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Opinião|Herança? Não quero!

Nem precisa querer. A lei não obriga ninguém a ser herdeiro

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convidado
Por Ivone Zeger

Para fazer sobrar a outro, para não faltar, ou para simplesmente não querer se preocupar. Os motivos que levam um herdeiro a renunciar à herança podem variar. E o que vale na hora da decisão, além da assessoria de um bom advogado, é ter a informação correta. Imagine que um herdeiro queira renunciar a sua parte da herança mas deseja destina-la a outro herdeiro específico, o que não é possível. Para esmiuçar melhor as situações advindas da renúncia, elenquei algumas dúvidas mais frequentes sobre o tema.

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Será que existe alguém que realmente renuncia a uma herança?

Sim, não só pelos motivos elencados no início desse artigo, mas principalmente porque uma herança se constitui de direitos, mas também de deveres. Contas a pagar, um imóvel necessitando de manutenção ou com IPTU atrasado, ter de se envolver com o inventário ou com a expectativa exaltada dos demais herdeiros, enfim, há inúmeros motivos que levam a essa decisão.

O que é renúncia à herança?

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A lei não obriga nenhuma pessoa a ser herdeira, portanto, esta pode aceitar ou renunciar à herança. Se houver a renúncia, a transmissão de bens para esse herdeiro que renunciou não se verifica e é como se ele nunca tivesse existido.

A renúncia exige a assinatura de algum papel?

Sim. A renúncia deve ser expressa, e pode ser feita tanto por meio de escritura pública ou perante o juiz do inventário, com a assinatura de termo nos autos do processo. Essa necessidade se justifica pelo fato de, ao renunciar, a pessoa estar abrindo mão de todos os deveres e direitos daquela herança e, obviamente, isso implica em abrir mão de patrimônio.

Quem pode renunciar?

Toda pessoa capaz de exercer os atos da vida civil. Assim, não podem renunciar à herança os menores de 18 anos, os incapazes e aquelas pessoas que sejam ou estejam temporariamente impedidos por lei de exercer os atos da sua vida civil.

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Se quem quer renunciar à herança for casado(a), precisa  de autorização do cônjuge?

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Na atualidade, em função das mudanças ocorridas em 2002 no Código Civil, pode-se afirmar que a anuência do cônjuge é necessária. Isso se deve à modificação na ordem da vocação hereditária manifestada pelo artigo 1829, inciso I, que define os cônjuges como herdeiros em concorrência com os descendentes e/ou ascendentes. Apenas quando o casamento estiver regido sob regime da comunhão universal ou da separação obrigatória de bens é que essa autorização não se faz necessária. Ocorre que, nesses dois contextos, o cônjuge não é herdeiro, mas sim, meeiro, ou seja, com direito à metade dos bens do casal. Vale ressaltar que meação não é herança.

Com quem fica a parte de quem renuncia à herança?

Na sucessão legítima – ou seja, na sucessão que se dá de acordo com as regras da lei e não aquela apontada por testamento – a parte do renunciante acresce a dos demais herdeiros da mesma classe, grau e linha do renunciante. Por exemplo: se os herdeiros forem três irmãos e um deles renunciar, a parte deste será incorporada às partes dos dois irmãos.

Por que a renúncia de um herdeiro favorece seus irmãos e não seus filhos?

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Os netos e filhos do falecido pertencem à mesma classe – são todos descendentes, portanto, herdeiros necessários –, mas os netos estão em um grau abaixo, digamos assim, na linha de vocação hereditária. Quando o herdeiro já é falecido ou por algum motivo é considerado indigno de participar da sucessão de bens, então, seus filhos – netos do falecido – representam o pai no recebimento da herança. Mas na renúncia isso não acontece. Quando um herdeiro renuncia, para efeitos legais, é como se ele nunca tivesse existido, portanto, para a lei seus filhos também “não existem”.

E se quem renuncia for o único herdeiro?

Se quem renuncia é o único herdeiro de seu grau, ou seja, se não há outros irmãos nem cônjuge sobrevivente, daí sim, os filhos do renunciante, portanto netos do falecido, são chamados a suceder.

O herdeiro não pode renunciar em favor dos seus filhos?

Não, quem renuncia simplesmente abre mão de sua parte da herança e não determina para quem ela se destinará. O herdeiro não pode renunciar em favor de nenhum outro herdeiro especificamente. Como foi explicado anteriormente, a parte do renunciante é transferida para os outros herdeiros de mesma classe, grau e linha, que são os seus irmãos.

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Supondo que um herdeiro tenha muitas dívidas, ele pode renunciar para que o patrimônio fique com os outros herdeiros?

Não funciona exatamente assim. Nesse contexto, de acordo com o artigo 1.813 do Código Civil, se a renúncia prejudicar os credores, estes podem, por meio de autorização do juiz, aceitar a herança no lugar do herdeiro. Por outro lado, se o herdeiro tiver como saldar suas dívidas com patrimônio próprio, sem que para isso precise da herança, provavelmente o juiz entenderá que não há motivo para autorizar credores a tomarem a herança para si. Nesse caso, o juiz pondera em favor dos demais herdeiros, que receberão a parte do renunciante.

E se a dívida do herdeiro renunciante for maior que sua parte na herança, os outros herdeiros terão de ajudar a pagar?

Não! O credor submeterá ao juiz as provas de seu crédito, habilitando-se, assim, ao inventário. O credor praticamente entra no lugar do herdeiro, mas receberá o valor correspondente à dívidas exclusivamente da parte daquele herdeiro renunciante e não dos demais. O que o credor receberá para quitação do débito não pode ser superior à parte que era destinada ao renunciante.

Um credor pode se habilitar no inventário para receber por dívidas que ainda não venceram?

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A aceitação do credor da parte que caberia ao renunciante só poderá acontecer se este crédito estiver vinculado a dívidas já vencidas. A lei não permite que um credor se habilite no inventário para receber montantes relativos a prestações a vencer.

E se a parte que foi para o credor cobrir todas as dívidas do renunciante e ainda sobrar?

Uma vez que o credor aceite a parte da herança que cabia ao renunciante, após a quitação do débito, a renúncia se mantém. Portanto, se houver valor remanescente, este acrescerá em partes iguais as cotas dos outros herdeiros, como determina a lei.

Quando a herança está em testamento, pode o herdeiro renunciar?

Sim, pode. Quando o testador – o falecido que elaborou o testamento – deixa cotas não determinadas para um grupo de herdeiros, se um destes renuncia, vigora o mesmo direito a acrescer entre herdeiros que se verifica na sucessão legítima, ou seja, a parte do renunciante acrescenta as partes dos outros herdeiros.

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E se o testador determina o que vai para quem, como fica o direito de acrescer?

Nesse caso, estamos falando de legado. A herança se refere ao conjunto de bens deixado por alguém e o herdeiro é um sucessor a título universal. Já o legado se refere a bens específicos, deixados pelo testador para uma pessoa, o legatário – aquele que recebe o legado. Se a pessoa renuncia ao seu legado, este acrescenta a parte dos demais herdeiros.

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Ivone Zeger
Advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Doutoranda em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidad de Buenos Aires – UBA. Autora dos livros “Herança: Perguntas e Respostas”, “Família: Perguntas e Respostas” e “Direito LGBTI: Perguntas e Respostas". Foto: Arquivo pessoal
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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

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