O coordenador nacional do Movimento Brasil Livre (MBL) Rubens Alberto Gatti Nunes entrou com ação popular junto à 8ª Vara Federal Cível do Distrito Federal pedindo a suspensão imediata da nomeação do delegado Rolando Alexandre de Souza para a diretoria-geral da Polícia Federal. Na ação, o representante do movimento alega que o presidente Jair Bolsonaro escolheu 'terceiro alinhado a seus interesses escusos, como ficou evidenciado em seu primeiro ato após empossado' - a troca no comando da Polícia Federal do Rio, área de interesse de Bolsonaro e seus filhos.
Documento
A ação popular
Nunes classifica ainda a escolha por Rolando como uma 'patente burla' à decisão do ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal que barrou a nomeação de Alexandre Ramagem, amigo da família Bolsonaro, à chefia da PF. Isso porque Rolando Alexandre é pessoa da primeira hora de confiança de Ramagem, aponta o coordenador do MBL.
Como mostrou o Estado no sábado, a nomeação de Rolando é vista como uma alternativa do presidente para manter a influência de Ramagem. Segundo interlocutores do presidente, o diretor-geral da Abin participou diretamente das decisões sobre o futuro do comando da PF, uma atribuição do ministro da Justiça, André Luiz Mendonça.
"A moralidade administrativa - princípio constitucional basilar da Administração Pública - está em sendo vilipendiada pela nomeação do Sr. Rolando Alexandre de Souza após a exoneração com assinatura do Ministro Sérgio Moro falsamente aposta em documento público e, principalmente, pela burla a decisão emanada pelo Excelentíssimo Ministro Alexandre de Moraes, sendo demonstrado o interesse do Requerido na nomeação com a finalidade interferência em investigações em andamento na Polícia Federal", afirma Nunes na ação.
O coordenador do MBL pede a suspensão imediata da nomeação de Rolando em caráter liminar e no mérito, a declaração de nulidade do ato de nomeação do novo diretor-geral da PF.
No pedido de tutela antecipada, Nunes diz que o 'perigo de dano é iminente' sob o argumento de que a nomeação de Rolando 'coloca em risco a continuidade de investigações em andamento, especificamente no caso dos filhos do Presidente da República, além de parlamentares investigados e mencionados pelo próprio Requerido em mensagem ao Ministro Moro'.
Segundo apurado pelo Estado, Bolsonaro está preocupado com investigações, entre elas o avanço do inquérito das 'Fake News', que poderia atingir seus filhos e até mesmo servidores que atuam no chamado 'gabinete do ódio'. Outras apreensões do presidente são a investigação de 'fatos em tese delituosos' envolvendo a organização de atos antidemocráticos e a apuração sobre as 'rachadinhas' no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
"Indiscutivelmente a medida em comento (a nomeação de Rolando) apunhala não apenas os princípios da moralidade e legalidade, mas a moral de todo brasileiro o qual deposita a confiança e fé nas instituições públicas e as vê sendo vilipendiadas por interesses familiares em favor do "Rei", que se porta acima de tudo, acima do bem e do mal e imune às normas legais vigentes no país",
A Advocacia-Geral da União se manifestou nos autos pedindo a intimação da Procuradoria-Regional da União da 1ª Região para que seja apresentada manifestação prévia sobre o pedido de tutela antecipada.
Documento
A manifestação da União
Interferência da PF e a superintendência do Rio
No pedido enviado a Justiça, Nunes aborda parte dos desdobramentos do pedido de demissão do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro. Ao anunciar sua saída do governo Jair Bolsonaro, o ex-juiz acusou o presidente de suposta interferência política na PF envolvendo trocas na Diretoria-Geral e em superintendências regionais da corporação.
O pronunciamento de Moro culminou na abertura de um inquérito sob relatoria do ministro Celso de Mello. Neste sábado, 2, o ex-ministro prestou depoimento de mais de oito horas em Curitiba sobre a suposta ingerência de Bolsonaro na PF.
A chefia da PF no Rio foi mencionada por Moro tanto no anúncio de sua demissão, como no depoimento do último sábado.
"O problema é que nas conversas com o presidente e isso ele me disse expressamente, que o problema não é só a troca do diretor-geral. Haveria intenção de trocar superintendentes, novamente o do Rio, outros provavelmente viriam em seguida, como o de Pernambuco, sem que fosse me apresentado uma razão para realizar esses tipos de substituições que fossem aceitáveis", disse Moro, ao pedir demissão do governo.
Além disso, a superintendência no Rio foi pivô da primeira crise entre o ex-ministro e o presidente ainda em 2019.
Após ser empossado nesta segunda, 4, em cerimônia não divulgada previamente e a portas fechadas, um dos primeiros atos de Rolando foi convidar o superintendente do Rio Carlos Henrique Oliveira para assumir a direção-executiva da PF, o que o coloca como número dois do novo diretor. A promoção foi vista por delegados como uma forma 'estratégica' de trocar o comando da Polícia Federal fluminense.
A troca na chefia do Rio é um dos pontos centrais do inquérito sobre as acusações feitas por Moro a Bolsonaro. Nesta segunda, 4, o procurador-geral da República, Augusto Aras solicitou a Celso de Mello uma série de diligências no âmbito da investigação, incluindo a oitiva de delegados envolvidos na crise entre Moro e Bolsonaro no ano passado.
O PGR quer ouvir Carlos Henrique Oliveira, o ex-diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, o superintendente no Amazonas, Alexandre Saraiva e Ricardo Saadi, ex-superintendente da PF no Rio, antecessor de Oliveira. Além deles, Aras pediu a oitiva de Rodrigo Teixeira, ex-chefe da PF em Minas e de Alexandre Ramagem Rodrigues.
Aras quer que os delegados prestem informações acerca de 'eventual patrocínio, direto ou indireto, de interesses privados do Presidente da República perante o Departamento de Polícia Federal, visando ao provimento de cargos em comissão e a exoneração de seus ocupantes'.
Além das oitivas, Aras pediu ao Supremo que determine à Secretaria-Geral da Presidência envio de cópia do vídeo da reunião realizada entre o presidente, o vice-presidente, ministros de Estado e presidentes de bancos públicos no último dia 22 no Palácio do Planalto, 'no intuito de confirmar a afirmação de que o primeiro teria cobrado, de acordo com o ex-titular da Pasta da Justiça, "a substituição do SR/RJ, do Diretor Geral e relatórios de inteligência e informação da Polícia Federal"'.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.