejamento financeiro.
Nesse sentido, inclusive, foi o recentíssimo posicionamento do Superior Tribunal Federal (STF), que, ao analisar, em sede de Repercussão Geral, caso concreto em que houve revogação de benefício fiscal ofertado sem a exigência de contrapartidas para o contribuinte, relativo à redução de base de cálculo de tributo, fixou a seguinte tese: “O princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal, se aplica às hipóteses de redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais que resultem em majoração indireta de tributos, observadas as determinações e as exceções constitucionais para cada tributo” (RE nº 1.473.645 – Tema 1.383/STF).
Nesta ordem de ideias, consideramos possível defender, com boas perspectivas de êxito, que a revogação da redução das alíquotas a 0% (zero por cento), sob a égide do PERSE, só pode ocorrer a partir de (i) 01 de julho do ano em curso para a CSLL, o PIS e a COFINS e (ii) 01 de janeiro de 2026 para o IRPJ.
Embora não seja o cenário desejado, a aplicação da anterioridade gerará um impacto menor nas perdas experimentadas por um setor fragilizado, que havia se planejado para recuperar o cenário devastador ocasionado pela COVID-19 com a exoneração de tributos até 2027. Perde-se confiança na política pública e deposita-se um mínimo de esperança no bom sendo e na razoabilidade do Judiciário!