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Regime de bens definido em escritura de união estável não tem efeitos retroativos

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Por Laís Meinberg Siqueira e Helena Rippel Araujo
Atualização:
Laís Meinberg Siqueira e Helena Rippel Araujo. Foto: Divulgação

Há alguns anos a união estável tem sido cada vez mais adotada pelos casais brasileiros. Com a pandemia, houve um aumento significativo nas formalizações destas uniões, principalmente em razão das mudanças nas relações e de muitos casais passarem a dividir a mesma moradia. Os Cartórios, por sua vez, conferiram maior flexibilidade aos atos e passaram a autorizar a formalização das Escrituras por videoconferência.

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A importância de formalizar a união estável encontra-se, sobretudo, na definição do regime de bens a ser adotado pelo casal e da data inicial da relação, evitando-se assim, conflitos judiciais e desgastes familiares futuros. Na ausência de Escritura Declaratória de Reconhecimento de União Estável, a lei determina que vigorará o regime da comunhão parcial de bens. Uma prática muito comum entre os casais é a assinatura da Escritura após um tempo do início da relação, considerando que os critérios para a configuração da união estável nem sempre são rapidamente identificáveis, isto é, a "convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família" (artigo 1.723 do Código Civil).

Na maioria desses casos, o casal opta por definir um regime de bens de forma retroativa, isto é, desde o momento da data inicial da união definida pelos companheiros na respectiva Escritura. Parte da doutrina e jurisprudência defende esta possibilidade com fundamento na autonomia da vontade das partes e liberdade de contratar, especialmente pelo fato de a união estável ser uma alternativa mais informal e menos burocrática se comparada ao casamento.

Ocorre que, em agosto de 2021, a terceira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou a sua posição ao definir que a Escritura de Reconhecimento de União Estável e Regime de Bens não tem efeito retroativo. No referido processo, após anos de convivência, os companheiros assinaram uma Escritura sem estabelecer o regime de bens, apenas reconhecendo a união estável. Alguns anos depois, decidiram assinar outro documento, estabelecendo que o regime de bens era o da separação de bens, o que deveria surtir efeitos desde a data inicial da relação, há 35 anos atrás. O efeito retroativo não foi reconhecido pelo STJ (Recurso Especial nº 1.845.416).

Dentre os fundamentos da decisão, destaca-se a equiparação das entidades familiares da união estável e casamento. Conferir efeitos retroativos ao regime de bens na união estável seria o mesmo que alterar o regime de bens de forma retroativa. De acordo com a nossa legislação, para que os cônjuges consigam alterar seu regime de bens no casamento, dependerão de autorização judicial, mediante pedido motivado, ressalvados ainda os interesses de terceiros. Caso deferido pelo judiciário, a alteração do regime terá efeitos a partir da decisão e não desde a celebração do casamento.

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Para o Colegiado, a união estável não exige as mesmas formalidades que o casamento, já que não depende de formalização em Cartório para produção de efeitos. Os companheiros têm a liberdade de não formalizar sua união ou formalizar após um período do início da convivência, mas caso isso ocorra, vigorará o regime da comunhão parcial de bens por força de lei, até que as partes decidam alterá-lo expressamente, o que poderá ser feito a qualquer momento e surtirá efeitos a partir da assinatura do documento.

Outro ponto trazido pela decisão da irretroatividade é a proteção dos interesses de terceiros. Aqueles que contrataram com o casal no período em que não existia uma Escritura de União Estável e, portanto, vigorava o regime legal não devem ser surpreendidos. Vejamos um exemplo: o casal contrai um empréstimo antes de assinarem a Escritura e alguns meses depois definem que o regime da união estável era o da separação de bens. Se a Escritura tiver efeitos retroativos, o credor do empréstimo possivelmente encontrará mais dificuldade para satisfação de seu crédito em razão da incomunicabilidade do patrimônio do casal.

Conclui-se, portanto, que para os casais que desejam estabelecer o regime da separação total na união estável, pelo entendimento da jurisprudência atual, os efeitos só passarão a surtir a partir do momento da assinatura da Escritura de Reconhecimento e Regime de Bens, de forma que deverão assinar o documento o mais próximo possível da data estabelecida como o início da relação.

Na prática, conforme já mencionado anteriormente, nem sempre é possível identificar os requisitos do reconhecimento da união estável rapidamente, de modo que uma conversa com um advogado especializado é sempre indicada. Nas relações amorosas em que haja alguns elementos de união estável, porém se trate de um namoro, é possível, como instrumento de proteção patrimonial, assinar um contrato de namoro. O mesmo ainda divide opiniões da doutrina e da jurisprudência, porém, a depender da situação fática apresentada, e porque a liberdade dos relacionamentos amorosos deve existir, acredita-se que a vontade escrita dos sujeitos da relação tem importante peso.

*Laís Meinberg Siqueira e Helena Rippel Araujo são advogadas do escritório Choaib, Paiva e Justo Advogados Associados

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