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Interpretação crítica e científica das instituições e do comportamento político

Opinião | A prisão de um general por tentativa de golpe é a grande novidade no Brasil

Prender militares graduados, políticos e empresários poderosos por comportamentos desviantes e de natureza golpista não é uma tarefa fácil em nenhuma democracia do mundo

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Foto do author Carlos Pereira
Atualização:

As revelações detalhadas das investigações da Operação Contragolpe da Polícia Federal de que estava sendo tramado um golpe de estado no Brasil, após a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro em 2022, deixaram o país estarrecido. O plano golpista tinha até data para ser executado, 15 de dezembro de 2022, e também incluía a prisão e o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes.

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Diante dessas revelações surpreendentes, vários analistas políticos e autoridades concluíram apressadamente que a democracia brasileira teria escapado por pouco... que o Brasil teria chegado muito perto de ter sua democracia erodida.

A história do Brasil republicano é marcada por vários exemplos de generais que estavam diretamente envolvidos em tentativas de golpes de estado, muitas delas inclusive bem-sucedidas. Ou seja, a presença de generais golpistas na vida política brasileira não é novidade. O novo é ter um general e seus comparsas “kids pretos” presos por tentativa de golpe.

General Mário Fernandes, ex-ministro interino da Secretaria-Geral da Presidência Foto: Eduardo Menezes/Secretaria-Geral da Presidência

Prender militares graduados, políticos e empresários poderosos por comportamentos desviantes e de natureza golpista não é uma tarefa fácil em nenhuma democracia do mundo. Na realidade, raras conseguem!

A pergunta que deveríamos nos fazer é a seguinte: se os golpistas tinham os meios e os recursos para que o golpe fosse implementado, por que o golpe foi abortado?

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A trama ardilosa do golpe não prosperou não por falta de volição de golpistas. Mas porque os custos de sua implementação em um país com as características institucionais do Brasil, com inúmeros pontos de veto no seu sistema político, seriam proibitivos. Ou seja, as instituições políticas brasileiras geram custos impagáveis para quem atenta contra elas.

Existe uma diferença entre ameaças críveis, quando os atores dispõem de meios e recursos de implementá-las, e ameaças não críveis, quando os custos de implementação das ameaças são proibitivos. No Brasil, as ameaças de erosão democrática são deste segundo tipo; logo, o risco de quebra democrática se aproxima de zero. O risco de quebra democrática, que, a uma primeira vista, parece tão perto está, na verdade, bem longe.

A melhor medida de solidez de uma democracia não é a ausência de agressões e de ameaças por parte de maus perdedores. Naturalmente que melhor seria se tais ameaças não existissem. Mas instituições de controle normalmente não atuam ex ante, mas ex post. O que é preciso ser observado é se as instituições têm oferecido respostas robustas a essas agressões de forma consistente.

A Operação Contragolpe da Polícia Federal revelou ser mais uma evidência da robustez das instituições políticas, mais precisamente das organizações de controle, em defesa da democracia no Brasil.

Muita coisa mudou no Brasil ao longo da sua história republicana, mas talvez uma das maiores mudanças tenha sido a sinalização de que quem atenta contra as instituições democráticas brasileiras será punido. Acabou a história de elites políticas insatisfeitas por terem as suas preferências contrariadas nas urnas conseguirem virar a mesa.

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Opinião por Carlos Pereira

Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE) e sênior fellow do CEBRI.

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