O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira, 14, para condenar o primeiro bolsonarista envolvido nos atos golpistas do dia 8 de janeiro por todos os cinco crimes apontados na denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A pena definida foi de 17 anos – 15 anos e seis meses de prisão em regime inicial fechado e, na sequência, mais 1 ano e seis meses de detenção em regime aberto. Ele também terá que pagar uma multa de aproximadamente R$ 44 mil.
No banco dos réus está o cientista da computação Aécio Lúcio Costa Pereira, ex-funcionário da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), que foi preso em flagrante no Senado Federal.
A avaliação dos ministros é que as provas produzidas pelo próprio Aécio, que gravou vídeos nas dependências do Congresso, são suficientes para fundamentar a sentença.
“Nós poderíamos estar em algum lugar contando a história da nossa derrocada, mas nós estamos aqui, graças a todo um sistema institucional, contando como a democracia sobreviveu”, afirmou Gilmar Mendes.
Entenda o cálculo da pena
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: 5 anos e seis meses;
- Golpe de Estado: 6 anos e seis meses;
- Dano qualificado pela violência e grave ameaça: 1 ano e seis meses;
- Deterioração de patrimônio tombado: 1 ano e seis meses;
- Associação criminosa armada: 2 anos.
Votos
Todos os ministros votaram pela condenação, mas divergiram sobre os crimes e penas. Alexandre de Moraes (relator) e Kassio Nunes Marques (revisor) foram os primeiros a votar, ainda na sessão de ontem, e estabeleceram dois extremos na dosimetria. Moraes sugeriu 17 anos em regime inicial fechado, a proposta mais dura, e Nunes Marques sugeriu 2 anos e meio em regime aberto, a sugestão mais branda.
Prevaleceu a proposta de Moraes, chancelada com os votos de Edson Fachin, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber.
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As penas propostas são discrepantes porque Nunes Marques defendeu uma condenação parcial, apenas pelos crimes de deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado pela violência, considerados mais leves, e sugeriu a absolvição pelos crimes de associação criminosa, golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O ministro que o ex-presidente Jair Bolsonaro colocou no STF defendeu que as violências e a invasão da praça dos Três Poderes não representaram ‘risco à democracia’.
Cristiano Zanin seguiu Moraes, e também votou pela condenação por todos os crimes, mas divergiu parcialmente sobre a dosimetria. Ele sugeriu uma pena total de 15 anos – 13 anos e seis meses de reclusão em regime inicial fechado e, na sequência, 1 ano e seis meses de detenção.
“O réu não ingressou no Senado para um passeio ou uma visita. Ele ingressou juntamente com uma multidão em tumulto, que defendia, mediante violência física e patrimonial, o fechamento dos Poderes constitucionalmente estabelecidos, além da deposição do governo democraticamente eleito”, afirmou.
O ministro André Mendonça defendeu a absolvição pelo crime de golpe de Estado. Ele argumentou que os manifestantes não agiram para tentar depor o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sim para ‘criar uma situação de instabilidade institucional’.
“A deposição do governo dependeria de atos que não estavam ao alcance dessas pessoas”, afirmou. “Qualquer ação de golpe de estado dependeria de uma ação de outras forças, basicamente, os militares.”
Luís Roberto Barroso também foi contra a dupla condenação, por tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, o que na avaliação dele seria punir duas vezes mesmo pelo crime. Barroso, no entanto, foi firme ao alertar sobre os riscos das manifestações golpistas.
“A democracia brasileira correu risco real e o 8 de janeiro foi a parte mais visível de uma história que transitou sobre os subterrâneos e que ainda vamos conhecer integralmente”, defendeu.
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As penas propostas:
- Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber: 17 anos por todos os cinco crimes;
- Kassio Nunes Marques: 2 anos e seis meses apenas pelos crimes de deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado pela violência;
- Cristiano Zanin: 15 anos por todos os crimes;
- André Mendonça: 8 anos por todos os crimes exceto golpe de Estado;
- Luís Roberto Barroso: 11 anos e meio por todos os crimes exceto abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Aécio Pereira está preso preventivamente desde 8 de janeiro e recebeu autorização para acompanhar o julgamento no presídio. Ele chegou a gravar um vídeo na Mesa Diretora do Senado antes de ser detido. O bolsonarista veste uma camisa com os dizeres ‘intervenção militar federal’ e afirma: “Amigos da Sabesp, quem não acreditou estamos aqui. Quem não acreditou, estou aqui por vocês também, porra. Olha onde eu estou, na mesa do presidente.”
Em outra gravação, aparece na tribuna do Senado e defende uma intervenção das Forças Armadas contra o ‘comunismo’. “Saiam nas ruas, saiam nos quartéis, saiam agora, fiquem nas ruas e peçam ‘SOS Forças Armadas’”, afirma.
O roteiro dos julgamentos do 8 de janeiro:
- O ministro Alexandre de Moraes (relator) apresenta o relatório;
- O ministro Kassio Nunes Marques (revisor) pode complementar o relatório;
- A Procuradoria-Geral da República e as defesas terão até uma hora, cada, para apresentar seus argumentos;
- A votação começa com o relator, na sequência vota o revisor e depois a ordem segue o padrão – do ministro mais novo, Cristiano Zanin, até o mais antigo, Gilmar Mendes, e por último a presidente do tribunal.
O STF prevê julgar na sequência o engenheiro florestal Thiago de Assis Mathar e os entregadores Moacir José dos Santos e Matheus Lima de Carvalho Lazaro, acusados de participação direta na invasão aos prédios públicos na Praça dos Três Poderes.
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