A Lei de Acesso à Informação, a LAI, é uma realidade em grande parte do mundo. Países considerados democráticos – e até mesmo aqueles cujo regime é autoritário ou beira o autoritarismo – implantaram a LAI em seus territórios sob diversos argumentos e motivações. Alguns deles aderiram a esta lei com o objetivo de regulamentar o direito constitucional de acesso à informação pública. Outros, no entanto, fizeram a adesão apenas por pressão internacional.
Atualmente existem 140 leis de acesso à informação no mundo, a maioria sendo implementada na década de 2000. Antes desse marco historico, existiam apenas 39 LAIs. A primeira foi implementada em 1766, na Suécia, e a segunda só veio a ser consolidada quase 200 anos depois, em 1951, pela Filândia. Usando dados do Global Right to Information Rating (RTI Rating), o Gráfico apresenta a difusão de leis de acesso à informação no mundo:
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O Gráfico acima apresenta a difusão de LAIs no mundo no período de 1965 a 2023. A linha apresenta o número acumulado de países com LAI. Observa-se, a partir disso, uma adesão lenta na década de 1970 até 1990, quando uma ampla nução à LAI começou a crescer. Na década de 2000, o fenômeno se acentuou ainda mais, atingindo 140 países em 2023.
A lei de acesso à informação tem sido defendida por especialistas, acadêmicos e pesquisadores como um importante instrumento para fortalecer as democracias modernas. Porém, mesmo com toda essa conjuntura, será que a adesão à LAI e a qualidade da lei são suficientes para gerar bons níveis de transparência, promover a participação política e a accountability?
Esses questionamentos fazem sentido quando analisamos os dados da Global Right to Information Rating. A RTI Rating é uma metodologia que mede comparativamente a força das estruturas legais para o direito à informação em todo o mundo. Cada LAI é avaliada a partir da observação de 61 indicadores considerados importantes para composição da lei e recebe pontuações que vai de 0 a 150 pontos. Nessa perspectiva, quanto maior a pontuação, mais forte a estrutura legal da LAI.
Quando falamos em países que implementaram a lei de acesso à informação, imediatamente associamos a países cujos regimes são democráticos. Porém, do total de países que aderiram à LAI, 22,1% deles são governados por regimes autoritários. Esses países, além de viverem sob um regime antidemocrático, possuem níveis de transparência baixíssimos ou nulos, sendo o caso do Afeganistão.
Esse país, em específico, segundo dados do International Budget Partnership, não produz nenhum tipo de transparência orçamentária. Por outro lado, é o país cuja lei de acesso à informação possui a melhor estrutura legal, recebendo a maior pontuação na avaliação (139 pontos). Outro exemplo é o caso do Sudão do Sul e da Nicarágua, que possuem baixos níveis de transparência, mas suas leis de acesso à informação são classificadas como uma das melhores do mundo (121 e 111 pontos, respectivamente).
Por outro lado, países democráticos, com altos níveis de transparência, possuem LAIs com pontuação inferior aos citados anteriormente em sua estrutura. É o caso da Suécia, Nova Zelândia e Noruega, que possuem 101, 94 e 77 pontos, respectivamente. Esses países são considerados modelos de democracia, segundo a classificação do Democracy Index.
O que explica essa contradição?
É importante destacar que a RTI Rating analisa apenas a estrutura legal das leis de acesso à informação e não monitora sua implementação. Outras instituições fazem esse papel analisando os níveis de transparência a partir de várias perspectivas.
Uma das questões que explica a disparidade na qualidade das leis de acesso à informação é a quase recém-elaboração de tais leis no Afeganistão, Sudão do Sul e Nicarágua (2014, 2013 e 2007, respectivamente) em comparação a outros países. São leis consideradas modernas, que, ao serem confeccionadas, pontuaram questões que fazem parte do debate atual, além de já terem passado por atualizações recentes, como é o caso do Afeganistão, que atualizou a LAI em 2019. As outras leis, embora tenham sido implementadas por países democráticos, são consideradas antigas e que, ao serem criadas, basearam-se na realidade de sua época, como é o caso da Suécia, que foi implementada em 1766 e, desde então, não sofreu qualquer atualização.
Em relação aos altos níveis de transparência de países cuja estrutura da lei possui baixa avaliação, vale atentar para a importância dos esforços positivos de implementação. Ou seja, a LAI do país pode ser bem avaliada e não haver esforço algum para implementá-la. Por outro lado, países com leis relativamente fracas podem ter excelentes níveis de transparência devido aos seus esforços em cumprir as diretrizes da lei.
Nesse sentido, não basta apenas adotar a melhor lei de acesso à informação como forma de atender a pressão internacional ou para ser bem-visto por outros países. De nada valerá ter uma lei de qualidade em termos estruturais, atualizada de acordo com a pauta atual e não a implementar em sua integra. Transparência é mais urgente do que uma lei bem desenhada.
Por outro lado, os países, consolidados ou não, que, apesar das limitações na estrutura legal da LAI, produzem níveis significativos de transparência, precisam urgentemente se reciclar para atender as demandas modernas e urgentes, principalmente as relacionadas ao consumo de dados abertos, à proteção de dados e às novas tecnologias.
Em síntese, uma lei de acesso à informação forte e atualizada é essencial para promover a transparência, accountability e fortalecer a democracia.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica