A pena imposta pela juíza Gabriela Hardt ao ex-presidente Lula no caso do sítio de Atibaia (SP) supera aquelas impostas pelo ex-juiz federal Sérgio Moro e pelos desembargadores da 8.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), o Tribunal da Lava Jato - ambas no caso do triplex do Guarujá. A magistrada condenou o ex-presidente a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro.
Em julho de 2017, Moro, então juiz federal e responsável por todas as ações da Lava Jato em primeiro grau, impôs ao ex-presidente 9 anos e seis meses de prisão no caso triplex. A pena foi aumentada, em janeiro do ano passado, para 12 anos e um mês pelo TRF-4.
Lula está preso na Polícia Federal em Curitiba desde 7 de abril do ano passado, cumprindo a pena do Tribunal da Lava Jato.
Na sentença de 360 páginas, Gabriela Hardt detalhou cada crime atribuído a Lula.
A magistrada condenou o ex-presidente por corrupção ativa pelo suposto recebimento de propinas em favor do PT pagas pela Odebrecht, crime de lavagem de dinheiro na reforma feita pela Odebrecht no sítio, crime de corrupção passiva pelo recebimento de R$ 700 mil em vantagens indevidas da Odebrecht, crime de lavagem de dinheiro na reforma feita pela OAS na propriedade e crime de corrupção passiva pelo recebimento de R$ 170 mil em vantagens indevidas da OAS.
A juíza absolveu Lula do crime de lavagem de dinheiro 'envolvendo a ocultação e dissimulação dos valores utilizados no custeio por José Carlos Bumlai nas reformas feitas pelo pecuarista no sítio de Atibaia'.
Gabriela Hardt extinguiu 'sem julgamento de mérito o feito em relação ao crime de corrupção ativa imputado a Luiz Inácio Lula da Silva pelo recebimento de vantagens indevidas da OAS relativas ao contrato Novo Cenpes em prol do Partido do Trabalhadores em razão da litispendência' (ocorre quando há ações com o mesmo fato) com o processo do caso triplex.
Na ação do sítio de Atibaia, o petista foi sentenciado por supostamente receber R$ 1 milhão em propinas referentes às reformas do imóvel, que está em nome de Fernando Bittar, filho do amigo de Lula e ex-prefeito de Campinas, Jacó Bittar. Segundo a sentença, as obras foram custeadas pelas empreiteiras OAS e Odebrecht.
Também foram condenados os empresários José Adelmário Pinheiro Neto, o Léo Pinheiro, ligado a OAS, a 1 ano, 7 meses e 15 dias, o pecuarista José Carlos Bumlai a 3 anos e 9 meses, o advogado Roberto Teixeira a 2 anos de reclusão, o empresário Fernando Bittar (proprietário formal do sítio) a 3 anos de reclusão e o empresário ligado à OAS Paulo Gordilho a 3 anos de reclusão.
A juíza condenou os empresários Marcelo Odebrecht a 5 anos e 4 meses , Emilio Odebrecht a 3 anos e 3 meses, Alexandrino Alencar a 4 anos e Carlos Armando Guedes Paschoal a 2 anos. O engenheiro Emyr Diniz Costa Junior recebeu 3 anos de prisão. Todos são delatores e, por isso, vão cumprir as penas acertadas em seus acordos.
Gabriela Hardt absolveu Rogério Aurélio Pimentel, o 'capataz' das obras do sítio.
A Lava Jato afirma que o sítio passou por três reformas: uma sob comando do pecuarista José Carlos Bumlai, no valor de R$ 150 mil, outra da Odebrecht, de R$ 700 mil e uma terceira reforma na cozinha, pela OAS, de R$ 170 mil, em um total de R$ 1,02 milhão.
Em interrogatório, Bumlai declarou não ter pago 'nem um real' nas obras. O sítio de Atibaia está em nome do empresário Fernando Bittar, filho de Jacó Bittar, amigo de longa data do ex-presidente.
Em depoimento, Fernando Bittar negou que tenha pago a obra. "Eu não sei dizer se eles (Lula e Marisa) pagaram. Mas na minha cabeça..."
Apontado por delatores como o homem de confiança do ex-presidente que tocou a obra do sítio, o ex-segurança de Lula Rogério Aurélio Pimentel afirmou ter sido o 'capataz' das reformas no imóvel e confirmou os pagamentos da Odebrecht.
