O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), se declarou impedido e não vai participar do julgamento sobre o sigilo imposto ao vídeo do entrevero que se envolveu no aeroporto de Roma em julho do ano passado.
Os ministros vão decidir se confirmam a ou não decisão do relator, Dias Toffoli, que mantém a gravação em segredo de Justiça e se recusa a compartilhar cópias com a Procuradoria-Geral da República (PGR) e com a defesa dos empresários investigados por hostilidades a Moraes.
O julgamento ocorre no plenário virtual do STF. Nessa modalidade, a votação é assíncrona. Os ministros têm uma semana – até a próxima sexta – para registrar o voto na plataforma virtual, sem debate ou reunião do colegiado.
Até o momento, apenas o próprio Toffoli votou, mantendo o posicionamento que apresentou na decisão monocrática.
Impedimento
A Polícia Federal (PF) apresentou ontem o relatório final da investigação com a conclusão de que o empresário Roberto Mantovani cometeu o crime de “injúria real” – emprego de violência ou vias de fato para ofender a dignidade ou o decoro de alguém. A PF decidiu não indiciá-lo porque o crime tem menor potencial ofensivo. Isso não significa que ele foi inocentado. A PGR ainda precisa decidir se é o caso de denunciá-lo.
Ao se declarar impedido para decidir sobre o sigilo imposto ao vídeo ao aeroporto, Moraes sinaliza que também não deve participar do julgamento final do caso, se houver denúncia.
O movimento do ministro acontece em um momento em que a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) questiona sua atuação e pleiteia que ele se declare suspeito para conduzir o inquérito do golpe. Os advogados pediram que a investigação seja redistribuída e que as decisões tomadas por Moraes sejam anuladas por falta de imparcialidade.
A Polícia Federal descobriu que Moraes foi monitorado clandestinamente e que aliados próximos de Bolsonaro envolvidos na trama golpistas queriam a prisão do ministro. Neste caso, a chance do recurso prosperar é pequena. O STF já validou a atuação de ministros em situações semelhantes, como no julgamento do ex-deputado Daniel Silveira (PTB-RJ).
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O voto de Toffoli
Ao votar para manter o vídeo em sigilo, Toffoli argumentou que seria “prematuro” permitir o compartilhamento de cópias das filmagens na fase de investigação.
“Admitir a incidência do contraditório no inquérito em matéria probatória equivaleria, em apertada síntese, a dar antecipados conhecimento e oportunidade de manifestação aos envolvidos no procedimento, para lhes possibilitar reação prévia; o que é incompatível com a natureza do inquérito, especialmente no tocante à arrecadação de elementos informativos”, escreveu.
O ministro reiterou ainda que o material está disponível para os advogados assistirem. Eles só não podem levar consigo uma versão.
“A incidência da garantia à ‘ampla defesa’ no inquérito policial revela-se, por exemplo, no direito assegurado ao defensor de acessar os autos e os elementos de informação nele já documentados, o que em momento algum se inviabilizou, pelo contrário. Não alcança, entretanto, a possibilidade de dispor - por meio de manuseio e extração de cópia - de elemento informativo cuja análise ainda não está findada.”
Toffoli afirma ainda que colocou o material em sigilo como “precaução” para preservar a imagem dos envolvidos.
“Nesta quadra da apuração preponderam princípios correlatos ao interesse das investigações e à preservação dos envolvidos e terceiros; não incidindo em sua plenitude, os princípios do contraditório e ampla defesa.”
Os recursos
Os ministros julgam recursos dos empresários e da PGR contra o sigilo do vídeo. O criminalista Ralph Tórtima Stettinger Filho, que lidera a defesa, insiste em uma perícia privada e argumenta que o trabalho depende do acesso irrestrito ao material. O argumento é que um perito particular não teria condições adequadas para produzir seu relatório sem uma cópia da mídia.
A Procuradoria-Geral da República também vem questionando o sigilo às imagens. O órgão está na fila para obter uma versão. A PGR afirma que precisa do material para formar uma posição sobre o entrevero. A procuradora-geral da República Elizeta Paiva Ramos, que ocupou o cargo interinamente, chegou a criticar o que chamou de “privilégios” a Moraes.
Como mostrou o Estadão, a Assessoria Nacional de Perícia em Tecnologia da Informação e Comunicação e a Coordenadoria de Investigação em Evidências Digitais e Eletrônicas da Procuradoria-Geral da República afirmaram que a decisão de manter as filmagens em sigilo é “temerária”, “desnecessária” e contraria boas práticas.
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