Fernando Haddad botou o bloco na rua. Não o do pacote de corte de gastos, que ficou – mais uma vez – para a semana que vem. Na pista, puxado pelo ministro e evoluindo para promover caça às bruxas e outras rinhas, a relação de beneficiários de incentivos fiscais no Brasil.
Excelente iniciativa. Neste país, merece elogio o cumprimento da mais óbvia obrigação. Transparência sobre a coisa pública. Sempre. Transparente também Haddad – que se defende atacando. Timing importa.
Pressionado a materializar especulação que ele mesmo criara-alimentara e apresentar medidas de austeridade capazes de animar o natimorto arcabouço fiscal, o ministro respondeu à carga surfando a onda da distribuição de responsabilidades.
Nada contra a difusão de constrangimentos. Há oportunidade aí.
Haddad foi lá na crista para constranger: quem cobra corte de gastos rigoroso trabalha por não ter cortados os seus benefícios. Não mente. Verdadeiro sendo que empresário nenhum deixará – nem poderia deixar – de inscrever seu negócio numa possibilidade legal de pagar menos tributos.
A Fazenda atiça: só cortará despesas porque não conseguiu rever gastos tributários. Constrangido também o Parlamento.
Não mente. Verdadeiro sendo que o mundo real de um governo gastador terá lugar num buraco mais fundo. O desejo malsucedido de acabar com a desoneração da folha de pagamentos não pode eclipsar a origem petista do programa, de Dilma I, nem disfarçar que este Dilma III, que discursa contra incentivos fiscais, inventou o Mover.
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Nada contra o uso seletivo de constrangimentos. Há para todos os gostos. Ou não seria o Brasil esta república limitada pela apropriação particularista do Estado. Haddad aponta o dedo e estimula a busca por recortes que confirmem vieses. Há para todos os lados, à esquerda e à direita. É muito pouco.
O constrangimento – a exposição de beneficiários e beneficiadores – não pode ser fim em si.
Somente entre janeiro e agosto deste 2024, somaram-se R$ 97,7 bilhões em benefícios fiscais, número relativo a 43 modalidades de incentivos.
Volume que precisa ser comparado a alguns valores que compõem o debate sobre corte de gastos: os mais de R$ 50 bilhões em emendas parlamentares contratados para 2025; os quase R$ 50 bilhões de déficit na Previdência dos militares em 2023.
São cerca de R$ 98 milhões em incentivos fiscais em oito meses de 24. Muita coisa está fora da ordem.
Zorra que oferece oportunidade – olha ela aí – a um advento revolucionário. Troço inédito. O de formular e manter políticas públicas com base em experiências-evidências-eficiências. Oh! O de renovar programas a partir da aferição do que entregam ante o custo que têm. Genial!
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