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Opinião | Impotência ou negligência?

A infiltração do crime em atividades aparentemente lícitas é um fato admitido como normal. Não importam as perdas fiscais que superam bilhões de reais, a ampliação do poder político da delinquência, sobretudo em áreas em que o poder público é ausente

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convidado
Por José Renato Nalini

Já não espanta a sociedade ler que “o crime organizado já é o principal empregador da Região Amazônica”, reportagem-entrevista publicada neste Estadão de 16.2.2025. O texto é de Roberta Jansen, que entrevistou o Diretor-Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima e o motivo foi a divulgação de um novo estudo realizado pelo Fórum, sobre o fato de o crime organizado movimentar mais dinheiro com a venda irregular de combustível, ouro, cigarro e álcool do que com o tráfico de cocaína.

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A infiltração do crime em atividades aparentemente lícitas é um fato admitido como normal. Não importam as perdas fiscais que superam bilhões de reais, a ampliação do poder político da delinquência, sobretudo em áreas em que o Poder Público é ausente.

O estudo indica que facções criminosas movimentaram quase cento e cinquenta bilhões de reais em 2022, com a comercialização desses produtos. Enquanto isso, o comércio da cocaína só chegou a quinze bilhões.

O Presidente do Fórum fala em “mexicanização” do Brasil, já que no México, o principal empregador é o crime organizado.

Não é só a Amazônia que preocupa. Aqui mesmo em São Paulo, a OIDA – Operação Integrada em Defesa das Águas enfrenta problemas na indiscriminada, irregular e criminosa ocupação da área dos mananciais, atribuída à delinquência bem organizada.

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Será que a comercialização de lotes em áreas insuscetíveis de servirem para moradias, pois são imprescindíveis ao abastecimento de água para milhões de pessoas também não é uma atividade lucrativa? O comércio ativo de material de construção também deveria ser alvo de fiscalização, pois é o setor que propicia a intensificação de edificações clandestinas em lugares destinados à permanente proteção ambiental, já que são os fornecedores daquilo que em breve faltará à população: a água.

É doloroso ter conhecimento de que “o crime organizado já detém postos de gasolina e até usinas de etanol, dominando toda a cadeia produtiva e adentrando também os bairros nobres”, como afirma Renato Sérgio de Lima. Isso implica perda de competitividade. O País deixa de arrecadar impostos. O dinheiro não arrecadado chega a ser superior ao nosso déficit fiscal.

Os economistas, os empresários, os intelectuais que debatem o déficit fiscal deveriam também enfrentar essa questão. Existe uma proliferação de órgãos, como o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Banco Central, a Receita Federal, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, a Agência Nacional de Aviação civil – ANAC, mecanismos que deveriam atuar ao lado da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária, das Polícias Militares Ambientais e de todos os organismos preordenados a garantir a segurança da população.

Para coibir a continuidade dessa mácula que depõe contra o Brasil, seria urgente a convocação de todo o sistema de segurança, a Força Nacional, as Forças Armadas, que precisam fazer valer a sua vocação de salvar o Brasil de seus inimigos mais perigosos. Os criminosos.

Estes parecem agir de maneira desenvolta, relacionando-se com o Poder Público, participando da vida social como se fossem benfeitores. Não é possível que os serviços de inteligência não tenham condições de desfazer essa teia nefasta que põe em risco o futuro do Brasil, tamanha a força com que atua.

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O Brasil precisa acordar e não se acovardar. Há pessoas preparadas em todas essas Instituições. O Ministério Público, instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, é responsável pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Essa tríade está ameaçada de soçobrar, se a delinquência se tornar a força paralela e simultânea, aparentemente mais forte e mais poderosa do que o Estado em alguns espaços.

Em lugar da atuação tópica, no âmbito microscópico do processo interindividual, o Ministério Público deve retomar a vocação patriótica de quando teve de enfrentar o “Esquadrão da Morte”, em época de autoritarismo que poderia amedrontar os fracos. Mas mostrou possuir caracteres inquebrantáveis, gente de fibra, que tinha noção exata de seu compromisso com a população e com a nacionalidade.

Algo precisa ser feito com urgência. O Estado brasileiro é impotente ou está sendo negligente? Nenhuma das alternativas satisfaz ao nosso anseio por ordem e progresso, lema de nosso pendão alviverde.

Convidado deste artigo

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo. Foto: Alex Silva/Estadão
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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

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