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Opinião | ‘Fit cultural’: onde termina a cultura organizacional e começa a discriminação política?

Há uma linha tênue entre assegurar o alinhamento cultural e cair na armadilha da discriminação. Essa linha é cruzada quando, no recrutamento, candidatos são excluídos com base em características protegidas por lei, como raça, gênero, idade, orientação sexual, deficiência, crenças religiosas e convicções políticas

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Por Adriana Maria Silva Cutrim

A busca pelo “fit cultural” tornou-se uma prática comum no recrutamento e seleção nas empresas modernas, onde a ideia é contratar pessoas cujos valores e comportamentos estejam alinhados com a cultura organizacional. O fit cultural pode ser definido como a compatibilidade entre os valores, crenças e atitudes do indivíduo com os valores, crenças e atitudes da organização.

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À primeira vista, essa estratégia parece lógica para garantir um ambiente de trabalho harmonioso e produtivo. Empresas que valorizam o fit cultural argumentam que isso leva a maior satisfação no trabalho, menores taxas de rotatividade e melhor desempenho das equipes.

Contudo, há uma linha tênue entre assegurar o alinhamento cultural e cair na armadilha da discriminação. Essa linha é cruzada quando, no recrutamento, candidatos são excluídos com base em características protegidas por lei, como raça, gênero, idade, orientação sexual, deficiência, crenças religiosas e convicções políticas.

É cada vez mais preocupante o uso do fit cultural como uma ferramenta para discriminar candidatos com base em suas convicções político-partidárias. Em um cenário polarizado, recrutadores podem, consciente ou inconscientemente, favorecer candidatos cujas visões políticas estão alinhadas com a liderança da organização, excluindo aqueles que têm convicções políticas diferentes.

Quando o fit cultural se torna uma justificativa para excluir pessoas com base nas suas convicções políticas, estamos diante de práticas discriminatórias e sujeitará a empresa a diversas consequências jurídicas e reputacionais.

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A atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT) no combate a esse tipo de discriminação é rigorosa, tendo como prerrogativa a defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores quanto a sua liberdade de convicção política e assegurar a defesa do próprio regime democrático. Uma das consequências diretas é a imposição de altas indenizações. Essas sanções financeiras visam reparar os danos morais coletivos causados à sociedade, além de servirem como um mecanismo dissuasório contra a perpetuação de tais práticas discriminatórias.

Para evitar que a busca pelo fit cultural se transforme em discriminação por orientação política, é necessário que as empresas compreendam a importância de respeitar o pluralismo político e a diversidade de opiniões.

Para que isso seja alcançado, é essencial que a cultura organizacional seja baseada em valores como respeito, integridade e inclusão, em vez de uma cultura de homogeneidade de pensamentos e interferências nos direitos e garantias fundamentais dos trabalhadores.

Para isso, as organizações devem implementar políticas claras que proíbam a discriminação com base em orientação política, além de adotar práticas de recrutamento inclusivas. Neste sentido, o treinamento em viés inconsciente é uma excelente ferramenta para capacitar gestores e recrutadores a reconhecer e mitigar seus próprios preconceitos, garantindo que as decisões de contratação sejam baseadas em critérios justos e relevantes para o desempenho da função.

Diversificar as equipes de recrutamento é outra medida importante, pois equipes diversificadas são mais propensas a reconhecer o valor da diversidade e evitar a discriminação.

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Ao avaliar candidatos, deve-se concentrar nas competências e nas habilidades para o exercício da função. Não é válido fazer perguntas tendenciosas. As perguntas feitas durante as seleções devem ser direcionadas apenas para avaliar as suas competências para desempenhar a função, jamais para identificar dados sensíveis tais como, inclinações político-partidárias, orientação sexual ou crenças religiosas. Tal prática assegura que as decisões de contratação sejam justas e focadas nas competências necessárias para a posição, evitando qualquer tipo de discriminação ou exclusão baseada em características pessoais.

Promover uma cultura organizacional de respeito aos direitos e garantias fundamentais dos trabalhadores é essencial para criar um ambiente onde todos, independentemente de suas diferenças, sintam-se valorizados e incluídos.

Em suma, o fit cultural pode ser uma ferramenta poderosa para construir equipes coesas e produtivas, mas deve ser usado dentro das balizas legais, sob pena de promover discriminação.

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Adriana Maria Silva Cutrim
Procuradora do Ministério Público do Trabalho há 12 anos. É procuradora designada para atuação integrada do sistema de justiça para o enfrentamento ao assédio eleitoral nas eleições de 2024, em São Paulo. É vice-coordenadora da Coordenadoria da promoção da igualdade e eliminação da discriminação no trabalho da Procuradoria Regional do Trabalho da 2.ª Região, em São Paulo. Foto: MPT/Divulgação
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