Com relação a esta última indicação, a obtenção de energia elétrica solar por meio de placas fotovoltaicas instaladas em residências particulares ou em prédios comerciais tem ganhado grande destaque no mercado e já conta com regulação pela ANEEL desde 2012, com a Resolução Normativa 482/2012, posteriormente, alterada e aprimorada pela Resolução Normativa 687/2015.
Importante notar que referidas resoluções normativas foram precedidas de audiências públicas conduzidas pelo órgão regulador e contou com a participação da sociedade civil e de agentes do mercado de energia brasileiro, com contribuições importantes no desenvolvimento das normas que tratam do tema.
A tecnologia do sistema de geração de energia elétrica a partir de placas fotovoltaicas pode significar ganhos expressivos para o consumidor, que verá uma diminuição em sua fatura de energia elétrica mensal, na medida em que, pela Resolução ANEEL 482/2012, a quantidade de energia gerada por uma unidade consumidora e não consumida reverte-se em créditos a serem abatidos de sua conta de energia elétrica mensal, o que se convencionou chamar de net metering.
Ou seja, se o consumidor residencial ou comercial gerar mais energia do que consome, ele obtém créditos junto à concessionária de distribuição que serão abatidos mensalmente de sua conta de energia elétrica. Isso, sem sombra de dúvida, gerará um benefício imediato ao consumidor, com a redução de sua fatura mensal.
Contudo, como uma era que inaugura uma nova forma de enxergar o mercado de energia, portanto, são necessárias regras de transição que permitam sua incorporação ao dia a dia do consumidor e não causem perdas e insegurança ao investidor e ao próprio usuário do sistema.
Neste cenário, o regulador deve se atentar para o equilíbrio econômico financeiro dos contratos de concessão das distribuidoras de energia elétrica, que terão impacto significativo em seus caixas, na medida em que mais unidades consumidoras passarem a gerar sua própria energia elétrica.
De maneira simplificada, os custos das distribuidoras que compõe o preço da tarifa de energia elétrica são divididos em parcela A (correspondente à compra de energia, transmissão e encargos setoriais) e parcela B (custo de distribuição de energia). Assim, a tarifa final paga pelos consumidores em geral é composta da seguinte maneira: 53,5% (parcela A), 17% (parcela B) e 29,5% (ICMS e PIS/COFINS).
Considerando que na atual regulação de geração distribuída, os créditos obtidos pelo consumidor com a geração própria de energia elétrica serão abatidos de sua fatura, sem a incidência de tributos, significa dizer que a distribuidora poderá ser afetada na parcela que mais representa o preço da tarifa (parcela A), arcando o consumidor apenas com o custo de distribuição ou custo de disponibilização do sistema (parcela B), que é justamente a menor parte da composição da tarifa.
Assim, é possível que as distribuidoras arrecadem menos com tarifa de energia elétrica, o que invariavelmente afetará seus caixas e consequentemente o equilíbrio econômico financeiro dos contratos de concessão.
Conforme levantamento da Aneel, atualmente, mais de 20 mil unidades consumidoras em todo o pais já estão conectadas ao sistema, injetando energia ativa. Obviamente, este número hoje não é suficiente para causar qualquer afetação no equilíbrio econômico financeiro dos contratos de concessão de distribuição de energia elétrica.
Todavia, como a geração distribuída se trata de uma tendência que toma formas de se tornar uma realidade, especialmente, com o barateamento dos equipamentos fotovoltaicos, cada dia mais novas unidades consumidoras estarão conectadas ao sistema gerando sua própria energia e injetando o excedente na rede.
Por isso, há que se dar atenção à evolução da regulação sobre geração distribuída, especialmente, adotando-se regras de transição, que permitam a expansão da geração de energia nas unidades consumidoras e possibilitem às distribuidoras diversificar suas fontes de receita.
Com a evolução da regulação sobre o tema, pode-se: a) evitar o desequilíbrio econômico financeiro nos contratos de concessão das distribuidoras; b) manter a segurança jurídica no setor de energia elétrica, criando um ambiente saudável para o investidor; c) estimular o desenvolvimento da geração distribuída e da tecnologia de geração de energia nas unidades consumidoras, em benefício dos consumidores e da segurança energética; e d) obstar a formação de passivos judiciais, decorrentes de possível judicialização do tema.
Ao adotar regras de transição, o regulador permitirá que uma nova era na geração de energia elétrica no país se consolide, beneficiando a economia, a sociedade e a segurança energética.
*Carlos Augusto Tortoro Jr., sócio do Tortoro, Madureira e Ragazzi Advogados e advogado responsável pela área de energia e contencioso
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