Ao pedir o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 16 investigados da Operação Verine - apuração sobre supostas fraudes na carteira de vacinação do ex-chefe do Executivo - a Polícia Federal fez uma ressalva sobre possíveis novas imputações aos investigados.
O delegado Fábio Alvarez Shor indicou que aguarda informações do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para identificar se o grupo usou os certificados de vacinação ideologicamente falsos para entrar naquele País. Segundo ele, a eventual confirmação pode configurar novas condutas ilícitas.
A remessa de informações, pelos EUA, é considerada uma diligência pendente da Operação Venire. Os dados foram requeridos por meio de auxílio jurídico em matéria penal solicitado junto ao DOJ. Shor não mencionou qualquer prazo para o recebimento dos elementos.
A indicação consta do relatório final da investigação sobre a inserção de dados falsos no sistema do Ministério da Saúde em benefício do ex-presidente, de sua filha Laura e de um grupo de aliados de Bolsonaro. A ressalva foi feita pouco antes de a PF detalhar os indiciamentos do caso.
O ex-chefe do Executivo foi enquadrado pelos crimes de associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informação - delitos cujas penas máximas, somadas, podem chegar a 15 anos de reclusão.
A PF narra que ele ‘agiu com consciência e vontade’ para a fraude em sua carteira de vacinação contra a covid-19, determinando que o ex-ajudante de ordens da Presidência tenente-coronel Mauro Cid ‘intermediasse a inserção de dados falsos’ nos sistemas do Ministério da Saúde.
A reportagem busca contato com as defesas do ex-presidente e dos demais indiciados. O espaço está aberto para manifestações. Nas redes sociais, o advogado Fábio Wajngarten, que representa o ex-presidente, disse que o indiciamento é um ‘absurdo’.
Além de Bolsonaro, outros 16 investigados foram incriminados pela PF, entre eles o tenente-coronel Mauro Cid, sua mulher Gabriela Santiago Cid, o deputado federal Gutemberg Reis de Oliveira, o ex-major do Exército Ailton Gonçalves Barros e três assessores do ex-presidente - Max Guilherme Machado de Moura, Marcelo Costa Câmara e Sergio Rocha Cordeiro.
O documento aportou no gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, nesta segunda-feira, 18, e foi tornado publico nesta manhã. Com o relatório final do inquérito, o caso segue para o Ministério Público Federal, a quem cabe analisar se oferece denúncia formal à Justiça para abertura de ação penal.
A Polícia Federal narra que o ex-presidente se associou com outros investigados, desde ‘novembro de 2021 até dezembro de 2022 para praticarem crimes de Inserção de dados falsos em sistema de informações, especificamente dados de vacinação contra a Covid-19, para emitirem os respectivos certificados ideologicamente falsos, no intuito de obterem vantagens indevidas relacionadas a burla de regras sanitárias estabelecidas durante o período de pandemia’.
“Tais condutas tiveram como consequência a alteração da verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, a condição de imunizado contra a Covid-19 dos beneficiários. Com isso, tais pessoas puderam emitir os respectivos certificados e utilizá-los para burlarem as restrições sanitárias vigentes”, narrou o delegado Fábio Alvarez Shor.
Uma das ‘possíveis vantagens indevidas’ aventadas pela PF seria a entrada dos investigados nos EUA, que exigiam a comprovação de vacinação contra a covid-19 para entrada naquele País durante a pandemia. Bolsonaro e seus aliados faziam declarações constantes contra a imunização.
No relatório final da investigação, a Polícia Federal detalha o passo a passo da fraude descortinada na Operação Verine: desde a ordem, de Bolsonaro, para que Cid providenciasse não só sua carteira de vacinação falsificada, mas também o documento da filha Laura; até a tentativa de acobertar o caso, com a destruição dos certificados que haviam sido impressos dentro do Palácio do Alvorada e a exclusão de dados do sistema do Ministério da Saúde.
