Além dos relatórios sobre redutos eleitorais de Lula e das planilhas de operação da Polícia Rodoviária Federal no 2º Turno, os investigadores da Operação Constituição Cidadã abasteceram o pedido de prisão do ex-diretor-geral Silvinei Vasques com mensagens que trataram, onze dias antes do segundo turno, de ações concentradas no Nordeste e ‘policiamento direcionado’ na região.
Os diálogos foram extraídos do celular do policial rodoviário federal Adiel Pereira Alcântara, ex-coordenador de análise de inteligência da PRF. Ele prestou depoimento à PF em dezembro de 2022. Os investigadores, no entanto, viram contradições na versão dada pelo agente. Assim, apreenderam seu celular para confrontar a narrativa.
Como mostrou o Estadão, o mesmo ocorreu com Naralúcia Leite Dias, ex-chefe do serviço de análise de inteligência da PRF. Segundo a PF, tanto ela como Adiel ‘faltaram e/ou omitiram a verdade’. As condutas foram citadas como ‘reverência’ dos agentes a Silvinei, o que serviu de argumento para o pedido de prisão do ex-chefe da PRF.
A conversa que mais chamou atenção da PF ocorreu em 29 de outubro, às vésperas do segundo turno, entre Adiel e um outro policial rodoviário federal, Paulo César Botti Alves Júnior, subordinado ao primeiro. Segundo a PF, Adiel critica a conduta de Silvinei, diz que ele teria falado ‘muita merda’ nas reuniões de gestão, ‘notadamente, ao que parece, determinando “policiamento direcionado”'.
Para os investigadores, o diálogo corrobora provas ‘que indicam as ações policiais visando dificultar ou mesmo impedir eleitores de votar’.
Em outra conversas encontrada pela PF no celular de Adiel, o interlocutor era o então diretor de inteligência da PRF, Luís Carlos Reischak Júnior. O diálogo se deu em 19 de outubro, mesmo dia em que, segundo Silvinei, foi realizada uma reunião do Conselho Superior da Polícia Rodoviária Federal sob o pretexto de votar uma resolução acerca da prática de educação física. Na reunião, estavam diretores, superintendentes e todos os coordenadores gerais e foi proibido o uso de celulares.
Segundo os investigadores, a conversa entre Adiel e Reischak indica ‘orientação de uma ação ostensiva a ser realizada no dia 30 de outubro (segundo turno), chamando a atenção um trecho no qual mencionam abordagens de “ônibus que levam passageiros de São Paulo para o Nordeste”'.
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Na ocasião, Reischak afirmou, em áudio: “O que ficou definido pelo diretor é: é a operação vai ser domingo só, uma operação de segurança viária, tá? E não vai ter grandes mobilizações no pré, né? Talvez uma coisa e outra assim, mas o foco vai ser o dia D, tá? Então a gente tem que assim... segurança viária, esses transportes clandestinos de passageiros e eu acho que ela é uma operação muito ostensiva, né?”
“Verificar aquele caminhão transportando pessoas e fazer abordagens, aplicar o CTB. Ah se a gente puder fazer alguma coisa de alerta brasil, acho que dá pra fazer, tentar fazer algum cruzamento, alguma identificação, né? Aqueles transportes de passageiros que sai de São Paulo e vão para o Nordeste por exemplo, se a gente conseguir identificar”, seguiu.
Cerca de 30 minutos depois do envio do áudio, Reischak relatou a Adiel que acompanharia Silvinei em uma reunião com o então ministro Anderson Torres. Na mesma data, a delegada Marília Alencar - com quem a PF encontrou fotos e planilhas que fizeram avançar a investigação da Constituição Cidadã - estevem em reunião com Torres até as 20h37, diz a PF.
A suspeita é a de que, naquele dia, após a reunião do Conselho Superior da PRF, teriam se reunido no gabinete do ministro da Justiça, Torres, Marília, Silvinei e Reischak Júnior. “Muito embora ainda não se possa afirmar categoricamente o que foi tratado na reunião, chama a atenção o fato da coincidência de se tratar da mesma data da reunião do Conselho Superior da PRF”, ressaltou a PF ao pedir a prisão de Silvinei.
Em junho, ex-diretor da PRF prestou depoimento à CPMI do 8 de Janeiro sobre as operações da eleição e negou ter usado o cargo para beneficiar Bolsonaro. Ele afirmou que a ação da corporação foi mais intensa no Nordeste porque a estrutura da Polícia Rodoviária Federal é maior na região. Também disse ser vítima de uma “perseguição” e alvo da “maior injustiça da história”.
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