Somos cidadãos, em vários sentidos. Vivemos na polis, na cidade. Precisamos participar da vida citadina. É meu direito, mas, também, minha obrigação. O constituinte de 1988 acenou com uma Democracia Participativa, ante a evidência de que a Democracia Representativa necessitava de uma reformatação. Uma das fórmulas de participar da vida da cidade é não apenas interessar-se por ela, aproximar-se da gestão municipal, mas também contribuir com a administração pública, acompanhando-a, fiscalizando-a, monitorando-a.
Todas as cidades do mundo estão tomando providências para repensar seus bairros, de maneira a torna-los mais agradáveis, saudáveis e compactos. Várias opções têm sido adotadas, para inverter a lógica irracional que durante muito tempo inspirou as gestões locais: servir prioritariamente ao automóvel do que aos humanos.
Com isso, é preciso redesenhar as ruas e calçadas, que são espaços de passagem e devem ser edificadas para o cidadão, para o pedestre, para o ciclista, não para o carro. Tornar os ambientes mais acessíveis já melhora muito a qualidade de vida municipal. Existe uma padronização universal para que as calçadas e passagens contem com aquele desenho generalizado, preparado para atender pessoas com mobilidade reduzida, de todas as idades e com cadeiras de rodas, hoje motorizadas, e carrinhos de bebê.
Um segredo que deve ser compartilhado por toda a população mundial é o de que a melhor amiga da vida humana se chama árvore. A arborização de calçadas, quintais e áreas públicas e particulares melhora em muito o microclima local. Ajuda a reduzir os efeitos das ilhas de calor e auxilia a drenagem urbana. Isso reduz os impactos das intensas precipitações pluviométricas.
Também contribui para maior aprazibilidade das cidades, a ampliação do mobiliário urbano. Bancos, mesas, playground feitos com materiais sustentáveis, aparelhos para ginástica, além de trazerem conforto, se transformam em espaços de lazer para os moradores. Isso otimiza o uso do espaço público e aumenta a sensação de segurança.
Outra excelente iniciativa é a criação de hortas e pomares urbanos. Hortas comunitárias congregam a vizinhança, melhoram a saúde mental dos munícipes, fornecem alimento para consumo local, atraem animais silvestres. O convívio entre pessoas que se entretêm no trato da terra e do cultivo é um dos mais relevantes fatores de prolongamento da vida saudável.
É urgente a adoção de energias renováveis, mediante instalação de sistema de energias como a solar e a fotovoltaica, em espaços públicos e privados. Isso reduz a dependência de matrizes poluentes. O transporte também precisa merecer apenas combustível limpo, com abandono gradual do venenoso petróleo. Como diz Carlos Nobre, mais carros elétricos na cidade sinalizam economia de mortes precoces. Muitas vidas serão salvas se os atuais veículos movidos a combustível fóssil forem substituídos por aqueles nutridos por etanol, biometano, biogás, eletricidade e outras fontes verdes.
Otimizar o aproveitamento de equipamentos públicos em diferentes momentos do dia e da semana é algo que confere um upgrade significativo à cidade. Também permitir a utilização de escolas e demais edifícios públicos para outras atividades, principalmente para propiciar à população um refrigério em dias de elevada temperatura, é providência benfazeja.
De igual forma, reduzir o espaço reservado ao trânsito para convertê-lo em área de convívio é outra iniciativa exemplar. Os “jardins de bolso” ou “pocket parks”, com assentos, mesas e arborização adequada, constituem um oásis de que as cidades têm crescente necessidade.
A prioridade, nas cidades, deve ser sempre o pedestre. Isso já é válido em locais bem civilizados, como Tóquio e Paris. Aqui, são abundantes as placas “La priorité est le pieton”. Aqui no Brasil, ainda deixamos muito a desejar nesse índice civilizatório.
É preciso ter coragem para deixar o centro para os pedestres, para dificultar o acesso de veículos a determinadas partes da cidade, para adotar o “trafic calming”, elevando-se o leito carroçável para o nível do passeio e aumento da área destinada à mobilidade ativa, seja com o andar a pé ou de bicicleta. Também é urgente a multiplicação de ciclovias e de faixas para o fluxo de pedestre, já que isso dá mais segurança para o tráfego de pessoas e ciclistas, além de desafogar o trânsito. Também os passeios merecem um olhar especial. Trocar o concreto por materiais que permitam melhor absorção da água e instalar rampas para dar acesso universal, atendem à necessidade de preparo da cidade para o envelhecimento da população.
A cidadania tem o direito-dever de oferecer mais sugestões. Afinal, é na cidade que se desenvolvem nossas atividades e acontece a nossa vida. Cuidemos dela, melhoremos suas condições, tornemo-las como as desejamos. A responsabilidade também é nossa, não apenas da administração pública.