Segundo a corporação, o modus operandi das fraudes era o seguinte: ‘a partir da solicitação da pessoa que queria se beneficiar com o certificado de vacinação ideologicamente falso, Cid encaminhava o pedido de inserção dos dados falsos para Ailton Gonçalves Barros, ex-major do Exército’; este, então, encaminha os dados do beneficiário e o pedido para o Secretário Municipal de Duque de Caxias, João Carlos de Sousa Brecha que, mediante suas credenciais de acesso, executava a inserções dos dados falsos no Sistema do Ministério da Saúde.
COM A PALAVRA, A DEFESA DO EX-PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
COMUNICADO AOS VEÍCULOS DE IMPRENSA
A defesa do ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro, tendo tomado conhecimento esta manhã, por meio de diversos veículos de imprensa, acerca da decisão de formalização de indiciamento de seu cliente nos autos da Petição 10405, que apura fraudes na confecção de cartões vacinais, vem esclarecer o quanto segue:
1. É público e mundialmente notório, que o ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro, por convicções pessoais, jamais fez uso de qualquer imunizante contra COVID-19, a despeito de haver adquirido e disponibilizado milhões de doses a todos os cidadãos brasileiros.
2. Ao ingressar nos Estados Unidos da América (EUA), no final de dezembro de 2022, nenhum atestado vacinal lhe foi solicitado, visto que, na condição de presidente da República, estava dispensado de tal exigência.
3. Ao deixar os EUA, em março de 2023, realizou teste de PCR na véspera, valendo-se de tal documento para regressar ao Brasil.
4. O ex-Presidente JAMAIS determinou ou soube que qualquer de seus assessores tivessem confeccionado certificados vacinais com conteúdo ideologicamente falso.
5. As razões, bastante perfunctórias, indicadas pelo Exmo. Delegado de Polícia Federal, ignoram que não haveria qualquer motivo razoável ou efetividade na falsificação de certificados vacinais em relação ao ex-Presidente e a sua filha, menor de 18 anos.
6. O ex-Presidente não precisava utilizar qualquer documento vacinal, dada sua condição diplomática, para realizar viagem internacional.
7. Sua filha, à época com 12 anos de idade, estaria dispensada de atestado vacinal, visto que nenhum país do mundo impunha a exigência vacinal à crianças.
8. Se, pelas razões expostas, tanto o ex-Presidente como sua filha não necessitavam de certificados vacinais para empreenderem viagem, é inafastável a indagação de qual seria o motivo razoável para que se aderisse a uma arriscada empreitada clandestina e criminosa.
9. Por derradeiro, não é demais obtemperar, de forma hipotética, que se o ex-Presidente, mundialmente conhecido por sua posição pessoal em não utilizar nenhum imunizante, apresentasse um certificado vacinal em qualquer posto de imigração no mundo, séria imediatamente reconhecido e publicamente desqualificado em razão da postura que sempre firmou em relação ao assunto.
10. Assim, a decisão da autoridade policial no caso em apreço se demonstra precipitada, ao menos com relação ao ex-Presidente, visto que não há fundada e objetiva suspeita de sua participação ou autoria nos delitos em apuração.
11. Se qualquer pessoa tomou providências relacionadas às carteiras de vacinação do ex-Presidente e de sua filha, o fez por iniciativa própria, à revelia de ambos, sendo claro que nunca determinaram ou mesmo solicitaram que qualquer conduta, mormente ilícita, fosse adotada em seus nomes. Certamente não há nos autos nenhuma prova de conduta do exPresidente em sentido diverso, sendo certo que não havia nenhuma necessidade para tanto.
São Paulo, 19 de março de 2024
Paulo Amador da Cunha Bueno OAB/SP Nº 147.616 Daniel Bettamio Tesser OAB/SP n.° 208.351 Fábio Wajngarten OAB/SP n.° 162.273
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