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Pilates, beleza, Itália, política, autoajuda, ‘saudades’: as conversas entre lobista e desembargador

Diálogos entre o advogado Roberto Zampieri, o ‘lobista dos tribunais’ assassinado com 12 tiros em Cuiabá, e o desembargador Sebastião de Moraes Filho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, indicam como operava esquema de tráfico de influência na Corte e turbinam investigações sobre suposto comércio de sentenças judiciais milionárias que inquietam gabinetes de ministros do Superior Tribunal de Justiça

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Atualização:
Mensagens entre o advogado Roberto Zampieri e o desembargador Sebastião de Moraes, afastado do TJMT Foto: Reprodução

Quando apreenderam o celular ‘bomba’ do advogado Roberto Zampieri, o lobista dos tribunais, ao lado de seu corpo crivado de balas de uma pistola 9 mm, em Cuiabá, o primeiro passo dos policiais foi desbloquear o aparelho em busca de alguma pista do assassino. Logo, uma mensagem os surpreendeu. “Que Deus o tenha.”, escreveu o desembargador Sebastião de Moraes Filho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, seu amigo.

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Mal imaginavam os investigadores que o celular que eles acabavam de confiscar era o mapa para um suposto esquema de venda de sentenças no Tribunal de Justiça de Mato Grosso que se estendeu ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e pode ter aportado em gabinetes de ministros do Superior Tribunal de Justiça - Cortes onde Zampieri teria instalado uma rede de tráfico de influência, daí a alcunha ‘lobista dos tribunais’. .

Moraes Filho, desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, está afastado das funções desde agosto passado por suspeita de ligação com o esquema. Ele nega ilícitos e envolvimento com Zampieri.

Zampieri foi assassinado aos 57 anos de idade em dezembro do ano passado à porta de seu escritório - um fazendeiro é suspeito de ter sido o mandante. A morte do advogado deixou um rastro de segredos e pistas sobre um comércio forense milionário.

Da Polícia de Cuiabá a investigação saltou rapidamente para o patamar mais alto da Justiça, o Supremo Tribunal Federal, ante a suspeita de envolvimento de ministros do STJ, que se autointitula ‘Tribunal da Cidadania’. A Corte nega o envolvimento de ministros no caso e afastou dois servidores sob suspeita de envolvimento com o esquema.

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Mensagens entre o advogado Roberto Zampieri e o desembargador Sebastião de Moraes, afastado do TJMT Foto: Reprodução

Os primeiros indícios reunidos a partir da leitura de mensagens armazenadas no aparelho de Zampieri partiram da intensa troca de diálogos dele com o desembargador, no período entre junho e dezembro de 2023.

A perícia da Polícia Federal indica que desembargador e lobista se falavam, pelo WhatsApp, ao menos cinco vezes ao dia. O conteúdo não se limitava a julgamentos sob relatoria do magistrado. Frivolidades preenchem a maior parte do acervo, a saber: futebol, anedotas políticas, mensagens de autoajuda, frases motivacionais.

O desembargador compartilhava sua rotina pessoal com o lobista, narrando idas ao pilates, RPG e salão de beleza. Trocavam fotos de viagens e se atualizavam sobre os locais por onde o magistrado passava.

Em uma passagem, Zampieri disse que estava com saudades do desembargador, que fazia um passeio na Itália. As conversas também mostram o acesso livre do advogado ao gabinete e à casa do desembargador, ‘inclusive em horários não convencionais’, anotou o ministro Luís Felipe Salomão, ex-corregedor nacional de Justiça que, em agosto, decretou o afastamento de Sebastião de Moraes Filho.

Numa manhã de domingo, o magistrado deu ‘bom dia’ a Zampieri e a ele enviou uma foto em que aparece no futebol envergando a camisa do Botafogo do Rio, o Glorioso da Estrela Solitária. O lobista provocou: “Hoje vai trombar com o meu Palmeiras.” Discorreram, então, sobre o campeonato brasileiro.

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O advogado conhecia detalhes da agenda do magistrado e buscava horários para ser recebido. Em meio ao acerto de um melhor dia para uma reunião, Moraes Filho disse que estava de saída para ‘cortar o cabelo’. Em outra ocasião, desculpou-se, pois estava enrolado com preparativos de viagem de férias, em julho de 2023.

Da Itália, o desembargador cumprimentava o amigo a rigor. ‘Buongiorno’. Afagos, figurinhas e fotos do magistrado tomando vinho bateram na tela do celular de Zampieri. ‘O senhor está abusado!!’, divertiu-se Zampieri.

Segundo o CNJ, as mensagens "revelam a troca de afagos, amizade íntima e total liberdade piadas e comentários políticos" entre Zampieri e Sebastião. "Estamos mais por baixo do que c de cobra", escreveu o desembargador a advogado  Foto: Reprodução

Em agosto de 2023, quando o desembargador retornou ao expediente na Corte matogrossense, um tema sensível tomou conta do bate-papo: eles trataram de uma ação sobre disputa de duas fazendas na região de Paranatinga, a 400 quilômetros de Cuiabá, avaliadas em R$ 100 milhões.

O proprietário rural Anibal Manoel Laurindo, parte no processo, agora é apontado como o mandante da execução do advogado lobista. Ele teria contratado um coronel da reserva do Exército para passar a ‘encomenda’ a um pistoleiro.

O desembargador Sebastião de Moraes Filho e o advogado Roberto Zampieri (falecido) Foto: TJMT e Arquivo Pessoal

Zampieri e Sebastião de Moraes Filho conversaram sobre um pedido de suspeição do magistrado, impetrado pelo suspeito de ter mandado eliminar o advogado.

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Na ocasião, o lobista pediu ao desembargador que adiasse o julgamento dos recursos, o que de fato ocorreu. “Querem nos comprometer’, disse o desembargador, revelando preocupação. ‘Dizem que tem gravação de imagem de vc la em casa’; ‘dizem que vão me f...’.

Mensagens entre o advogado Roberto Zampieri e o desembargador Sebastião de Moraes, afastado do TJMT Foto: Reprodução

Moraes Filho se declarou suspeito para analisar o caso. Usou o despacho para um desabafo. Afirmou não reconhecer a ‘alegada e imprópria acusação de ser amigo’ de Zampieri e queixou-se de “ataques gratuitos” que lhe ‘tiraram a isenção de imparcialidade’ para julgar o caso.

Reclamou que os argumentos de quem o rotulou de parcial atingiram seu ‘âmago íntimo’ e indicou que estava se afastando do processo, não em razão da amizade com Zampieri, mas porque ‘de forma vil e maliciosa, o excipiente (uma das partes do processo) resolveu colocar questões outras que envolve seus familiares, esposa e filho’.

Apesar de se declarar suspeito, no entanto, o desembargador deu uma decisão contrária aos interesses do fazendeiro Anibal Laurindo e favorável à parte patrocinada por seu amigo advogado.

Para a Polícia, esse foi o ‘estopim’ para a concretização dos planos que já vinham sendo montados pelos suspeitos que decidiram matar o advogado.

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