O capitão Diogo Costa Cangerana, da Polícia Militar de São Paulo, foi preso nesta terça-feira, dia 26, pela Polícia Federal durante a Operação Tai-Pan, feita para desarticular um grupo formado por três fintechs que teriam movimentado R$ 6 bilhões nos últimos cinco anos para “diversas organizações criminosas”.
Cangerana foi assessor do governador Tarcísio de Freitas até o dia 3 de setembro. Ele trabalhava na Casa Militar do Palácio dos Bandeirantes até ser transferido para o 13.º Batalhão da PM, responsável pelo patrulhamento da Cracolândia.
A assessoria do governador disse, em nota, que o policial foi integrado à Casa Militar em abril de 2012 e que permaneceu no órgão até setembro. “Neste período, a Casa Militar não foi notificada sobre nenhuma investigação ou apuração em desfavor do policial. A Corregedoria da Polícia Militar, que também apura os fatos, acompanha os desdobramentos da operação deflagrada nesta terça-feira e está à disposição da Polícia Federal para colaborar com as investigações”, afirmou o Palácio dos Bandeirantes.
A reportagem não conseguiu localizar a defesa do oficial. A Polícia Militar não se manifestou, mas foi informada pela PF da prisão do oficial.
Doze agentes da PF bateram na porta do capitão às 6 horas. Ele é investigado sob a suspeita de ser um dos articuladores do “sistema financeiro do crime”. Ele cuidaria da abertura de contas nas fintechs, como uma espécie de articulador. Os investigadores põem sob suspeita transações mantidas entre pessoas e empresas que somam, entre crédito e débito, R$ 120 bilhões. O líder do grupo, sozinho, teria movimentado, em 2024, R$ 800 milhões.
Uma das fintechs investigadas é a 2 Go Bank, que foi denunciada pelo empresário Antonio Vinícius Lopes Gritzbach, o delator do Primeiro Comando da Capital (PCC) em seu depoimento à Corregedoria da Polícia Civil, em 31 de outubro. Gritzbach foi executado a tiros de fuzil pelo PCC, no dia 8 de novembro de 2024, na área de desembarque do aeroporto de Guarulhos, na Grande São Paulo.
De uma tradicional família de policiais militares, Cangerana viajou para Portugal em junho acompanhando o governador, que foi apresentar ofertas de ações da Sabesp para investidores europeus durante o processo de privatização da empresa. Em julho, acompanhou o governador na viagem ao Balneário Camboriú (SC), no evento do Conferência Política de Ação Conservadora (CPAC) Brasil, onde Tarcísio se encontrou com o presidente argentino, Javier Milei. e com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em outubro, o chefe da Casa Civil, Arthur Lima, concedeu a Cangerana gratificação mensal a título de representação. Em 11 de janeiro deste ano, o capitão recebeu e a medalha Valor Militar em grau prata concedida por Tarcísio. A medalha foi concedida “em reconhecimento aos bons, leais e relevantes serviços prestados” por Cangerana.
Durante as diligências, a PF apreendeu, em um escritório na Avenida Paulista, R$ 311 mil em espécie. Segundo a corporação, as fintechs sob suspeita montaram um “complexo sistema bancário paralelo e ilegal” movimentando bilhões de reais dentro do país e a partir ou para países como EUA, Canadá, Panamá, Argentina, Bolívia, Colômbia, Paraguai, Peru, Holanda, Inglaterra, Itália, Turquia, Dubai e especialmente Hong Kong e China, para onde se destinava a maior parte dos recursos de origem ilícita.
Cerca de 200 agentes foram às ruas para cumprir 16 ordens de prisão preventiva e 41 ordens de busca e apreensão. A ofensiva mira supostos crimes contra o sistema financeiro, ocultação de capitais, organização criminosa e evasão de divisas. A Operação foi batizada Tai-Pan em referência a uma obra chamada ‘chefe supremo’.
Além do capitão, entre os presos está o investigador da Polícia Civil, Cyllas Elia. Ele era o presidente e fundador do 2 Go Bank. Ele estava afastado do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) havia dois anos para cuidar de seus negócios. O 2 Go Bank trabalhava com clubes de futebol e torcidas organizadas. Havia feito, recentemente, uma proposta de R$ 100 milhões para gerir o banco do Corinthians, conforme o Estadão revelou.
Delação de Gritzbach e as mortes do PCC
Segundo Gritzbach, Rafael Maeda Pires, o Japonês do PCC, se dizia dono da fintech que tem Cyllas como sócio. O policial nega. A fintech informou por meio de nota que a instituição de pagamento “está colaborando com as investigações e segue à disposição das autoridades”
Gritzbach era investigado sob a acusação de ter mandado matar o traficante Anselmo Bechelli Santa Fausta, o Cara Preta, e seu segurança Antonio Corona Neto, o Sem Sangue, em dezembro de 2021. Ele fechou um acordo de delação premiada com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo.
No inquérito aberto pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) para investigar os homicídios de Cara Preta e Sem Sangue, foram ouvidos também Maeda – encontrado morto em 4 de maio de 2023 em uma garagem no Tatuapé – e o empresário de jogadores de futebol Danilo Lima de Oliveira, o Tripa.
Gritzbach dizia que todos os suspeitos haviam pagado propina para os policiais a fim de se livrarem das acusações. Ao Estadão, em janeiro, o empresário chegou a dizer que um deles entregou R$ 5 milhões de propinas a policiais civis.
O inquérito sobre a morte do Japonês levou o DHPP a deflagrar em 16 de agosto deste ano operação em conjunto com a Corregedoria da Polícia Civil contra suspeitos de terem participado do episódio. Foram cumpridos 13 mandados de busca.
A suspeita é de que Maeda tenha sido obrigado a se matar e de que policiais civis tenham obstruído as investigações, sumindo com provas. Antes de ser encontrado morto, ele mandou mensagem para a mulher: “Cuida bem da nenê. Eu te amo”. Na mesma operação, os corregedores apreenderam duas barras de ouro, duas pistolas, um fuzil e documentos, além de telefones celulares.
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