Conversas por meio do aplicativo WhatsApp servem como provas para a Polícia Federal em investigação que apura a suposta participação de ex-diretores das Lojas Americanas em fraudes contábeis de R$ 25,3 bilhões. Em uma troca de mensagens de 2018, por exemplo, dois funcionários da empresa falam sobre melhorias na planilha financeira para apresentação ao mercado financeiro.
Em nota, a rede varejista diz que “foi vítima de uma fraude de resultados pela sua antiga diretoria, que manipulou dolosamente os controles internos existentes”. O ex-CEO das Americanas Miguel Gutierrez negou, por meio de sua defesa, qualquer participação em fraude e disse colaborar com as autoridades. A defesa do ex-diretor José Timotheo Barros afirmou que desde o início das apurações, documentos, informações econômicas e dados telemáticos foram colocados à disposição para a apuração do caso
Para os agentes da PF, as mudanças partiram “a pedido dos gestores” e “os números reais eram artificialmente incrementados, não apenas para ficarem próximos ao orçado, mas também condizentes com as expectativas do mercado”. A conclusão partiu da troca de mensagens entre Carlos Padilha e Flávia Carneiro, em abril de 2018. Padilha fazia parte do quarto escalão das Americanas, enquanto Flávia, do quinto escalão da empresa.
De acordo com documentos da PF, Padilha cita Fabien Picavet, diretor executivo de relações com o investidor, que teria determinado mudanças nos documentos. “Fabien me retornou dizendo que não está bom. Margem, resultado financeiro e lucro. Ele te falou isso? A ideia de vocês sentarem é pra ajudar”, disse Padilha para Flávia.
A PF deflagrou na quinta-feira, 27, a Operação Disclosure para investigar a fraude contábil na rede varejista. Agentes vasculharam 15 endereços ligados a ex-dirigentes da companhia no Rio de Janeiro.
Em um outro trecho do relatório da PF, há citação de uma criação de grupo no WhatsApp, que permite inclusão de diversas pessoas, denominado “Auditoria 2016″, o qual, “entre 31 de janeiro de 2017 e 5 de fevereiro de 2017, atuou, de forma coordenada, para emissão de cartas de circularização junto a bancos de forma a omitir existência de operações de risco sacado”, informou a PF. O grupo de conversa contou com a presença de um número de celular que seria do ex-diretor executivo de tesouraria das Americanas Luiz Saraiva.
Para os investigadores da PF, o grupo foi criado para envio de atualizações por Saraiva e Fabio Abrete, ex-diretor executivo das Americanas, sobre o andamento das tratativas junto às instituições financeiras para endereçar os problemas.
A investigação até o momento afirma ainda que os diretores das Americanas usaram, por exemplo, a expressão “arrecadação complementar”, termo que, segundo a PF, era “mais agradável para se referir à fraude contábil”. Neste ponto, investigadores apontam “fraude de registro de cartas de Verba de Propaganda Cooperada”.
A maquiagem em dados contábeis, aponta a investigação, era de conhecimento do ex-CEO Gutierrez. A PF utiliza como prova uma conversa entre Timotheo Barros, ex-diretor das Americanas e pertencente ao terceiro escalão da diretoria, e Flávia Carneiro.
“Tal prática era de conhecimento de toda a cúpula mencionada, e cada um exercendo sua respectiva função contribuía para a consecução da fraude na empresa. Inclusive era de conhecimento do CEO Miguel Gutierrez, conforme se verifica nas mensagens trocadas entre a Colaboradora Flávia Carneiro e Thimoteo Barros”, afirmou a PF.
COM A PALAVRA, A AMERICANAS
A Americanas reitera sua confiança nas autoridades que investigam o caso e reforça que foi vítima de uma fraude de resultados pela sua antiga diretoria, que manipulou dolosamente os controles internos existentes. A Americanas acredita na Justiça e aguarda a conclusão das investigações para responsabilizar judicialmente todos os envolvidos.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE MIGUEL GUTIERREZ
“Miguel reitera que jamais participou ou teve conhecimento de qualquer fraude e que vem colaborando com as autoridades, prestando os esclarecimentos devidos nos foros próprios”
COM A PALAVRA, A DEFESA DE JOSÉ TIMOTHEO BARROS
A defesa do ex-diretor afirmou que “desde o início das apurações, documentos, informações econômicas e dados telemáticos foram colocados à disposição para a apuração do caso. De toda forma, o fato de hoje (operação de quinta-feira, 27 de junho) é importante para que seja concedido pela Justiça o reiterado pedido de acesso às delações premiadas”.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE ANNA SAICALI E DOS DEMAIS INVESTIGADOS
A reportagem do Estadão busca contato com a defesa da ex-diretora das Lojas Americanas e dos demais investigados. O espaço está aberto para manifestação também dos outros citados na Operação Disclosure. (pepita.ortega@estadao.com; fausto.macedo@estadão.com e heitor.mazzoco@estadao.com)
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