No último dia 16 o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná recebeu evento inédito e importante, de quilate internacional, sobre a promoção da saúde mental e o papel do judiciário na efetivação da política antimanicomial.
A presidente do CNJ e do STF, ministra Rosa Weber, esteve em Curitiba para firmar a importância do papel do sistema de justiça na reforma psiquiátrica e o compromisso esposado na resolução 487/2023 do CNJ.
A resolução - fruto do intenso esforço e dedicação dos membros e membras do Grupo de Trabalho instituído pelo CNJ em 2021 - Institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário e estabelece procedimentos e diretrizes para implementar a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei n. 10.216/2001, no âmbito do processo penal e da execução das medidas de segurança.
Ao conectar o tema da reforma psiquiátrica e a Resolução CNJ 487/2023 com o caso Damião Ximenes Lopes, podemos compreender a importância do sistema de justiça na garantia dos direitos das pessoas com transtornos mentais e na promoção de uma sociedade mais justa e inclusiva.
Damião Ximenes Lopes, um jovem brasileiro de 30 anos, faleceu em 1999 após ser submetido a tratamento em uma instituição psiquiátrica. Sua morte, marcada por tortura e violência, trouxe à tona questões preocupantes sobre a forma como as pessoas com transtornos mentais eram tratadas dentro dessas instituições.
O caso Damião Ximenes Lopes foi a primeira sentença condenatória ao Estado Brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos e provocou um intenso debate sobre os direitos das pessoas com transtornos mentais e evidenciou a urgência de uma reforma psiquiátrica que colocasse em foco a desinstitucionalização e a promoção da inclusão social.
Diante dessa realidade, o sistema de justiça assumiu um papel fundamental na busca por justiça, reparação e transformação do modelo vigente. É no contexto de cumprimento das reparações determinadas pela Corte IDH que a Resolução CNJ 487/2023, justamente batizada de Resolução Ximenes Lopes, institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário, como avanço significativo ao estabelecer diretrizes claras para o tratamento adequado das pessoas com transtornos mentais em conflito com a lei, garantindo o respeito aos seus direitos e promovendo a inclusão social.
Referido documento traz diretrizes para o tratamento adequado das pessoas com transtornos mentais em conflito com a lei, assegurando a sua integridade física e mental, bem como o respeito à sua dignidade. A partir de suas diretrizes, o sistema de justiça como um todo - e em especial ministério público, defensorias e magistratura - têm orientações claras sobre como lidar com pessoas com transtornos mentais em conflito com a lei, garantindo o respeito aos seus direitos e promovendo a inclusão social.
O paradigma impulsionado pelo Conselho Nacional de Justiça promove a humanização do sistema de justiça, ao incentivar a adoção de práticas que considerem a singularidade de cada pessoa com transtorno mental. Dessa forma, busca-se superar visões estigmatizantes e preconceituosas, priorizando o tratamento adequado, o respeito à autonomia e a promoção da saúde mental.
A resolução também estimula a articulação entre o sistema de justiça e outros setores, como a saúde e a assistência social, visando uma abordagem integral e integrada das questões relacionadas à saúde mental. Essa cooperação é essencial para garantir o atendimento adequado das demandas das pessoas com transtornos mentais, bem como para a efetivação de políticas públicas que promovam a inclusão e a igualdade.
Temos assim um avanço importante na promoção da reforma psiquiátrica e na consolidação da Política Antimanicomial no Poder Judiciário. O papel do sistema de justiça é fundamental nesse processo, pois cabe a ele garantir o acesso à justiça, proteger os direitos humanos e promover a inclusão social das pessoas com transtornos mentais.
Aquelas e aqueles que lutam por direitos humanos acreditam no poder transformador das histórias humanas, na capacidade de mobilizar e sensibilizar as pessoas para lutar por um mundo mais justo. Que a história de Damião Ximenes Lopes nos inspire ao tratamento adequado das pessoas com transtornos mentais, sobretudo aquelas mais vulnerabilizadas privadas de liberdade e em conflito com a lei.
*Melina Fachin é advogada, pós-doutora em democracia e direitos humanos (Universidade de Coimbra). Professora da UFPR. Sócia do escritório Fachin Advogados Associados
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