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Interpretação crítica e científica das instituições e do comportamento político

Opinião|Sucesso eleitoral de prefeitos com mais emendas parlamentares não é anomalia do sistema político

Quando a demanda dos eleitores e políticos locais por pork é correspondida com a sua oferta pelo parlamentar por meio de suas emendas, todos se beneficiam desse jogo

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Foto do author Carlos Pereira

Muitos analistas políticos têm demonstrado surpresa com o fato de os municípios mais beneficiados com emendas de autoria dos parlamentares terem apresentado uma taxa maior de reeleição dos seus respectivos prefeitos nas eleições do último domingo.

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O fato de o sucesso eleitoral de prefeitos estar relacionado com o maior recebimento de emendas parlamentares não é uma anomalia ou disfuncionalidade do sistema político brasileiro, mas sim um sinal de que ele está funcionando de acordo com o que se espera dele.

A conexão eleitoral em sistemas de representação proporcional com lista aberta para o Legislativo, e voto majoritário para o Executivo, como ocorre no Brasil, se constrói a partir de elos entre o representante nacional (legislador) e uma rede local de interesses nos municípios. Embora essa rede local possa variar de um município para o outro, ela é comumente formada pelo prefeito, vereadores, líderes religiosos, associações, clubes, sindicatos, comércio, empreiteiras locais etc.

Plenário da Câmara dos Deputados Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados

Quanto mais o legislador nutrir municípios com políticas localizadas e transferências de recursos de sua autoria, maior a probabilidade de líderes políticos locais e seus respectivos partidos de serem bem sucedidos eleitoralmente.

Do mesmo modo, as redes locais de interesse que foram beneficiadas com políticas e transferências locais de autoria do legislador estarão mais motivadas na reeleição desse representante nacional para que assim continuem recebendo mais recursos em um claro processo de retroalimentação em busca da sobrevivência eleitoral mútua.

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No artigo “Famintos por pork: uma análise da demanda e oferta por políticas localistas e suas implicações para a representação política” (publicado no livro “O Congresso por ele mesmo: autopercepções da classe política brasileira” organizado por Timothy Power e Cesar Zucco), escrito em parceria com Barry Ames e Lúcio Rennó, mostramos que os eleitores e políticos locais têm “fome” de pork e demandam que seus representantes nacionais entreguem essas políticas locais.

É importante salientar que essa conexão entre o representante nacional e a política local não é uma peculiaridade do sistema político brasileiro.

Pork, ao contrário do que dizem os críticos, é um serviço que visa melhorar a qualidade de vida das pessoas. Sempre tive orgulho de trazer para West Virginia recursos e políticas locais na forma de pork. Eu não tenho que me desculpar ou me envergonhar por isso.” Esta célebre frase foi pronunciada por Robert Byrd, também conhecido com o “king of pork” (rei da política local), que foi o senador mais longevo dos EUA com nove mandatos consecutivos pelo partido Democrata.

Ou seja, quando a demanda dos eleitores e políticos locais por pork é correspondida com a sua oferta pelo parlamentar por meio de suas emendas, todos se beneficiam desse jogo. Nesse sentido, as políticas locais, baseadas na distribuição e alocação de emendas orçamentárias, são uma forma na qual parlamentares respondem às demandas dos eleitores e das suas redes locais de interesse. Em última instância, pork é um dos mecanismos mais importantes no fortalecimento dos laços representativos entre eleitores, governos locais e representantes nacionais.

Como a lógica da alocação de recursos públicos por meio de emendas é a sobrevivência eleitoral dos políticos locais e nacionais, existem vários municípios, por exemplo, que nunca recebem emendas por falta dessas conexões eleitorais. Por outro lado, existem municípios que sempre recebem emendas mesmo quando outros teriam maiores necessidades de tais recursos. Ou seja, o jogo nem sempre gera eficiência, mas essa é uma característica do sistema.

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Opinião por Carlos Pereira

Cientista político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE) e sênior fellow do CEBRI.

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