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Opinião | Tragédia em Osasco: a hierarquia policial que mata

Policiais emocionalmente abalados têm maior propensão a adotar comportamentos agressivos, comprometendo a relação com a população. Esse ciclo vicioso alimenta o distanciamento e a desconfiança da sociedade em relação às forças de segurança

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convidado
Por Raquel Gallinati

A segurança pública no Brasil enfrenta uma crise que ultrapassa a questão da violência nas ruas. O assassinato do secretário adjunto de Segurança de Osasco por um subordinado é mais que inaceitável sob qualquer perspectiva, é um episódio trágico que escancara as fissuras de um sistema hierárquico em colapso.

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Reflexo de uma estrutura que, muitas vezes, confunde autoridade com autoritarismo, fomentando ambientes de trabalho insustentáveis dentro das corporações policiais.

A hierarquia, essencial para o funcionamento das instituições policiais, perde sua legitimidade quando desvirtuada. Em vez de promover respeito e cooperação, pode se tornar palco de práticas abusivas, como assédio moral, humilhações públicas e transferências punitivas. Esses comportamentos, além de comprometerem a saúde mental dos profissionais, minam a eficiência e a coesão das corporações.

Casos de abuso de poder são cada vez mais comuns. Relatos de subordinados submetidos a críticas desproporcionais e ambientes de pressão extrema revelam uma dinâmica que, em vez de construir confiança, alimenta um ciclo contínuo de insatisfação e desgaste. Em situações extremas, tragédias como a de Osasco tornam-se o desfecho de anos de negligência estrutural.

Essa crise interna não surge isoladamente. Ela é alimentada por uma combinação de fatores estruturais e culturais. A falta crônica de efetivo, jornadas extenuantes e escalas imprevisíveis submetem os profissionais a níveis elevados de estresse. Esse cenário é agravado por uma cultura institucional que glorifica o conceito do ethos do guerreiro, valorizando uma invulnerabilidade que desestimula a busca por ajuda psicológica.

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Esse estigma em torno da saúde mental cria um ambiente onde o sofrimento se torna invisível, mas corrosivo. Como resultado, cresce o número de policiais emocionalmente esgotados e, tragicamente, as taxas de suicídio entre os profissionais da segurança pública.

O impacto dessa deterioração ultrapassa os muros das corporações. Policiais emocionalmente abalados têm maior propensão a adotar comportamentos agressivos, comprometendo a relação com a população. Esse ciclo vicioso alimenta o distanciamento e a desconfiança da sociedade em relação às forças de segurança. Afinal, uma polícia emocionalmente fragilizada e desacreditada não protege; ela perpetua a insegurança que deveria combater.

Os sinais de alerta são claros e não podem ser ignorados. Para evitar novas tragédias, é essencial repensar a estrutura e a cultura das instituições policiais. Reformas que priorizem a dignidade e o bem-estar dos policiais precisam ser implementadas com urgência.

Entre as medidas indispensáveis estão políticas claras de combate ao assédio moral, suporte psicológico acessível e livre de estigmas, além de uma formação ética e técnica voltada à liderança. A hierarquia deve ser exercida com respeito, competência e justiça, afastando qualquer traço de autoritarismo.

O assassinato em Osasco não pode ser apenas mais uma manchete. Ele é um grito de alerta para a necessidade de transformar profundamente as corporações policiais, resgatando a humanidade e a integridade de seus profissionais.

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Enquanto as instituições ignorarem suas próprias falhas internas, a segurança pública no Brasil continuará fragilizada. A valorização daqueles que estão na linha de frente é o primeiro passo para restaurar a confiança da sociedade e garantir que tragédias como essa nunca mais se repitam.

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Raquel Gallinati
Secretária de Segurança Pública de Santos. Delegada de polícia. Diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil. Foto: Arquivo pessoal
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