Influenciadores que tiveram suas redes sociais suspensas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes por divulgação de discursos considerados antidemocráticos têm se refugiado no Rumble, uma plataforma de vídeos autointitulada “imune à cultura do cancelamento”. Nesta rede, eles mantêm a produção de conteúdos, que são disparados em aplicativos de mensagens, e intensificam o diálogo com apoiadores.
Os perfis, na maioria, são de apoiadores de Jair Bolsonaro – como os jornalistas Paulo Figueiredo e Rodrigo Constantino, o blogueiro Allan dos Santos, foragido da Justiça brasileira, e o podcaster Bruno Aiub, conhecido como Monark. Relatório do terceiro trimestre de 2022 da empresa aponta que 71 milhões de pessoas no mundo acessam o site – 57 milhões nos EUA e no Canadá.
O Rumble já foi mencionado em decisão do Supremo, de 11 de janeiro, que pedia o bloqueio da conta de Monark – ordem desobedecida pela plataforma. O podcaster fez parte da primeira iniciativa de expansão da rede no Brasil, quando a empresa firmou, em março do ano passado, contrato de exclusividade com ele e com o influenciador de esquerda Reginaldo Ferreira da Silva, o Ferréz, para publicar vídeos no site.
Monark é um dos mais ativos na rede, na qual critica o Judiciário e reclama de “censura”. Diz com frequência que o Brasil está sob “ditadura”. “A China é mais democrática do que o Brasil. Lá, pelo menos, um cara não decide tudo”, afirmou ele durante live no dia 23, em uma referência a Moraes.
Durante os atos do dia 8 de janeiro, Monark afirmou ter “simpatia” pelos radicais. “Esse nosso Estado é uma ditadura nefasta e autoritária.” Horas depois, ele condenou as ações, mas isso não impediu que tivesse as contas suspensas. A reportagem procurou Monark, mas não obteve resposta.
A negociação de Monark com o Rumble foi intermediada pelo jornalista americano radicado no Brasil Glenn Greenwald, que também tem um canal na plataforma. Glenn, que passou a criticar as decisões de Moraes, virou alvo da esquerda. O jornalista entrevistou Monark em seu canal e afirmou que o Brasíl passa por um “regime de censura.”
No dia 6, Allan dos Santos publicou um episódio do seu podcast Guerra da Informação que não teve sua participação, mas de dois outros apresentadores. Um deles fala que é uma “questão de tempo” para uma convulsão social no Brasil. “Não vai demorar muito para todos nós vermos o resultado de toda essa pressão sobre o povo brasileiro, sobre a sociedade e também, pasmem, sobre os militares”, diz o locutor.
O mesmo conteúdo também está no ar no Spotify, a maior plataforma de reprodução de músicas e podcasts do mundo. A empresa não respondeu à reportagem.
Divergência
Para especialistas, a ausência de restrições mais rígidas da plataforma atrai influenciadores. “As grandes plataformas passaram a tomar medidas incômodas; as pequenas não respeitam”, disse o diretor executivo do InternetLab, Francisco Brito Cruz. “Se o Rumble receber uma ordem judicial brasileira e não cumprir, não é uma questão de querer ou não. Ele não pode fazer isso. Pode-se discutir, questionar a decisão, mas não pode descumprir.”
Já na avaliação do advogado André Marsiglia, as suspensões de Moraes podem configurar “censura prévia”. “Entendo que suspender um perfil é censura prévia porque é impedir uma pessoa de se manifestar no futuro. Não existe um ilícito futuro, um ilícito que não aconteceu”, disse.
Cruz defendeu a adoção de ações preventivas para evitar episódios como o ataque do dia 8. Telegram e Rumble não responderam. O Supremo não quis comentar. Allan dos Santos, Constantino e Figueiredo não foram localizados.
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