A Polícia Federal (PF) abriu na manhã desta quinta-feira, 1, a Operação Hefesto para aprofundar a investigação sobre um esquema de fraudes em licitações de 43 cidades de Alagoas.
Aliados do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), estão entre os investigados. Ele não é alvo da ação.
O prejuízo estimado até o momento é de R$ 8,1 milhões, mas os investigadores desconfiam que o rombo aos cofres públicos pode ser maior, talvez até o dobro.
Os policiais fazem buscas em 27 endereços ligados aos investigados – 16 em Maceió (AL), oito em Brasília (DF), um em Gravatá (PE), um em São Carlos (SP) e um em Goiânia (GO).
Grandes quantias em dinheiro vivo foram apreendidas e ainda estão sendo contabilizadas. Em um dos endereços, a PF encontrou um cofre lotado de valores em espécie (assista abaixo).
Duas pessoas também são alvo de mandados de prisão temporária em Brasília. As ordens judiciais foram expedidas pela 2.ª Vara Federal de Alagoas.
A PF afirma que houve direcionamento e superfaturamento de contratos para a compra de equipamentos de robótica para escolas públicas, custeados com recursos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), repassado pelo governo federal. As fraudes teriam ocorrido entre 2019 e 2022.
“As citadas contratações teriam sido ilicitamente direcionadas a uma única empresa fornecedora dos equipamentos de robótica, através da inserção de especificações técnicas restritivas nos editais dos certames e de cerceamento à participação plena de outros licitantes”, informa a Polícia Federal. A investigação é tocada em conjunto com a Controladoria Geral da União (CGU).
A Justiça Federal também determinou o o sequestro de bens dos investigados e a suspensão de processos licitatórios e contratos administrativos celebrados entre a empresa fornecedora investigada, a Megalic LTDA, e os municípios alagoanos que receberam recursos do FNDE para aquisições de equipamentos de robótica.
A Megalic está registrada no bairro de Jatiúca, em Maceió, com capital social declarado de R$ 1 milhão. A empresa não fabrica os equipamentos e funcionou apenas como intermediária na aquisição dos kits de robótica. Os sócios são Roberta Lins Costa Melo e Edmundo Catunda, pai do vereador de Maceió João Catunda, aliado de Lira.
A PF investiga ainda uma segunda fase do esquema, envolvendo lavagem de dinheiro. Os policiais identificaram transações fracionadas, abaixo de R$ 50 mil, para burlar o sistema de alertas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
“A investigação identificou ainda que foram realizadas, pelos sócios da empresa fornecedora e por outros investigados, movimentações financeiras para pessoas físicas e jurídicas sem capacidade econômica e sem pertinência com o ramo de atividade de fornecimento de equipamentos de robótica, o que pode indicar a ocultação e dissimulação de bens, direitos e valores provenientes das atividades ilícitas”, explica a PF.
O nome da operação, Hefesto, é uma referência ao deus da tecnologia, do fogo, dos metais e da metalurgia na mitologia grega.
O Tribunal de Contas da União (TCU) já havia aberto um procedimento para investigar a compra dos kits de robótica. Os ministros chegaram a suspender contratos firmados entre prefeituras de Alagoas e de Pernambuco. A área técnica do TCU afirmou ter encontrado indícios de superfaturamento e apontou que algumas escolas sequer tinham condições operacionais e de infraestrutura para receber os equipamentos.
COM A PALAVRA, A MEGALIC
“Cabe esclarecer, em primeiro lugar, que todas as aquisições se deram a partir de parâmetros técnicos delineados pelo Ministério da Educação e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Essas aquisições, frise-se, foram precedidas de processo licitatório legal e com ampla competitividade.
O processo de contratação desses kits já foi analisado, em recente ocasião, pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e foi afastada a hipótese de restrição indevida à competitividade ou de direcionamento a uma única empresa. Cabe ressaltar que a mesma auditoria considerou o preço das contratações compatível com contratações similares de outros fornecedores. O tribunal chegou a essa conclusão a partir de auditoria detalhada e aprofundada e determinou que as prefeituras que já tivessem concluído o processo de aquisição fizessem os devidos pagamentos à empresa.
Importante ressaltar, ainda, que a reportagem da Folha de S.Paulo, publicada em abril de 2022 e que deu origem à investigação policial, faz uma comparação grosseira dos produtos da Megalic com kits de robótica comprados por municípios do interior de São Paulo.
O próprio TCU, no acórdão publicado em abril passado, considerou tal comparação ‘inviável’, destacando a ‘grande diferença qualitativa dos materiais empregados’, atestada em parecer por sua área técnica. Os kits adquiridos pelas prefeituras paulistas eram confeccionados em plástico e não tinham finalidade pedagógica, enquanto as peças da Megalic são confeccionadas em alumínio anodizado, desenhadas especificamente para uso em ambiente escolar.
A empresa e sua defesa ainda não tiveram acesso ao inquérito policial e às análises em que se baseia. Só depois de avaliação minuciosa desse conteúdo será possível demonstrar o grave equívoco nas acusações contra as aquisições de kits de robótica educacional.”
Eugênio Aragão, advogado, sócio do Eugênio Aragão Advogados Associados
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