Hoje, ao marcar os 49 anos do assassinato de Vladimir Herzog, resistimos à comum tentação de concentrar nossas reflexões apenas no episódio trágico de sua morte. Embora a memória de sua luta contra a ditadura militar seja também força motriz para o progresso, é a celebração de sua vida, valores e legado que precisa estar no centro de nossa atenção.
Mais do que um mártir, Vlado foi um homem sensível, um companheiro e pai carinhoso e dedicado, um professor, um jornalista, um cineasta, um intelectual, uma pessoa que, em cada mínimo gesto de sua vida pessoal ou pública, se revelou comprometida com a transformação social e com a construção de um Brasil mais justo e democrático. Até as últimas consequências.
A partir de sua trajetória mais conhecida, a de jornalista, demonstrou sua crença no poder transformador da palavra, das artes, da verdade e da comunicação. Para ele, o jornalismo não era apenas sua profissão, mas uma missão — não um espaço neutro ou subserviente aos interesses dos mais poderosos, mas um meio para se comprometer com a verdade, denunciar injustiças e amplificar a voz dos silenciados.
E é exatamente esse espírito que continua vivo em cada um de nós. É o norte que, desde 2009, orienta as ações do Instituto Vladimir Herzog (IVH), que neste ano completa 15 anos de história e de impacto na realidade política e social brasileira.
Nós do IVH acreditamos que além de honrar a vida de Vlado, devemos ter como missão e verdadeiro tributo dar, concretamente, continuidade à sua luta - sobretudo à que lhe custou a vida, a defesa da democracia - em busca de um país que respeite a dignidade humana em toda a sua diversidade.
Por isso, defendemos que nossas ações não devem se limitar a preservar o passado. Mais que isso, é preciso agir no presente para moldar um futuro mais digno e próspero para toda a sociedade.
Através de nossos programas de Educação em Direitos Humanos, Jornalismo e Liberdade de Expressão e Memória, Verdade e Justiça, trabalhamos para transformar a realidade em um contexto de crise política e econômica, de ódio e intolerância, aspectos que ganham terreno, mas que, confrontados com o exemplo de Vlado, nos lembram que não podemos ceder à desesperança.
Se as crises que enfrentamos atualmente não são muito diferentes das que Vladimir Herzog vivenciou, nossa resposta precisa estar a altura da que ele ofereceu. Com o mesmo nível de coragem e de compromisso inabalável com seus valores e princípios.
Nós, do IVH, carregamos esse dever como uma chama que não se apaga, porque o que Vlado nos deixou não ficou no passado, é uma construção contínua e estamos todos convocados a dar-lhe forma e concretude.
Neste 25 de outubro, além de expressarmos nossa justa indignação para demarcar uma posição firme e resistente contra um passado que insiste em atravessar tempos, escolhemos celebrar a vida de Vlado, cuja trajetória nos inspira a agir e seguir acreditando na capacidade do ser humano de construir um mundo mais justo, livre e democrático.
Se hoje olhamos para a história de Vladimir Herzog, é porque acreditamos que seu legado é um guia para o que ainda podemos realizar, e celebrar sua vida é reafirmar que ainda há muito por fazer, e que o sonho de uma sociedade mais democrática e humana segue vivo, tal como o nome: Vlado.
Convidado deste artigo
As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.