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Toffoli critica ‘imunidade legal’ a plataformas e defende reforma do Marco Civil da Internet

Ministro do Supremo Tribunal Federal começou a ler seu voto nesta quinta, 26, no julgamento que pode ampliar obrigação das redes sobre conteúdos publicados por usuários

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Foto do author Rayssa Motta

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu nesta quinta-feira, 26, o endurecimento de regras previstas no Marco Civil da Internet para ampliar a responsabilidade das plataformas por conteúdos publicados pelos usuários.

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O assunto está em debate no último grande julgamento do ano no STF. Toffoli é relator de um dos processos pautados sobre o tema. Ele ainda não concluiu a leitura do voto, que será retomado na próxima semana, mas sinalizou que vai sugerir mudanças nas normas em vigor.

O Marco Civil da Internet foi aprovado pelo Congresso em 2014. Para o ministro, a legislação precisa ser atualizada. Há projetos de lei em tramitação na Câmara e no Senado que propõem reformas no texto.

Segundo Toffoli, o Marco Civil da Internet foi uma “grande conquista democrática na sociedade brasileira”, mas precisa ser atualizado para dar conta das “transformações sociais, culturais, econômicas e políticas provocadas pelas tecnologias e pelos novos modelos de negócios” criados a partir delas.

“Não se pode mais ignorar a necessidade de sua atualização, especialmente no que concerne ao regime de responsabilidade dos provedores de aplicação”, defendeu.

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“Tal necessidade fica mais evidente quando se tem em conta os riscos sistêmicos ao próprio direito à liberdade de expressão, aos direitos fundamentais da igualdade e da dignidade da pessoa humana, ao princípio democrático, ao estado de direito, à segurança e à ordem pública.”

Atualmente, as plataformas só podem ser punidas por publicações se descumprirem ordens judiciais para tirá-las do ar. Toffoli afirmou que esse sistema criou uma “imunidade legal” indevida às empresas de tecnologia.

Toffoli defende atualização do Marco Civil da Internet: 'Não se pode mais ignorar'. Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Ontem, advogados do Facebook e do Google apresentaram seus argumentos a favor das regras como estão. As empresas consideram uma “armadilha” receber a responsabilidade pelo que publicam os usuários. Essas plataformas projetam que a mudança criaria incentivos à remoção automática de publicações controversas e, em última instância, à censura prévia nas redes sociais. Uma das preocupações é diferenciar, na prática, o que é reprovável do que é criminoso, o que vai além dos termos de uso contratuais.

Quando o Marco Civil da Internet foi aprovado, há dez anos, essa foi a visão dominante no Congresso. Havia um receio em torno dos efeitos que a responsabilização das plataformas, antes de decisão judicial, poderia causar. O Poder Judiciário foi alçado a árbitro das redes justamente para evitar que provedores fizessem juízo de valor sobre publicações. Parlamentares viam com desconfiança o empoderamento das empresas de tecnologia e projetavam um risco de censura colateral.

Para Toffoli, essa “era a visão da época”, que precisa ser ultrapassada. “Muitas vezes o conteúdo pode ser terceiro, mas o ato é da plataforma. O impulsionamento é um ato da plataforma, direto, não é um terceiro que faz.”

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Os atos golpistas do 8 de Janeiro e o atentado a bomba próximo ao STF foram usados pelos ministros Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia para fazer críticas às redes sociais por permitirem a circulação de publicações antidemocráticas. Eles ainda não votaram.

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No dia da invasão à Praça dos Três Poderes, bolsonaristas radicais gravaram vídeos e fizeram transmissões ao vivo sem intercorrências. Boa parte das articulações também ocorreu na internet. Moraes defendeu que o episódio “demonstrou a total falência do sistema de autorregulação” das redes sociais.

O ministro também criticou as empresas de tecnologia por não removerem prontamente os conteúdos publicados pelos golpistas e afirmou que elas agiram assim por interesses econômicos. Moraes ainda defendeu que as redes sociais podem replicar, de forma ampla, o sistema que já vem sendo usado para combater a pornografia infantil, a pedofilia e a violação de direitos autorais.

“Não se diga que tecnologicamente não é possível porque em relação à pornografia infantil, pedofilia e direitos autorais a inteligência artificial e os algoritmos retiram, antes de um like, 93% das postagens. Os 7% seguintes são encaminhados à comissão de seres humanos. Então é possível tecnologicamente. O que não houve, e não vem havendo, é empenho”, disse o ministro.

O atentado a bomba que terminou com a morte do chaveiro Francisco Wanderley Luiz, o Tiü França, foi lembrado pela ministra Cármen Lúcia. Ela destacou que havia postagens antecipando o ataque e que elas não foram identificadas pelas redes.

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A tendência é que o STF faça mudanças nas regras atuais do Marco Civil da Internet, ampliando as obrigações das big techs. Para alguns ministros, a obrigação de remover perfis falsos sem necessidade de ordem judicial é menos controversa, embora demande um papel mais ativo das redes sociais em verificar a autenticidade das contas. O tema da remoção de conteúdos específicos a partir de deliberação extrajudicial, no entanto, é considerado mais espinhoso.

O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, espera concluir o julgamento ainda neste ano, antes do recesso, mas há chance de a votação ficar pendente para 2025.

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