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‘Não há espaço para mistério’, diz ex-ministro Marco Aurélio, ‘pai’ da TV Justiça ao rebater Lula

Ministro aposentado da Corte máxima, ‘pai’ da TV Justiça, atribui a presidente ‘arroubo de retórica’ e ‘ato falho’ em defesa de que população ‘não saiba como vota um ministro do Supremo’; ‘não há espaços para mistérios’

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Atualização:
Marco Aurélio Mello relata ação apresentada por ex-genro e não pede impedimento. Foto: Adriano Machado/Reuters

O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello classificou como ‘ato falho’ a defesa, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de que os votos dos integrantes da Corte máxima sejam sigilosos. “Ele não pode pensar o que divulgou, que os votos dos ministros sejam sigilosos. Não há espaço para mistério”, afirmou ao Estadão.

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‘Pai’ da TV Justiça, que lançou os julgamentos do STF sob os holofotes em todo o País, Marco Aurélio ressaltou que a ‘mola mestra da administração pública é a publicidade’. “É o que permite aos veículos informarem aos contribuintes, e aos contribuintes cobrarem uma postura exemplar e digna dos agentes públicos”, indicou.

Na avaliação do ex-ministro do Supremo, Lula tem de lembrar ‘que é uma voz ouvida pelos cidadãos e tem de se policiar’. “É um arroubo de retórica. O presidente não pensa assim, não quer voltar à caverna”, ressaltou.

Sobre a TV Justiça, Marco Aurélio ressaltou como ‘bateu e correu para cabecear’. O projeto de criação do canal partiu do gabinete do então ministro. Depois, ele mesmo sancionou o texto, quando presidente em exercício, em maio de 2002.

A declaração de Lula sobre um eventual sigilo no voto dos ministros do STF se deu durante o ‘Conversa com o Presidente’, produzido pela Empresa Brasil de Comunicação. “Eu, aliás, se eu pudesse dar um conselho, é o seguinte: a sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte. Sabe, eu acho que o cara tem que votar e ninguém precisa saber. Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Não precisa ninguém saber”, afirmou.

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A ponderação se deu após uma onda de críticas ao ministro Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula recém-empossado no Supremo.

A fala do presidente vai na contramão de uma série de ações da Corte máxima, em busca de transparência e celeridade. A Corte, por exemplo, criou o Plenário Virtual, que permite o acompanhamento de julgamentos realizados fora da programação da TV Justiça, e desenvolveu o painel Corte aberta, que permite o acesso a detalhes do acervo dos magistrados que compõem a Corte máxima.

‘Segredo é inconstitucional’

Vitor Rhein Schirato, professor de Direito de Estado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, avalia que o presidente Lula se ‘expressou mal’ e teve uma ‘declaração infeliz’. “Eu imagino que não tenha passado pela cabeça do presidente que a razão de decidir venha a ser um segredo, porque isso é absurdamente inconstitucional. A Constituição é expressa no sentido de que a fundamentação decisão judicial tem que ser motivada e pública. Eu não consigo imaginar que o presidente tenha dado a entender que o STF vai dizer constitucional ou inconstitucional, ‘porque, jamais saberás”, ponderou.

“Jamais a gente pode imaginar o motivo da decisão do STF não ser público. Se for mantido o sistema de voto, ele também não pode ser apócrifo. O que eu acho é que é muito ruim esse sistema de você votar olhando para a câmera de televisão da TV Justiça. O grande problema é esse”, seguiu.

O professor vê a fala de Lula como ‘um apelo bastante pertinente de mudança da forma de decisão’ do STF. Em sua avaliação, o sistema de onze votos do STF é péssimo e horroroso’, encontrando similaridade somente com o dos EUA. “A Corte tem que ter uma posição, e não um ministro. Tranca os onze numa sala, eles decidem, se matam, se xingam, se amam, fazem o que quiserem dentro da sala e saem com uma decisão que reflita o Supremo, não importa quem votou como”, indicou.

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Nessa linha, a avaliação do professor, é necessário ‘repensar o modo de decisão do STF. “A gente sairia de loucuras como a que a gente está vendo no marco temporal. Um acha que é constitucional, outro inconstitucional, e o terceiro outro constitucional, mas tem que indenizar. Ai fica uma loucura, na hora de você totalizar, o que valeu. É insano”

Na avaliação de Schirato, Lula não teria insinuado que não se possa divulgar os fundamentos da decisão e ‘muito menos dizer que foi colocar votos aprócrifos’. “O que também não é permitido. Em um sistema de decisão por voto o voto não pode ser apócrifo”, afirmou.

“Foi uma fala infeliz, mas não da para extrapolar e dizer que o Lula quer segredo no Supremo. Duvido que isso tenha passado pela cabeça dele. O que a gente precisa aproveitar e repensar é o modo de decisão do STF porque é muito ruim. Esse sistema de onze ilhas é muito ruim. Tem decisão que você não sabe nem em que direção votou o ministro”, completou.

Na avaliação de Vitor Silva de Araújo, especialista em Direito Eleitoral, ‘julgamentos secretos causariam mais desconforto social no Brasil do que a ampla publicidade a que se dá às decisões judiciais atualmente’.

“Na nossa história, poder exigir publicidade e transparência dos agentes públicos é uma conquista extremamente importante e que não pode ser negociada. Justamente por isso, o dever de fundamentação das decisões e de publicidade dos julgamentos foram inseridos diretamente na Constituição e são premissas centrais das decisões judiciais”, indicou.

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O advogado Gustavo de Toledo Degelo considera que a ideia de um voto secreto por parte de ministro do STF ' encontra impedimento na Constituição Federal’. Segundo ele, a administração pública deve obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. “Com relação ao princípio constitucional da publicidade, é possível extrair a necessidade de que os atos decisórios proferidos pelo Poder Judiciário sejam públicos”, indicou.

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