O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) vai analisar uma representação que cita o prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), e a vereadora Paolla Miguel (PT) por um evento que aconteceu na cidade no último domingo, 14, e causou comoção pelas cenas eróticas e de nudez.
O evento, conhecido como Lambuzada, foi financiado com recursos públicos. O pedido é enviado ao MP é para que o órgão investigue o caso e, ao final, cobre do prefeito e da vereadora a devolução do dinheiro investido de “maneira indecorosa”.
“Este evento foi realizado de uma maneira absurda, sem respeito algum a crianças, aos idosos e toda à população de Campinas”, diz o deputado estadual Rafael Zimbaldi (Cidadania-SP), autor da representação.
Uma emenda da vereadora Paolla Miguel destinou verbas para apoio logístico e montagem do palco e dos banheiros químicos na Praça Durval Pattaro, onde ocorreram as apresentações. A Câmara Municipal abriu um processo disciplinar que pode levar à cassação da parlamentar.
Em nota, ela afirmou que não teve conhecimento prévio do conteúdo das apresentações e que as críticas seriam notificadas aos produtores. “Nós não participamos da contratação dos artistas, não houve pagamento de cachê, não foi discutido o conteúdo das apresentações. Isso é responsabilidade do coletivo, do produtor.”
O PT saiu em defesa da vereadora e afirmou que o processo de cassação evidencia a “unidade da extrema-direta para atuar contra os mandatos das mulheres progressistas em todo o Brasil”.
O prefeito Dário Saadi, por sua vez, justificou que o dinheiro foi destinado ao evento por meio de uma emenda impositiva da vereadora e, por isso, a Secretaria de Cultura e Turismo era obrigada a executar o projeto.
“Esse evento nos envergonhou muito. Nós estamos atuando para punir os responsáveis”, afirmou em vídeo publicado nas redes sociais. Segundo o prefeito, a produtora será proibida de fazer novos eventos na cidade.
Diante da repercussão do evento, a Secretaria de Cultura publicou uma portaria que torna obrigatória a classificação etária de todas as atividades culturais organizadas ou apoiadas pela pasta.
“Para evitar conteúdos impróprios em espaços públicos e para resguardar o direito de escolhas das pessoas ao acessá-los, a Secretaria de Cultura e Turismo adotará a obrigatoriedade do produtor declarar previamente a faixa etária a que se enquadra o espetáculo ou exposição, conforme a autoclassificação indicativa, regulamentada pelo governo federal.”
O evento foi organizado pela produtora Bicuda, que se apresenta como um movimento dedicado a “reconhecer, valorizar e expandir a cultura LGBTQIAPN+”. Em nota, a produtora informou que as apresentações foram interrompidas “no momento em que foi percebido a conduta inadequada para o local”.
COM A PALAVRA, A VEREADORA PAOLLA MIGUEL
Nosso #MandatoMovimento auxiliou o evento Bicuda no domingo (14/04), na praça Durval Pattaro, em Barão Geraldo, por meio da destinação - via emendas impositivas - de uma parte da estrutura física que atendeu a população que desejou comparecer ao evento, incluindo banheiros químicos, apoio logístico e montagem de palco.
Evento que já estava organizado pelos seus produtores, que são responsáveis pela curadoria, contratação de artistas e pagamento de cachê. Nenhum ente público, nem nosso mandato, nem a Secretaria de Cultura, tiveram conhecimento prévio do conteúdo das apresentações.
Após o evento, chegou até nós que o conteúdo de algumas músicas e a apresentação de uma das artistas teria sido alvo de críticas de parte da comunidade local. Críticas que são naturais em uma sociedade diversa e democrática, e que serão notificadas aos produtores pela Secretaria de Cultura para que tenham ciência do ocorrido e possam explicar o que aconteceu para avaliar suas futuras apresentações.
A Bicuda é um evento reconhecido pela juventude da nossa cidade, que já aconteceu por inúmeras outras vezes em espaços públicos de Campinas, como a Estação Cultura e o Largo do Rosário, abrindo espaço para artistas jovens, pretos, pessoas trans, com origens em comunidades pobres e que retratam na sua música suas vivências cotidianas.
Reafirmamos nosso compromisso com a cultura popular e com a democratização da cultura. Apoiamos iniciativas que passam pelos mais diferentes segmentos, como a cultura preta, o samba, o hip-hop, o teatro, a preservação histórica do acervo audiovisual da nossa cidade, entre muitas outras iniciativas. Respeitamos as vozes dissidentes e continuaremos dialogando com todos os setores da sociedade. Contudo, não vamos nos calar sobre a tentativa de criminalizar a cultura periférica e a comunidade LGBT, eventos públicos que reúnem a juventude, a juventude preta e periférica da nossa cidade. Eventos absolutamente pacíficos, sem ocorrências, que prezam pela ocupação dos espaços públicos com responsabilidade e segurança.
COM A PALAVRA, A PRODUTORA BICUDA
A Bicuda é um movimento que atua na cidade desde 2018 com intuito de reconhecer, valorizar e expandir a cultura LGBTQIAPN+ através de festas, shows, performances, artes visuais, atividades de formação em economia criativa e eventos gratuitos, em espaços privados e públicos, abertos à toda comunidade da cidade.
Ao longo desses anos já realizamos mais de quinze eventos junto à Secretaria de Cultura da cidade.
Em nenhum destes eventos tivemos qualquer tipo de ocorrência, denúncia ou problema de censura ao conteúdo artístico das apresentações.
O evento do dia 14.04.2024 ocorreu como previsto: foi devidamente protocolado e apoiado por servidores públicos que, ao longo destes anos, vem reafirmando seu compromisso com a diversidade e a cultura LGBTQIAPN+ da cidade.
A BICUDA, produtora responsável pelo evento, nunca recebeu nenhum pedido de esclarecimento prévio quanto ao conteúdo artístico das apresentações das atrações da comunidade LGBTQIAPN+.
Quando a BICUDA contrata um artista LGBTQIAPN+, ela está reconhecendo a trajetória desse artista ou grupo ao mesmo tempo que se reporta a história de luta da comunidade LGBTQIAPN+ no estado democrático.
Esclarecemos que, em respeito a liberdade artistica dos convidados, a Bicuda não solicita o conteúdo previo do que será apresentado, pois são performances que expressam importantes pautas da comunidade LGBTQIAPN+ a partir da vivência dessa realidade, mas entendemos que, por se tratar de uma apresentação em espaço com acesso aberto ao público deveríamos ter nos atentado para a possibilidade de conteúdos inadequados para a faixa etária de crianças e adolescentes.
Reforçamos que no momento em que foi percebido a conduta inadequada para o local, foi solicitada aos artistas que interrompessem o ato, que não passou de dois minutos em um evento com oito horas de duração.
Mediante a todos os ocorridos, estamos junto à Secretaria de Cultura estabelecendo a classificação de faixa etária para que ela seja devidamente inserida nas contratações, visando evitar constrangimentos dessa natureza nos nossos eventos.
Reiteramos ainda que a Vereadora Paolla Miguel (PT) não teve envolvimento direto na contratação dos artistas presentes e não tinha conhecimento do conteúdo das apresentações. Sabemos que a intenção da vereadora é estimular e fortalecer a viabilidade de eventos gratuitos nas ruas de Campinas, disponibilizando estrutura básica de palco, banheiros e iluminação, aparelho muito importante para viabilizar a realização das atividades a que nos propusemos.
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