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O barulho e os conflitos

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Por Rafael Moreira Mota
Rafael Moreira Mota. Foto: Divulgação

Viver em sociedade em harmonia não é nada fácil. O barulho prova isso e serve de exemplo para aqueles que estudam a solução de conflitos para uma melhor convivência ou mesmo que registram o cotidiano do ser para o seu aperfeiçoamento.

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Sigmund Freud (1853-1939) cunhou teoria para o ensurdecedor barulho do silêncio, o que veio a nominar como angústia. Antes, certa vez, Freud reclamou do barulho que a sua irmã fazia ao ensaiar no piano, que teve o fim de ser retirado da sala e nunca mais ser escutado. Ronald Coase (1910-2013), laureado pelo prêmio Nobel de economia (1991) e um dos economistas mais citados em artigos acadêmicos, publicou paper seminal The Problem of Social Cost em que usou o exemplo do barulho para discorrer sobre as diversas facetas do direito de propriedade e suas consequências. Em seus estudos, o economista abordou o caso julgado pelo Judiciário Inglês Sturges v Bridgman (1879), em que um confeiteiro, instalado no local há mais de 60 anos, utiliza máquinas barulhentas que passam a atrapalhar um médico que se muda para loja adjacente. Coase analisa o caso sob o enfoque da correta alocação dos direitos de propriedade como determinante para conduzir a resultados sociais eficientes. No caso, o ganho mútuo seria maximizado mediante acordo entre confeiteiro e médico. O economista é considerado o pai da interface de direito e economia.

No Brasil, diversos conflitos batem às portas do Poder Judiciário, alguns deles, passando antes até pelas autoridades policiais. Condenações ao pagamento de compensações são comuns. Porém, o que se vê é um persistente aumento dos conflitos, reverberando não só nas Cortes, mas também no legislativo, que, por sua vez, busca normativos para trilhar a harmonia na sociedade.

A legislação brasileira sobre barulho é vasta, heterogênea e esparsa. Cotidianamente normas são criadas por todos os entes da Federação, citando-se, como exemplos, o Decreto n. 33.868/2012, que regulamenta a Lei Distrital n. 4.092/2008, o Decreto n. 11.467/1974, que regulamenta a Lei n. 8.106/1974 de São Paulo, Lei n. 9.505/20, do município de Belo Horizonte, Lei de Contravenções Penais (artigos 42 ou 65) e Lei de Crimes Ambientais (art. 54), sem contar a previsão do Código Civil que autoriza os condomínios a editar regras próprias quanto ao silêncio.

É vigorosa a busca de resposta mediante o exercício constante do poder legiferante, no entanto quanto maior se torna o arcabouço legal para regular o barulho também se avolumam dúvidas na aplicação da Lei. Por exemplo, as normas distritais acima citadas não especificam o que são fontes sonoras de atividade contínua e descontínua, diferente das legislações mineira e paulista, que chegam a tratar do tema, mas de forma diversa, dificultando o próprio cumprimento da Lei. Outros problemas recorrentes na legislação estão na forma como se aferirá o barulho; se policiais podem a interromper o barulho sem nenhuma medição sonora comprobatória de poluição; quem tem a legitimidade para promover a fiscalização; se deve haver livre acesso às dependências onde estiverem instaladas as fontes emissoras.

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A esperança advém do desenvolvimento e aplicação de novas tecnologias que possam aprimorar bens e serviços, impactando na diminuição da emissão de ruídos ou atenuar a sua percepção e consequentemente reduzindo os conflitos decorrentes de barulho. Afinal, contar que a solução virá somente do debate sobre a legislação, traz à memória o título da comédia, que se passa na Itália, do dramaturgo William Shakespeare (1564-1616), "muito barulho por nada".

As vozes de todos querem solucionar os conflitos e as tecnologias hoje disponíveis podem ser elemento decisivo na obtenção da eficiência alocativa máxima em um novo paradigma, pois, de fato, o que queremos é um belo som para que a vida em sociedade seja repleta de harmonia e longe não só do barulho, mas também do silêncio da angústia.

*Rafael Moreira Mota, advogado, mestre em Direito

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