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Opinião|Pix, emendas e Orçamento

Os instrumentos utilizados, as emendas parlamentares, encontram amparo no sistema jurídico brasileiro. A forma como são utilizados é que merece reflexão e a exigência de um comportamento escorreito dos mandatários eleitos por nós

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convidado
Por Carmen Silvia Valio de Araujo Martins

Nos últimos tempos muito se tem falado sobre as emendas parlamentares, especialmente a denominada “Emenda PIX”.

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Do que se trata? O que se está emendando? Isso é inconstitucional ou ilegal?

A emenda parlamentar é, juridicamente falando, um dos instrumentos constitucionais que possibilita a participação parlamentar no processo legislativo. A emenda aqui tratada não deve ser confundida com a Emenda Constitucional, que é diploma legal original e principal.

A emenda parlamentar de que ora cuidamos é instrumento secundário e acessório. É atribuição exclusiva do Poder Legislativo e pode ser apresentada por qualquer parlamentar, deputado ou senador, e por qualquer das comissões permanentes pertencentes a qualquer uma das Casas Legislativas.

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Qualquer propositura apresentada para a deliberação do Poder Legislativo, independente de ter sua iniciativa privativa ou não, se submete à participação parlamentar. Ao Poder Legislativo não cabe, regra geral, apenas e tão somente a ratificação das proposituras que lhe são apresentadas, sendo-lhe assegurado alterar a proposta original através de emendas e substitutivos, que seguem procedimento legislativo próprio para sua efetivação.

As emendas parlamentares, por si só, não apresentam qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade.

O que se discute diuturnamente hoje em dia, nos meios de comunicação e nas rodas de conversas sobre política, são as emendas parlamentares apresentadas ao Orçamento Geral da União, que abrange a previsão de gastos de todos os Poderes e órgãos do Estado brasileiro.

A iniciativa de elaboração e encaminhamento da lei ordinária - Lei Orçamentária Anual - LOA - que cuida do Orçamento Geral da União é delegada ao poder Executivo, ou seja, o projeto de lei que cuidará dos gastos e investimentos do dinheiro público federal será de iniciativa do Presidente da República, que o encaminhará ao Congresso Nacional, onde será apreciado pela Comissão Mista Permanente de Deputados e Senadores, na forma prevista pelo Regimento Interno do Congresso Nacional.

As diretrizes fundamentais da tramitação do projeto de lei orçamentário têm previsão constitucional, (arts. 166 e seguintes, C.F.). A previsão de apresentação de emendas à LOA está contida no §§ 2º, 3º e 4º do Artigo 166. O Artigo 166-A regulamenta as emendas individuais impositivas, que são aquelas apresentadas por parlamentares individualmente e são de execução obrigatória pelo Poder Executivo. Estas emendas poderão prever a transferência de recursos da União para os Estados, Municípios e para o Distrito Federal.

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A inserção do Artigo 166-A, feita em 2019 através da Emenda Constitucional 105, configura progresso relevante no que se refere à transparência da destinação do dinheiro público, pois efetivamente é um avanço na conduta referente às emendas parlamentares, embora esteja longe de ser uma solução definitiva.

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Emendas parlamentares ao orçamento sempre existiram, mas havia uma tendência de serem cumpridas as emendas apenas daqueles que integravam a base de apoio político do Governo. Na LOA – Lei Orçamentária Anual, apresentada em 1990 com a previsão orçamentária para 1991, por exemplo, foram apresentadas 8.834 emendas.

Porém, a liberação dos valores referentes às emendas parlamentares, não raras vezes, ficava na dependência da aprovação ou rejeição de outras proposituras, de acordo com a conveniência do Poder Executivo.

O chamado “orçamento secreto”, que se acredita tenha surgido com as emendas do relator, a partir da edição da EC 105/2019, sempre existiu. O relator da LOA, e de qualquer propositura, sempre pode apresentar emendas em seu parecer. Isso não é novidade. A novidade é que hoje se sabe que o Relator apresenta tais emendas.

A chamada “Emenda PIX” nada mais é que o codinome dado à situação regulada, desde 2019, pela Emenda Constitucional já referida, que inseriu o Artigo 169-A. O inciso I deste dispositivo constitucional prevê a transferência especial, em contraponto ao previsto no inciso II do mesmo artigo, que cuida das emendas com finalidade definida.

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Fica evidenciado, portanto, que não estamos diante de uma questão de natureza legal ou constitucional, mas sim de natureza ética.

Os instrumentos utilizados, as emendas parlamentares, encontram amparo no sistema jurídico brasileiro. A forma como são utilizados é que merece reflexão e a exigência de um comportamento escorreito dos mandatários eleitos por nós.

Já passou da hora de entendermos que o parlamento, seja ele federal, estadual, municipal ou distrital, é o retrato da nossa sociedade.

Somos nós que lá estamos. Os políticos que lá estão foram eleitos por nós, coletivamente.

Portanto, chega de votar em qualquer um, quando se trata do Poder Legislativo. Vamos assumir a nossa cota de responsabilidade na condução dos destinos do nosso país.

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Carmen Silvia Valio de Araujo Martins
Advogada da Abagge Advogados Associados, especializada em Direito Constitucional e Legislativo, foi assessora jurídica da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo durante 30 anos; participou da Comissão Especial de Reforma Política da OAB; é membro do Conselho Jurídico da Federação da Indústrias de São Paulo – Conjur/Fiesp e do Conselho Superior de Direito da Fecomércio, onde preside a Comissão de Assuntos Legislativos. Foto: Arquivo pessoal
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