Em alegações finais, a defesa do ex-assessor da Presidência da República afirmou que se ele 'não sabia sequer as quantias que continham nos envelopes, tampouco possa se esperar que soubesse de eventual origem ilícita dos valores'.
Ação
O sítio Santa Bárbara é pivô da terceira ação penal da Lava Jato, no Paraná, contra o ex-presidente - além de sua segunda condenação. O petista ainda é acusado por corrupção e lavagem de dinheiro por supostas propinas da Odebrecht - um terreno que abrigaria o Instituto Lula e um apartamento vizinho ao que morava o ex-presidente em São Bernardo do Campo. O processo também já teve a entrega de alegações finais e aguarda sentença.
Prisão
O ex-presidente já cumpre pena de 12 anos e um mês de prisão no caso triplex, em 'sala especial', na sede da Polícia Federal do Paraná, em Curitiba, desde 7 abril de 2018, por ordem do então juiz federal Sérgio Moro.
Lula foi sentenciado pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro envolvendo suposta propina de R$ 2,2 milhões da OAS referente às reformas do imóvel.
COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA ALBERTO ZAHARIAS TORON, QUE DEFENDE FERNANDO BITTAR
O criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende o empresário Fernando Bittar, condenado a 3 anos de reclusão no processo do sítio de Atibaia, disse que a sentença da juíza Gabriela Hardt 'é equilibrada'. "Vamos recorrer, mas a sentença mostra a disparidade entre a acusação e a realidade reconhecida por uma juíza que não é exatamente uma liberal, ao contrário, é reconhecida como uma juíza linha dura."
Para Toron, é importante destacar que a força-tarefa do Ministério Público Federal da Operação Lava Jato imputava a Bittar - proprietário do sítio de Atibaia - a prática de 44 atos de lavagem de dinheiro. "A doutora Gabriela Hardt condenou Bittar por apenas uma lavagem. Isso mostra a prática de acusação excessiva do Ministério Público."
O criminalista avalia que a força-tarefa da Lava Jato 'com sua estratégia usual de fazer acusação excessiva quer compelir a pessoa a fazer uma delação, no caso queriam que falassem do Lula e da dona Marisa, quando na verdade não há base nenhuma para uma acusação dessa magnitude'.
O advogado demonstra preocupação com o plea bargain, acordo penal adotado em larga escala nos Estados Unidos e que o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro incluiu no pacote anticrime entregue ao Congresso nesta quarta, 6.
"Agora vem o plea bargain do Moro. Vão te acusar de crimes que levam a uma pena de 100 anos. O que você faz? Se fizer acordo a pena cai para 5 anos. A pessoa vai aceitar. Vamos ter que discutir muito isso."
"O que é importante destacar é que o próprio Ministério Público, nas alegações finais, reconheceu que o Fernando Bittar é o verdadeiro proprietário do sítio de Atibaia", segue Toron. "Enfim, ficou definida a propriedade do sítio."
COM A PALAVRA, A CRIMINALISTA DANIELLA MEGGIOLARO, DEFENSORA DE JOSÉ CARLOS BUMLAI
"José Carlos Bumlai recebeu com imensa surpresa a notícia de sua condenação e dela irá recorrer, pois jamais contribuiu financeiramente com as reformas do sítio de Atibaia. A sentença é atécnica e não aponta a origem nem a ilicitude dos valores que seriam objeto da suposta lavagem. Além disso, a pena e o regime de cumprimento impostos a ele são totalmente desproporcionais."
COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA ANTONIO CLAUDIO MARIZ DE OLIVEIRA, DEFENSOR DE ROBERTO TEIXEIRA
"A magistrada já deu a substituição, aplicou regime aberto e substituiu por prestação de serviços à comunidade. Mas vou recorrer, até porque o Ministério Público Federal vai recorrer."
"A defesa de Roberto Teixeira, embora reconheça qualidades e méritos da prolatora da sentença, irá recorrer, pois entende que ele, como exposto desde a resposta à denúncia até as alegações finais, não cometeu o delito que lhe é imputado."
"Entende também que a sua inocência ficou comprovada pela prova dos autos e que, em consequência, a sentença contrariou todos os elementos carreados para o processo que demonstraram a atipicidade da conduta de Roberto Teixeira."
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.