Ideias sobrevivem adormecidas durante muito tempo, mas precisam do momento certo para serem realizadas. É o que parece estar acontecendo agora no embate Lula versus Banco Central e as taxas de juros.
A ideia de que desequilíbrio fiscal não é o precursor de colapsos econômicos ou de inflação é debatida há muito no mundo acadêmico. Simplificando brutalmente, não haveria nada errado com um governo que pretende estimular a economia gastando muito mais do que arrecada, pois os benefícios (renda, crescimento, arrecadação, popularidade) vêm logo ali.
O que não pode acontecer é a política monetária atrapalhar, ainda mais se baseada no falso pressuposto de que existe uma crise fiscal. Que, por sua vez, alimentaria as falsas expectativas de uma persistente inflação só remediável ao preço intolerável de taxas de juros exorbitantes. Isto, sim, travaria todo o conjunto da política econômica, beneficiando apenas “rentistas”.
Lula nunca se interessou por debates acadêmicos, mas as ideias acima casaram perfeitamente com suas intuições políticas, hoje baseadas no fígado. Conceitualmente ele regrediu ao quadro mental anterior ao seu primeiro período na Presidência, assumindo que tudo não passa de uma luta entre ricos e pobres e que “elites” conspiram para não deixá-lo governar.
Como todo populista, Lula enxerga conflitos pelo “pessoal” e não pela relação institucional. Resume boa parte da questão da taxa Selic a um presidente do Banco Central que foi de camiseta amarela votar no adversário Bolsonaro nas últimas eleições (portanto, um “infiltrado”). É apenas a repetição de um velho comportamento: na época do mensalão, por exemplo, ele esperava “gratidão” por parte de alguns indicados por ele para o STF.
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Nesse sentido, não é propriamente uma “jogada” política a campanha de Lula contra o BC e os juros, tentando pressionar a autoridade monetária a se alinhar ao Planalto. Não é tampouco a criação de um bode expiatório para, eventualmente, “justificar” números na economia inadequados para manter popularidade.
É algo muito mais amplo: é o casamento de ideias no campo das doutrinas econômicas com a intuição “certeira” (para ele, Lula) da realidade política. Essa é a principal causa do evidente descompasso das declarações de grupos de assessores escalados em várias áreas econômicas do governo e as falas do presidente.
Nesses grupos, como é sabido, trafegam várias ideias, até conflitantes. Lula está exibindo as próprias. Por isso, são tão perigosas: é sempre o apego a ideias equivocadas que está na raiz de desastres econômicos.
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