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Opinião|Funcionalismo penal e a política pública criminal processual

O funcionalismo tem como foco a proporcionalidade, e entende que o Direito Penal deve proteger o cidadão vítima de crime e a sociedade como um todo. E não apenas o criminoso. Logo, eventuais nulidades apenas podem ser decretadas se provado o prejuízo e quando o delito não for de gravidade e relevância social

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convidado
Por Andre Luis Alves de Melo

O funcionalismo penal é uma doutrina desenvolvida na Alemanha, na década de 80, e que todos os países democráticos do mundo adotaram a partir da década de 90, menos no Brasil.

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Nas faculdades de Direito apresenta-se dogmas como no sentido de que o Direito Penal pode ser aplicado de forma dissociada da ideologia política. No entanto, até mesmo a religião influencia no Direito Penal, um exemplo clássico é que se tocar de forma libidinosa em uma mulher provavelmente será estupro com pena alta, mas se espancar a mulher, sem fim libidinoso, esta pena será bem, isso é fruto de uma concepção popular e religiosa, ligada ao pecado capital. Não se defende reduzir a pena por estupro, mas aceitar a pena de 01 ano para quando se bate em mulher, enquanto para cachorros e gatos é de 02 anos, é um contrassenso muito grande.

Portanto, de forma bem resumida, na área de Direito Penal existe 03 ideologias mais dominantes, e que são tratadas como meras “correntes” de termos jurídicos. Porém, por trás das mesmas há forte viés ideológico e cultura.

No Brasil ainda prevalece o finalismo, uma ideologia (corrente) desenvolvida na década de 60 na Alemanha. que prega uma atuação ontológica, neutra no Direito Penal, mais dogmática, e que entende que o Direito Penal não atua na área de segurança pública, ou seja, um divórcio entre Direito Penal e Segurança Pública. Na prática acaba visando uma atuação automatizada e burocratizada, o que é agravada pelo mito da obrigatoriedade da ação penal (na prática obrigatoriedade da denúncia, o que fomenta o mercado para a Defesa, a qual alega punitivismo, mas não discute a obrigatoriedade). Um viés do finalismo é que no Brasil os operadores focam em conceitos abstratos e têm que decorar conceitos para passar em concursos em vez de casos concretos no ensino. Logo, decora-se, em lugar de refletir sobre os conceitos, mitos e dogmas. Por isso, finalistas acham que Fucionalismo é apenas Teoria da Imputação Objetiva, e também acham que princípio da insignificância é decorrente do garantismo, mas na verdade este último foi desenvolvido por Roxim, funcionalista. Lado outro, finalistas focam em conceitos terminológicos, logo não pensam sobre a dimensão dos fenômenos. Como ao focarem no conceito de ação penal, e restringindo a palavras que precisam ser decoradas, e não a ação penal como instrumento de política processual de segurança pública. O finalismo usa máscaras conceituais como ficar discutindo local de culpa e dolo no conceito doutrinário de crime, conforme lição de Welzel. Mas sua amplitude é muito maior, pois é uma ideologia que prega o processo penal como fim em si mesmo, Seria como aquele profissional de saúde que fica discutindo se a porta da UTI deve abrir para a direita ou para a esquerda, enquanto pessoas morrem por falta de atendimento. É a atuação burocrática, e geralmente são felizes, pois não se sentem responsáveis pelos resultados, pois apenas focam nos conceitos e normas, ainda que administrativas. Na verdade, o grande objetivo do finalismo foi corroborar a separação entre o Direito Penal e Segurança Pública, o que é tão razoável como separar a atuação médica da saúde pública, mas é visto com naturalidade no meio jurídico, onde se alega que apenas o Legislativo votando as leis criminais e o Executivo, através de Policiais, é que podem fazer política de segurança pública. E não o meio jurídico. No entanto, policiais podem ser filiados a partidos políticos, enquanto juízes e promotores não podem ser filiados a partidos políticos, sob pena de perda do cargo. O que leva a crer que tal restrição é porque têm a atribuição e possibilidade de se fazer política pública processual na fase jurídica do Direito Penal, o que será abordado a seguir, ainda que resumidamente, em razão do espaço jornalístico.

