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Opinião|Tese do século, antecipação na tributação sobre créditos e insegurança sem fim

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convidado
Por Tomás Colacino Daudt de Oliveira e Daniel Massena*

Originalmente, a Receita Federal defendia que o reconhecimento da receita, para fins de incidência de IRPJ e CSLL, deveria ocorrer no período de apuração em que se der o trânsito em julgado do processo judicial (Solução de Consulta DISIT/SRRF06 nº 106/2010 e Solução de Consulta nº 233/2007), por entender que com a decisão judicial há disponibilidade jurídica. Esse entendimento tinha por base o exposto no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 25/2003.

Tomás Colacino Daudt de Oliveira e Daniel Massena Foto: Divulgação

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Ocorre que o ADI SRF nº 25/2003 não se manifestou sobre as situações em que os contribuintes pleiteavam a restituição administrativamente de crédito reconhecido por a sentença que não definia o valor a ser restituído. Nos casos em que o valor do crédito não estava definido na sentença, o referido ato declaratório interpretativo apenas dizia que o crédito deveria ser reconhecido na data de expedição do precatório ou no trânsito em julgado dos embargos à execução. Ou seja, apenas considerou as hipóteses em que a restituição se daria mediante a esfera judicial, não se manifestando sobre o momento do reconhecimento da receita relativamente à restituição pleiteada administrativamente, por meio de Pedido de Restituição – PER ou Declaração de Compensação – DCOMP.

Como é sabido, para que os contribuintes obtenham, na esfera administrativa, a restituição ou compensação dos créditos reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, é necessário formalizar Pedido de Habilitação de Crédito Reconhecido em Decisão Judicial Transitada em Julgado a ser analisado pela Receita Federal. Após o deferimento desse pedido, ainda é exigida a transmissão de PER/DCOMP, submetido à apreciação da autoridade fiscal para o reconhecimento, ou não, do crédito pleiteado. Caso a restituição ou compensação seja deferida, somente nesse momento os contribuintes terão certeza do aproveitamento do crédito e poderão reconhecer a receita sem risco de tal valor ser questionado pelas autoridades fiscais.

Diante desse cenário, muitos contribuintes passaram a questionar em juízo o entendimento da Receita Federal, existindo diferentes precedentes dos tribunais sobre o momento do reconhecimento da receita. As principais correntes definem os seguintes momentos para o reconhecimento da receita pelo regime de competência:

a) período do trânsito em julgado da decisão judicial que reconheceu o crédito pleiteado;

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b) período em que a Receita Federal aceitar a habilitação do crédito reconhecido por decisão judicial;

c) período em que ocorrer a efetiva transmissão do pedido de compensação (DCOMP);

d) período em que ocorrer a ciência do Despacho Decisório analisando o crédito pleiteado em PER/DCOMP.

Após o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a chamada tese do século referente à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS, a Receita Federal, através da Solução de Consulta nº 183/2021, fixou a interpretação que o reconhecimento da receita se materializaria com a entrega da primeira DCOMP, pois nesse momento o contribuinte já teria realizado a liquidação do crédito e declarado o valor integral a ser compensado.

Ocorre que, recentemente, foi publicada nova orientação da Receita Federal materializada através da Solução de Consulta nº 308, de 15/12/2023, complementando o entendimento firmado na Solução de Consulta nº 183/2021, passando a dispor que a entrega da primeira DCOMP é o último momento em que o crédito deve ser tributado, porém, se o contribuinte tiver escriturado previamente o crédito em sua contabilidade, é no momento da escrituração que deve ocorrer o reconhecimento da receita relativa o crédito reconhecido judicialmente.

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Assim, no caso de o contribuinte realizar a escrituração contábil dos valores de indébito tributário, anteriormente à entrega da primeira DCOMP, é no momento da escrituração contábil que tais valores devem ser oferecidos à tributação, sem prejuízo de ulteriores ajustes em função de modificação dos respectivos valores.

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Portanto, com base no novo posicionamento da Receita Federal, o crédito reconhecido judicialmente deve ser reconhecido como receita na data de transmissão da 1ª DCOMP ou no momento da escrituração contábil do crédito, o que ocorrer primeiro, cuja consequência prática é a antecipação do recolhimento dos tributos aos cofres públicos.

Definitivamente, a interpretação trazida na SC Cosit nº 308/2023 traz maior preocupação aos contribuintes em relação ao risco de autuação fiscal sobre os valores que seriam levados pelas empresas à tributação, conforme orientação da SC Cosit nº 183/2021, apenas no momento da transmissão da primeira DCOMP e que já constavam registrados na contabilidade.

Soma-se a isso a recente limitação promovida pelo Governo Federal através da Medida Provisória nº 1.202, de 29 de dezembro de 2023, que incluiu o artigo 74-A na Lei nº 9.430/96 para restringir o limite mensal para compensações que utilizem crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado. Em seguida, o Ministério da Fazenda publicou Portaria Normativa MF Nº 14, de 5 de janeiro de 2024 exigindo que utilizando créditos superiores a R$ 10 milhões sejam compensados em no mínimo doze e no máximo em sessenta meses, conforme seu valor.

Nesse contexto, verifica-se que as medidas promovidas pelo Governo Federal visam diferir ao longo do tempo a utilização do crédito reconhecido em juízo, ao passo que a interpretação da Secretaria da Receita Federal, apresentada na Solução de Consulta Cosit nº 308/2023, exige que para fins de incidência do IRPJ e CSLL o contribuinte ofereça à tributação a integralidade do crédito reconhecido judicialmente na data de sua escrituração contábil.

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Tais medidas, evidentemente, demonstram o esforço do Ministro da Fazenda em zerar o déficit fiscal em 2024, conforme veiculado na mídia. Contudo, sem entrar no mérito da legalidade ou constitucionalidade da limitação mensal para a compensação, essa restrição pode ser o estímulo que faltava aos contribuintes para o ajuizamento de ações visando questionar a interpretação da Solução de Consulta Cosit nº 308/2023, tendo em vista já haver precedentes nos tribunais contrários a tal entendimento.

*Tomás Colacino Daudt de Oliveira e Daniel Massena, advogados do Daudt, Castro e Gallotti Olinto Advogados

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