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Opinião|Glicério e a Agricultura

Profético Glicério, previa que governo e agroindústria precisavam caminhar juntas. Será que isso hoje ocorre sem traumas e sobressaltos?

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convidado
Por José Renato Nalini

Francisco Glicério não queria cargos no Executivo. Sua luta era a abolição e a República. Mas teve de assumir o Ministério da Agricultura no Governo Provisório, pois o escolhido, o gaúcho Demétrio Ribeiro e o Marechal Deodoro se desentenderam.

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Ao apresentar relatório ao Presidente da República em novembro de 1890, evidenciou seu cuidado com a questão da agricultura, da imigração, mas também sua preocupação com a viação férrea e a navegação.

Sabia que, após à abolição, a lavoura precisava de braços. Não havia brasileiros suficientes para se ocuparem da agricultura, então a maior força econômica tupiniquim.

Confiava na imigração, algo que já fora incentivado pelo Imperador Pedro II. Dizia Glicério: “a alta influência econômica no suprimento de homens pela imigração estrangeira. Não há problema mais vasto, mais complicado, mais cheio de interesse para a grandeza nacional”.

Filho de negra livre, abominava-o pensar que os imigrantes poderiam ser tratados como elementos servis. Mas acreditava em outras bases para a recepção dos estrangeiros que deixassem sua pátria para se dedicarem ao desenvolvimento do Brasil: “Encaminhada para o nosso país avultada corrente imigratória, que nos coadjuve eficazmente na utilização das nossas portentosas riquezas naturais, teremos louvado as bases de incalculável prosperidade. Este é o instrumento mais poderoso com que podemos preparar o futuro”.

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Propunha-se a garantir aos que chegassem, todas as condições para o efetivo desenvolvimento de suas potencialidades e autorrealização no novo solo. Queria que eles se sentissem acolhidos, respeitados, com a fruição de todos os direitos que assegurassem sua dignidade: “Não lhe bastam liberdade religiosa, instituições livres, direitos políticos, leis e tribunais, para que a sua atividade lhe proporcione condições de bem-estar. É ainda preciso e indispensável que ele ache auxílios e facilidades de outra natureza, que o habilitem a colocar-se de pronto, já nas indústrias fabris, já na agricultura, segundo sua aptidão e desejo”.

Tinha pleno conhecimento de que não eram apenas lavradores os que se viam obrigados a deixar a pátria de origem para se aventurarem no Brasil. Havia obreiros, artesãos, artífices, operários que não se destinavam ao campo, mas precisariam ser absorvidos na incipiente indústria brasileira.

Quis não apenas corresponder à propaganda que já existia no exterior, desde os tempos do Império, para atrair imigrantes. Mas apurou as técnicas de comunicação, para que dúvidas não pairassem quanto aos que arrostassem o oceano rumo à América. Foi assim que criou dois escritórios de Informação na Itália, um em Milão, outro em Gênova.

Desde muito jovem, Glicério propunha a urgência do apoio aos agricultores e, ao criticar os deputados do Império, em artigo publicado em 28 de março de 1876, em “A Província de São Paulo”, depois convertida em “O Estado de São Paulo”, exortava os paulistas a pensar sobre “a necessidade de criação de um Clube da Lavoura, com intuitos assentados de tratar com perseverança e critério de todos os negócios e dependências que digam respeito aos grandes interesses desta classe importante no país”.

Ele já praticava uma aproximação da política e agricultores, escrevendo: “quanto maior é a fortuna do indivíduo na lavoura, tanto maiores e diversos são os haveres, e na mesma proporção estão as suas naturais dependências do Poder Público. O agricultor brasileiro sensato deve ter isto muito em vista e sua propriedade é a que mais depende do regular andamento da ordem pública, da judiciosa criação de leis adequadas e segurança para o desenvolvimento de sua indústria rodeada hoje de reais obstáculos e, sobretudo, da rigorosa execução e observância dessas providências necessárias em bem do presente cheio de sombras e do futuro de seus filhos, na maior parte afeitos às comodidades que lhes advêm da carreira agrícola”.

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Cobrava também do Banco do Brasil apoio para os agricultores. A lavoura era então o mais importante componente da economia brasileira. E continua a sê-lo, pois a indústria tupiniquim restou sucateada e não acompanhou – ao menos em sua maioria – o desenvolvimento produzido pela Quarta Revolução Industrial.

Profético Glicério, previa que governo e agroindústria precisavam caminhar juntas. Será que isso hoje ocorre sem traumas e sobressaltos?

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo. Foto: Iara Morselli/Estadão
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