Noutro giro, temo o garantismo penal, uma ideologia que romantiza os seus objetivos com supostos axiomas científicos, mas que na verdade tem o mote de Estado opressor e criminoso vítima da sociedade e do Estado policial, logo o Direito Penal deve proteger o criminoso (minoria oprimida e forçada a cometer crimes por oposições sociais) e não proteger a sociedade. Para se ter ideia do forte viés ideológico desta doutrina, basta dizer que na Itália onde reside o responsável por essas ideias não o venera como no Brasil e América do Sul. E alegam que em um país que povo vive sob o medo de Máfia e Terroristas, o Estado tem que proteger é o povo e não os criminosos, embora o processo penal italiano ainda seja um dos mais lentos da Europa e com muita prescrição, porém melhorou um pouco a partir da década de 90. Recentemente o Pai do Garantismo foi o protagonista que buscou o julgamento do Brasil em um Tribunal Internacional de natureza ideológica, o qual em vez de julgar Cuba, :Coreia do Norte, China e seus aliados, preocupou-se em julgar o Brasil sobre como funciona o nosso sistema de saúde. Este Tribunal tem a mesma representatividade de um júri simulado em Escolas de Direito. E para finalizar, esta ideologia adentrou pelo sul do país, por onde tentaram impor o Direito Alternativo, e com apoio de Jurista da Suprema Corte Argentina, o qual aposentou e filiou ao Partido Comunista daquele país. Mas, nas faculdades de Direito, esta ideologia é ainda estudada como uma inocente e pura corrente jurídica, e vem encantando Tribunais, notadamente os quais são compostos por Operadores do Direito que nunca tiveram contatos com processos criminais em instâncias iniciais, logo têm uma tendência a decretar nulidades por firulas processuais como garantia do acusado, ou seja, do criminoso. Um detalhe interessante é que o garantismo é focado em “garantias processuais”, logo como é de origem italiana sutilmente prega que se processe para no curso aplicar as garantias processuais. O Garantismo é conhecido mais é na Itália, e mesmo assim, como corrente filosófica e não jurídica. Já nos demais países da Europa é praticamente desconhecido, apesar da quase geralmente são felizes, pois não se sentem responsáveis pelos resultados, pois apenas focam nos conceitos e normas, ainda que administrativas. Na verdade, o grande objetivo do finalismo foi separar o Direito Penal da Segurança Pública, o que é tão razoável como separar a atuação médica da saúde pública, mas é visto com naturalidade no meio jurídico. Em que se alega que apenas o Legislativo votando as leis criminais e o Executivo, através de Policiais, é que podem fazer política de segurança pública. E não o meio jurídico. No entanto, policiais podem ser filiados a partidos políticos, enquanto juízes e promotores não podem ser filiados a partidos políticos, sob pena de perda do cargo. O que leva a crer que tal restrição é porque têm a atribuição e possibilidade de se fazer política pública processual na fase jurídica do Direito Penal, o que será abordado a seguir, ainda que resumidamente, em razão do espaço jornalístico. Os garantistas no Brasil demonizam o funcionalismo deturpando os conceitos como Direito Penal do Inimigo, e alegando que o funcionalismo é para a Europa. No entanto, em aula com Jakobs este explicou que o Inimigo não é qualquer criminoso, mas aquele que gera risco enorme para a sociedade, como o Terrorista, o Mafioso, não basta o enquadramento no tipo penal, é necessário que haja um risco ao ordenamento jurídico. Por falar em terrorista, com um olhar mais aguçado é possível constatar que Hamas é até visto como grupo legítimo de libertação, por alguns setores e partidos políticos no Brasil, e vejam como são ligados ao autor do Teoria do Garantismo na Itália, e será um caminho importante para desnudar a face oculta do garantismo, inclusive quando confrontados, os garantistas querem penas longas e processos rápidos, sem recursos, sem separação com acusação, e outras regras básicas do processo penal.

