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Bruno Soller analisa o comportamento do eleitor brasileiro com base em big data e pesquisa

Opinião | De ateus a evangélicos - a mudança religiosa no país mais católico do mundo

Na eleição de 1989, apenas 9% dos eleitores se declaravam evangélicos; hoje esse número supera os 30%

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Por Bruno Soller
Atualização:

Desde a redemocratização não houve mudança maior na característica da sociedade brasileira do que a religiosa. No pleito de 1989, apenas 9% dos eleitores se declaravam evangélicos, e, hoje, esse número, mesmo sem a contagem oficial do Censo, supera os 30%, considerando as pesquisas realizadas pelos maiores institutos do país. Uma corrente que triplicou em pouco mais de 30 anos.

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O aumento de evangélicos não é o único ponto que vai destronando o Brasil da posição de país mais católico do mundo. Entre os jovens de 16 a 24 anos, em levantamentos feitos pelo Datafolha, na última eleição, a expressão de pessoas sem religião já supera qualquer linha dogmática existente. No Rio de Janeiro, 34% dos entrevistados nessa faixa etária consideram não possuir religião alguma e mais 32% se declaram evangélicos. Dois terços do novo eleitorado, na segunda cidade mais populosa do Brasil, já não é mais católico.

Essa nova configuração alerta para uma sociedade muito distinta e em constante movimentação. A pensar que os evangélicos crescem quase 1% ao ano e com a estagnação do catolicismo, muito em breve, ao manterem essa taxa de conversão, serão maioria no país. As projeções feitas desde o Censo de 2010, eram de que até 2032, ou seja, daqui a menos de dez anos, o Brasil já teria maioria evangélica.

Marcha para Jesus em São Paulo, em junho.; Censo projeta Brasil evangélico em 2032 Foto: Tiago Queiroz

O impacto dessa nova sociedade no panorama eleitoral é o que mais instiga as análises sobre o comportamento do voto. Os evangélicos crescem na parte de baixo da pirâmide social, especialmente nas periferias das grandes cidades, onde concentra-se a classe C2, que congrega 27,2% dos brasileiros, segundo Critério Brasil, desenvolvido pela ABEP. Os sem religião aumentam vertiginosamente entre as classes mais altas, deixando os católicos cada vez mais isolados entre os grupos etários mais velhos e a classe D, mais pobre, com renda média próxima aos 900 reais, que possui 28,8% de pessoas.

É importante perceber que o desequilíbrio social é responsável por aglutinações de classes em algumas regiões. O Nordeste, por exemplo, possui 49,1% de habitantes na classe D, contra apenas 19,5% do Sudeste. Não à toa, no Nordeste é onde vemos ainda a maior expressão do catolicismo romano. O sertão nordestino é palco de romarias, expressões culturais como as festas juninas de São João, São Pedro e Santo Antônio, a Paixão de Cristo e diversos santuários, como o de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, no Cariri cearense.

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Desde 2006, há um cruzamento direto de votos entre este eleitor mais pobre e católico com o lulismo, que parece inquebrantável. Por outro lado, o voto da classe C2, que é cada vez mais evangélica, tem se comportado como um verdadeiro swing vote, usando a expressão americana que designa um eleitorado que pode se mover para qualquer polo. Em regiões onde temos uma combinação dominante entre classe C2 e evangélicos, como a Baixada Fluminense, é possível ver essa movimentação do eleitorado - em 2014, Dilma vence com boa margem, em 2018, Bolsonaro amealha mais de 70% dos votos e, em 2022, apesar de vencer, Bolsonaro recua mais de 15% no totalizado da região.

A complexidade desse eleitorado é tamanha que não o permite ser homogêneo. Apesar de bastante apegado aos valores morais - uma pesquisa divulgada pelo instituto RealTime Big Data, em 2022, mostra que 76% dos evangélicos veem uma degradação moral na sociedade brasileira, o aspecto da renda é também crucial para a escolha do voto. Diferentemente do catolicismo, o protestantismo prega a prosperidade como uma linha teológica, e essa é uma mudança de mentalidade para os votos de pobreza, o franciscanismo, presentes na fé católica. A riqueza é dadivosa para boa parte das denominações evangélicas.

Essa dupla mão entre o conservadorismo de costumes e a busca por um estado mais provedor, faz com que haja uma dicotômica relação com os dois polos dominantes da política nacional. O bolsonarismo entregou, em certa parte, essa demanda por um freio de arrumação moral e o lulismo com as políticas assistenciais atendeu a algumas demandas de geração de renda.

O futuro, se a Deus pertence, mostrará se existe algum campo que absorverá majoritariamente essa vertente ou se ela por sua força será capaz, até mesmo, de mudar a lógica de todo um sistema. O fato é que o maior país católico do mundo já é uma grande potência evangélica e terá que lidar com uma nova onda de jovens que não mais professam os dogmas tradicionais. O brasileiro mudou e será necessário muito estudo para compreender a sua visão de mundo daqui para frente.

Opinião por Bruno Soller
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