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Opinião|Mauá, amigo da lavoura

Para o Visconde de Mauá, que viveu de 1813 a 1889, e que foi precursor em tantos empreendimentos, então considerados fantásticos e irrealizáveis para o vetusto e antiquado país, todas as demais exigências da nossa agricultura, que são infinitas, podem ser incluídas nessas quatro proposições fundamentais

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convidado
Por José Renato Nalini

O nunca assaz louvado Irineu Evangelista de Sousa, que deveria ser entronizado como patrono do empreendedorismo tupiniquim, foi também amigo da agricultura. Isso porque, na sua vida financeira, viu-se na contingência de receber em adjudicação em pagamento ao Banco Mauá, que era criação e obra sua, várias fazendas.

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Não era agricultor, mas “uma vez de posse dessas propriedades, o espírito empreendedor com que Deus me dotou não me permitiu olhar impassível para os elementos de vida econômica, financeira e social que a lavoura encerra, o que, aliás, eu sempre encarei como a fonte de toda a riqueza pública do Brasil. No meio de minhas multíplices ocupações, jamais se afastou da minha mente a sorte da lavoura”. É o que consta de sua instigante autobiografia, na qual lamenta que seus afazeres não tenham permitido dar a devida atenção a esse assunto que deveria ser a maior prioridade nacional.

Assinala que a agricultura depende de quatro condições essenciais. Primeiro, vias de comunicação aperfeiçoadas. Quando se transplanta esse primeiro requisito para os dias atuais, vê-se que o mundo digital impõe a utilização das redes e que a tecnologia permite a substituição de vários trabalhadores, os quais já foram chamados “boias frias”, por celulares, tratores movidos a eletrônica e por uso de drones.

A segunda condição de Mauá era o trabalho. Os braços necessários para a produção em maior escala. Para conseguir a terceira condição: o capital. Hoje, a meta é fazer com que a juventude se interesse pela agricultura. O Brasil já é um grande produtor de grãos. Mas pode também ser o fornecedor de alimentos orgânicos, de espécies pouco exploradas e desconhecidas pelo mundo sofisticado dos gourmets. Pense-se em frutas amazônicas, do cerrado, o desenvolvimento de vegetais que o Velho continente não experimentou ainda e que pode vir a despertar o interesse da Ásia e do Japão. Um mercado sofisticado, no qual o nosso país ainda não navega com segurança e destreza.

A lavoura ainda pode cultivar plantas ornamentais e flores, plantas medicinais. Tudo isso requer uma juventude perita em botânica, em silvicultura, em jardinagem. Áreas que necessitam dessa geração que amplia seus horizontes e que não se satisfaz mais com empregos medíocres e desinteressantes. Quando a mocidade perceber que pode ganhar mais em atividades interessantes como o cultivo da terra, do que em atividades repetitivas, automáticas e robotizantes, o futuro da agricultura brasileira será outro. Melhor e mais auspicioso.

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Aliás, é a solução de acordo com a natureza. Esta aliada do homem, tão maltratada, menosprezada e ignorada, exige uma compensação. O único risco real que a vida humana sofre nesta era é o desaparecimento da aventura existencial num planeta que se cansou de ser explorado e agora reage com as emergências climáticas.

Para Mauá, a quarta necessidade era a instrução agrícola. Uma educação técnica aprimorada, que ensine a cuidar da natureza e a repor nela tudo aquilo que a insensatez foi subtraindo aos poucos, até exauri-la. Estudar agronomia, técnicas agrícolas, estratégias de cultivo inteligente, criação de espécies híbridas, descobrir as qualidades ainda desconhecidas de tantos vegetais que enriquecem nossa exuberante biodiversidade, é um futuro que o Brasil tem de explorar com real empenho.

Agronegócio sim, que é a salvação da lavoura tupiniquim. Mas também, e principalmente, a agricultura familiar. É preciso resgatar a mais valia do cultivo da terra, valorizar a vida rural, pregar o retorno ao campo, eis que as cidades estão infladas e não oferecem a condição de vida digna a que todo o humano tem direito.

Para o Visconde de Mauá, que viveu de 1813 a 1889, e que foi precursor em tantos empreendimentos, então considerados fantásticos e irrealizáveis para o vetusto e antiquado país, todas as demais exigências da nossa agricultura, que são infinitas, podem ser incluídas nessas quatro proposições fundamentais.

Ele conclamava as “sumidades” de seu tempo a se concentrarem sobre os pontos cardeais em referência às verdadeiras necessidades públicas e não perdessem tempo com politicalha estéril, com eleições e com a matriz da pestilência chamada reeleição. É de trabalho sério e de muito juízo que a lavoura brasileira continua a necessitar. Agora, mais do que nos tempos de Mauá.

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo. Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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