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Atualmente tem prevalecido no mundo o Funcionalismo penal, o qual ainda vem tendo uma fase inicial no Brasil, mas já está consolidado em praticamente todos os países. No entanto, alguns finalistas, de forma cômoda, alegam que o funcionalismo é uma corrente alemã e que não serve ao Brasil. No entanto, esquecem-se de que o finalismo é de origem alemã também. O funcionalismo tem como foco a proporcionalidade, e entende que o Direito Penal deve proteger o cidadão vítima de crime e a sociedade como um todo. E não apenas o criminoso. Logo, eventuais nulidades apenas podem ser decretadas se provado o prejuízo e quando o delito não for de gravidade e relevância social. O funcionalismo é considerado como um avanço do finalismo, e não algo criado do nada. Inicialmente, na década de 80, desenvolveu-se através do princípio da insignificância material de crime por Roxin. Ou não basta ter a tipicidade meramente formal. Isso deu-se em razão do mito da obrigatoriedade da ação penal, afinal se fosse crime teria que se processar, o que é mito, embora chamado de “Princípio”, mas nem mesmo existe desde o começo para ser princípio, uma vez que surgiu na década de 40, sendo que antes e por séculos vigorou o princípio da oportunidade da ação penal (este de fato desde o começo, logo princípio). Porém, o próprio funcionalismo evoluiu de si próprio, e desenvolveu o conceito de insignificância processual, ou seja, mesmo sendo crime, mas em casos de que não há habitualidade criminosa ou violência contra a pessoa, pode-se fundamentadamente deixar de ajuizar a ação, como política pública processual fundamentada. Claro que a lei pode restringir estas hipóteses, mas não precisa de lei, ou seja, se não existir lei o limite seria justificado no caso concreto, como era na França, até que estabeleceu uma lei prevendo as hipóteses. Em suma, é crime, mas não justa causa para uma ação penal. O que é até mais fácil de se compreender do que dizer que furtar material de pouco valor não é crime. Afinal, é mais fácil alegar que o furto também é crime, mas irá priorizar o ajuizamento de causas de estupro, homicídio, roubos e outros delitos mais graves. No início o funcionalismo alegava, em regra, a baixa reprovabilidade ou ofensividade para ser crime. Mas, atualmente, sustenta que é crime, mas é baixa ofensividade para ajuizar ação penal. E não se pode confundir este termo ajuizar ação penal, com o conceito mais estudado de “ação penal”, como fato (ou ato) típico, antijurídico, culpável (e punível, para alguns), pois aspectos diferentes, apesar do nome similar. Para o funcionalismo prevalece a oportunidade da persecução penal (denúncia e acordos penais), e não obrigatoriedade (inclusive de acordos), podendo haver arquivamentos por questão de prioridade de pauta de audiências, em casos de crimes sem violência física ou grande risco, é também conhecido como racionalidade e eficientismo. Um dos resultados é menor mercado de trabalho para a Defesa, há menos processos criminais ajuizados e também menor risco de prescrição. No Brasil, temos em torno de 60% de prescrição, o que é um custo algo, mas a Defesa acaba tendo este mercado para atuar, ou seja, usar do acúmulo processual para se esperar prescrição, mas com defesa já contratada pelo réu.

Em cursos realizados por este subscritor na Europa, um na Itália e outro na Alemanha, foi perguntado diretamente a Roxin se este conhecia a teoria de Ferrajjoli, e este afirmou que não. Mas, ao se perguntar também diretamente a Ferrajoli se ele conhecia a teoria de Roxin, este afirmou que sim. Portanto, o funcionalismo é a doutrina dominante na Europa e não o polêmico e o garantismo, o qual tem sido usado no Brasil para garantir a impunidade.

Um aspecto relevante é que a insignificância processual praticamente rompeu com o mito da obrigatoriedade da ação penal (na prática obrigatoriedade da denúncia ou dos acordos penais, pois ambos integram a persecução penal).

Por fim, o funcionalismo penal merece ser aprofundado mais no Direito brasileiro tendo a justa causa para ajuizar e tramitar ações penais como mecanismo de política criminal processual pelo Ministério Público e Judiciário e triagem, buscando maior eficiência, e já foi adotado e provado com eficiência na Europa e demais países da América do Sul, sem gerar impunidade e dando maior segurança à população em vez de atender aos interesses do criminoso.

Este texto reflete a opinião do(a) autor(a). Esta série é uma parceria entre o blog do Fausto Macedo e o Movimento do Ministério Público Democrático (MPD). Os artigos têm publicação periódica

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Andre Luis Alves de Melo
Promotor de Justiça em MG, doutor em Processo Penal Constitucional pela PUC SP e associado do MPD – Movimento do Ministério Público Democrático. Foto: MPD/Divulgação
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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

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