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Opinião|Pacto em favor da vida

Quem é que permanece inerte ante a destruição do bioma essencial ao clima planetário, que é a Amazônia? Quem imaginaria que o Pantanal mato-grossense, a região mais úmida da Terra, teria milhares de focos de incêndio e acabaria com santuários ecológicos insuscetíveis de restauração?

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convidado
Por José Renato Nalini

A deterioração do ambiente em todo o planeta é algo incompatível com o grau civilizatório da espécie racional. Custa a crer que a humanidade continue a desmatar, a poluir, a envenenar atmosfera, solo e água.

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Não há mais espaços incólumes. Tudo está em vias de exaurimento, porque a população cresce aritmeticamente e destrói geometricamente. Aqueles que continuam a negar a influência do bicho-homem no depauperamento dos recursos naturais devem visitar com olhos abertos a cidade em que moram.

Nela existe arborização suficiente? Nela o saneamento básico atende a todas as pessoas? Existe água pura acessível para todos? A cidade tem sistema de drenagem que suporte precipitações pluviométricas intensas?

Como é que a sua cidade cuida dos resíduos sólidos, a terceira causa emissora dos gases venenosos geradores do efeito-estufa. Tudo o que é descartado pela população é reciclado? Ninguém joga nada do que desperdiça nas vias públicas?

E os restos de comida, de verdura, de folhas secas? Tudo vira compostagem?

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Se as respostas forem todas satisfatórias, não sei onde você mora. Mas, de certo, não é em qualquer de nossas cidades brasileiras. Aqui, é fácil verificar que os maus-tratos perpetrados contra o ambiente já tornaram a situação aparentemente irreversível. Há quem sustente inexistir chance de a humanidade se salvar. Ela se precipitou, aceleradamente, rumo ao caos.

Cansaram de alertar os cientistas. Antonio Gutérrez clama desesperado que a humanidade se perdeu, está numa nau sem rumo, que já trombou com o iceberg. Ou lembra um veículo cujo ritmo é o de marcha contínua, uniformemente acelerado, rumo ao inferno.

Quem achar que isso é catastrofismo ou exagero, leia o livro “A terra inabitável – Uma história do futuro”, escrito por David Wallace-Wells. Ele começa de forma objetiva: “É pior, muito pior do que você imagina. A lentidão da mudança climática é um conto de fadas, talvez tão pernicioso quanto aquele que afirma que ela não existe, e chega a nós em um pacote com vários outros, numa antologia de ilusões reconfortantes: a de que o aquecimento global é uma saga ártica, que se desenrola num lugar remoto; de que é estritamente uma questão de nível do mar e litorais, não uma crise abrangente que afeta cada canto do globo, cada ser vivo; de que se trata de uma crise do mundo “natural”, não do humano; de que as duas coisas são diferentes e vivemos hoje de algum modo alijados, acima ou no mínimo protegidos da natureza, não inescapavelmente dentro dela e literalmente sujeitos a ela; de que a riqueza pode ser um escudo contra as devastações do aquecimento; de que a queima de combustíveis fósseis é o preço do crescimento econômico contínuo; de que o crescimento e a tecnologia que ele gera nos propiciarão a engenharia necessária para escapar do desastre ambiental; de que há algum análogo dessa ameaça, em escala ou escopo, no longo arco da história humana, capaz de nos deixar confiantes de que sairemos vitoriosos dessa nossa medição de forças com ela”.

Tudo isso é mentira. A ciência desmente o negacionismo ingênuo e também o negacionismo orquestrado, parte do lobby dos que se enriquecem mantendo o status quo e armados de uma couraça de insensibilidade que os faz ignorar a tragédia.

Quem é que permanece inerte ante a destruição do bioma essencial ao clima planetário, que é a Amazônia? Quem imaginaria que o Pantanal mato-grossense, a região mais úmida da Terra, teria milhares de focos de incêndio e acabaria com santuários ecológicos insuscetíveis de restauração?

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A ONU tem projeções sombrias: 200 milhões de refugiados do clima vão deixar sua terra natal até 2050. Pense-se que duzentos milhões era toda a população mundial no auge do Império Romano. Mas as coisas podem ser até mais trágicas: “Um bilhão ou mais de pobres vulneráveis com pouca opção além de lutar ou fugir”. Um bilhão é mais gente do que a atual população da América do Norte.

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São temas que passam ao largo da preocupação comum e rotineira. Estão no cenário, prestes a entrar em ação, os chamados “elementos do caos”, de acordo com David Wallace-Wells: o calor letal (em São Paulo, as ondas de calor matam mais do que as ondas de frio), a fome, o afogamento, os incêndios florestais, os desastres que não são mais naturais, o esgotamento da água doce, a morte dos oceanos, o ar irrespirável, as pragas do aquecimento, o colapso econômico e os conflitos climáticos.

Tudo isso não sugere que a lucidez residual do mundo que se diz e se quer civilizado faça um pacto em favor da vida? É mais do que urgente cuidar disso, pois o aviso final já soou há tempos.

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo. Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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