No dia 23 de dezembro de 2024, Flavio Dino suspendeu o pagamento de emendas de comissão. Já o fizera em agosto, num período em que a distribuição estava restritíssima, limitada pela Justiça Eleitoral. A nova suspensão, coincidente com o início do recesso parlamentar, viria logo depois de o governo aprovar o seu pacotinho fiscal.
A cronologia dos atos sugere.
O ministro suspendera o movimento em agosto, quando emendas não podiam ser pagas. Suspendeu-o novamente em dezembro, coincidindo com o começo das férias no Congresso – e após o governo ter aprovado seus projetos no Parlamento.
Só pode ser suspenso de novo o que fora liberado. Liberado em 2 de dezembro. Gesto feito mesmo com a evidência – denunciada nesta coluna – de que a Lei Complementar 210 afrontava as determinações do Supremo.
Produto de acordo político – mesa de conciliação posta pelo STF – entre Executivo e Legislativo, a LC 210 sofisticou o esquema do orçamento secreto, com a formulação do que seria, parasitando a emenda de comissão, a emenda de líder partidário. Está tudo na lei.
Lei de 25 de novembro. Semana depois, Dino liberaria o pagamento das emendas – num momento convergente com as necessidades de o governo Lula convencer deputados e senadores a lhe aprovar a agenda. Não havia – não em termos jurídicos – razões para que liberasse o pagamento das emendas. Bem ao contrário.
Corte constitucional não dá voto de confiança, algo de natureza política e próprio a parceiros. Corte constitucional faz controle de constitucionalidade. Controle de constitucionalidade que não pode ser subordinado às urgências da hora.
A cronologia dos atos comunica.
A LC 210 é do final de novembro. A liberação, do início de dezembro. A portaria interministerial que disciplinaria os pagamentos, de 10 de dezembro. E então o 12 de dezembro – dia da materialização da emenda de líder partidário.
O dia em que Lira paralisou o funcionamento das comissões temáticas. O mesmo dia em que dezessete líderes partidários remeteriam ao governo ofício – jogada pactuada com o Planalto – por meio do qual tomavam as prerrogativas das comissões para ordenar, alterar e mesmo criar destinações às emendas de comissão.
Circunstância em que, pervertendo ao estado da arte a já corrompida emenda de comissão, uma massa de dezessete líderes partidários se constituiu em fachada da fachada para o exercício do orçamento secreto. Conforme previa... a LC 210.
Orçamento que é secreto por esconder os verdadeiros donos do Orçamento. Que não são os deputadinhos, vereadores federais, autorizados a apadrinhar migalhas. Há os patronos dos padrinhos. O orçamento é secreto para proteger a estrutura autoritária do bicho.
Isso, a LC 210 encontrando o seu destino, ocorreu – repita-se – em 12 de dezembro. Dali até 20 de dezembro, o governo barbarizaria na aceleração do empenho de emendas e aprovaria o pacotinho fiscal, sob o milagre da multiplicação de votos inexistentes pouco antes.
A cronologia dos atos constrange. Constrangeria, houvesse República.
E voltamos ao início de nossa trama. É circular mesmo. Aprovado o pacotinho fiscal, Dino não tardou a suspender novamente o pagamento das emendas – em 23 de dezembro. Que liberaria de novo no dia 29, autorizado o disparo de emendas empenhadas até 23 de dezembro.
Decisão em que o ministro fez constar que novas conversas terão vez entre fevereiro e março deste 25 – quando já for outro o comando na Câmara. As coisas vão se ajeitar até lá; e o orçamento secreto encontrará o leito da continuidade.
Como – com razão – uns não confiam nos outros, o Parlamento fez um seguro-dino e deixou pendente a votação do Orçamento da União. Tudo vai se acertar. Apenas custará caro – para você. Ano que começa sem Orçamento mostra já na largada o seu preço.