No último dia 6 de dezembro, a Controladoria-Geral da União (CGU) lançou o Plano de Integridade e Combate à Corrupção 2025-2027, noticiado pelo próprio Governo Federal como um “Plano inédito de Integridade e Combate à Corrupção com ampla participação social.”: mero joguete de palavras...
O documento dito inédito foi dividido em 5 eixos temáticos, os quais deveriam estar em qualquer programa de integridade minimamente estruturado e que não revelam nenhum ineditismo: “Controle da Qualidade do Uso dos Recursos Públicos; Integridade nas Relações Estado-Setor Privado; Transparência e Governo Aberto; Combate à Corrupção; e Fortalecimento Institucional para a Integridade.” São todos pilares programáticos de governança pública já executados pela própria CGU, até mesmo antes da atual gestão federal iniciada em 1º de janeiro de 2023, justamente por serem ações de Estado e não de governo, como se pode extrair das normas internacionais e nacionais anticorrupção, especialmente da Convenção da ONU de Combate à Corrupção.
A notícia de adoção de “repressão e prevenção como pilares” é pura retórica, visto que, por exemplo, as chamadas Operações Especiais, que contemplam a atuação em rede com outras instituições, já é prática usual da CGU desde sua criação, em 2003. Outro tema etiquetado como inovador foi o controle social, também já executado há tempos pelo mesmo órgão. Tudo como antes...
O espetaculoso anúncio, feito após 2 anos de pura letargia institucional contra a corrupção nacional, soa claramente como uma cortina de fumaça sobre os incontáveis eventos de corrupção no cenário nacional - de escândalo da licitação do arroz, a manutenção de um Ministro de Estado indiciado pela Polícia Federal por corrupção e absolvição administrativa de outro, acusado de abusos sexuais, passando pela perpetuação do Orçamento Secreto e alteração da Lei das Estatais para burlar as exigências técnicas e o conflito de interesses - justamente em meio à crise de popularidade do atual Presidente da República e do balanço bienal de gastança inócua (rombo fiscal, aumento dos juros e da inflação), que tende a afundar ainda mais o país no abismo do subdesenvolvimento humano.
Corroborando a sensação coletiva, recente pesquisa de opinião – um dos três principais indicadores sobre corrupção – feita pela Quaest para a Transparência Internacional Brasil, com executivos e profissionais de compliance das maiores empresas brasileiras, mostrou que, para 85% dos entrevistados, o Governo Federal não demonstra compromisso nem adota ações efetivas para o combate à corrupção. Além disso, revelou o óbvio: para 50% dos respondentes, o que mais atrapalha o combate à corrupção no país é a politização do combate à corrupção, para 42%, são as decisões questionáveis do Poder Judiciário, e para 8%, a falta de empenho e capacidade dos órgãos responsáveis pelas investigações. 94% dos ouvidos disseram que as anulações de casos de corrupção pelo Poder Judiciário afetam muito a percepção de impunidade e prejudicam a integridade no ambiente de negócios no Brasil.
Neste cenário, o marketing do Governo Federal de realçar o “ineditismo” do tal Plano, que teria contado com mais de 50 especialistas e 100 entidades do setor privado é uma mera cortina de fumaça para encobrir a incapacidade sistêmica das instituições nacionais de obter resultados efetivos pelas ações de prevenção repressão à corrupção. E nem se diga que tal iniciativa é louvável, porquanto as ações previstas no documento são imanentes à essência da própria CGU e constam como determinações normativas dos diversos textos globais anticorrupção, cuja avaliação de cumprimento no Brasil é reiteradamente reprovada pela Transparência Internacional.
Longe de qualquer argumento de politização da Justiça, preso a determinadas figuras referenciais dos espectros políticos antagônicos do cenário nacional, a anulação judicial de acordos bilionários firmados por grandes empresas, confessadamente autoras de atos de corrupção, dá a perfeita dimensão da ineficácia e da insegurança jurídica da “agenda anticorrupção” nacional, aumentando cada vez mais o diâmetro do círculo vicioso da corrupção brasileira e desesperançando a nação.
No país da corrupção sistêmica, endêmica e institucionalizada, há apenas incríveis 799 pessoas efetivamente presas, o que representa o insignificante percentual de 0,12% do total de presos no país (SENAPEN, 2024), dado que escancara a necessidade da promoção de ações que vão além da obviedade escrita em um documento, lançado oportunistamente em meio a crises de gestão e na semana do Dia Internacional de Combate à Corrupção, capazes de prevenir os eventos ilícitos e de reprimir com o rigor necessário que a sociedade almeja, por meio de, dentre outras medidas: reformulação da Lei de Improbidade Administrativa, destruída pelo Congresso Nacional; criminalização do enriquecimento ilícito de agentes políticos; retomada da competência especializada para os casos de corrupção, em vez da Justiça Eleitoral; efetiva extinção do Orçamento Secreto, com a devida regulamentação das emendas parlamentares (PLP 175/24), que lhes dê mais transparência e controle; manutenção da redação original da Lei das Estatais; possibilidade de execução imediata da pena de prisão após condenação em segundo grau de jurisdição; fim do foro privilegiado; abolição do ativismo judicial e das decisões monocráticas das Cortes Superiores; e liberdade de imprensa, tanto para noticiar escândalos de corrupção ocorridos no governo da situação, quanto para veicular a constitucional liberdade de expressão.
Já passou da hora de sairmos do plano dos “planos”, relegar a demagogia, fecharmos esse “museu de velhas novidades” e passarmos à execução de medidas concretamente eficientes contra a corrupção no país, a começar pelas próprias instituições públicas, independentemente do matiz político-ideológico.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica
Convidado deste artigo
As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.