Caso das joias para Bolsonaro e Michelle é ‘muito heterodoxo’, afirma Gilmar Mendes

Ministro diz que caso está sendo investigado em primeira instância e, a princípio, não vê necessidade de envolvimento do STF

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RIO – O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), definiu como “muito heterodoxo” o caso das joias dadas ao casal Michelle e Jair Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita. As joias, avaliadas em cerca de R$ 16,5 milhões, estavam na bagagem de um auxiliar do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque, que representou o País em um encontro na nação árabe, em outubro de 2021, e não foram declaradas à Receita Federal no momento do desembarque internacional, em São Paulo, como revelou o Estadão.

“É algo muito heterodoxo em tudo, mas vamos aguardar as investigações. Certamente, a Polícia Federal e o Ministério Público vão se debruçar sobre isso e haverá testemunhos e declarações”, disse o ministro a jornalistas, na tarde deste sábado, 11, durante sua participação no 17.º Seminário de Gestão Esportiva, na sede da Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio. O evento é organizado pela FGV em parceria com o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

O Gilmar Mendes, do STF, em seminário na FGV do Rio neste sábado, 11: caso das joias dadas de presente a família Bolsonaro é 'heterodoxo' Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Gilmar disse que, por ora, não enxerga a participação do STF no caso. “A princípio não vejo (necessidade de) nenhuma decisão no Supremo, a não ser que venha a se discutir alguma coisa em habeas corpus. Isso está sendo investigado pela Polícia Federal em primeiro grau. O inquérito vai ser acompanhado no âmbito da Justiça Federal do Distrito Federal”, disse o ministro.

Projeto de lei

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Também presente ao evento, o deputado federal Pedro Paulo Carvalho (PSD-RJ) comentou o projeto de lei (PL) apresentado por ele, na Câmara dos Deputados, após a revelação do caso das joias pelo Estadão. Informalmente apelidado de “Lei Joias da Arábia”, o PL pretende regulamentar o recebimento de presentes por autoridades brasileiras. Como eventuais mudanças na legislação, nesse caso, não retroagem, a família Bolsonaro não seria atingida pelas novas regras, caso sejam aprovadas no Congresso Nacional.

Segundo Pedro Paulo, a proposta vem para preencher um vácuo nas regras para o recebimento deste tipo de presente por autoridades brasileiras. “Não há lei sobre isso. Não fazemos essa divisão (nas regras sobre entrada de bens no País). Os Estados Unidos fazem, Inglaterra faz, até a Argentina faz, e o Brasil não tem nada especificando”, disse o parlamentar.

Conforme o projeto de lei, presentes a autoridades passariam a respeitar as regras que se aplicam a civis, ou seja, limite de entrada de bens no valor de US$ 1 mil sem tributação, com definição de multa para a autoridade que desrespeitar e uma gradação, que pode chegar a infração penal, para contemplar casos semelhantes ao do ex-presidente, no qual Pedro Paulo enxerga casos de assédio e tráfico de influência.

Prisão

(A punição) Pode chegar até a pena de prisão. Botei alguma gradação porque esse episódio (de Bolsonaro) tem várias irregularidades juntas dignas de tipificação criminal, por exemplo, a tentativa de assédio a funcionários públicos, agentes da Receita, depois uma ‘carteirada’, o uso de influência dizendo que (o presente) era para a primeira-dama. Então, propomos um valor-teto para não ficar em um abordagem subjetiva e com sanções previstas e gradativas”, afirmou Pedro Paulo.

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No texto, a aceitação de presente, brinde ou hospitalidade fora dos termos da lei será punível com pena de dois a 12 anos de prisão e multa, além de repercussão administrativa (improbidade, perda do cargo, multa civil etc). E terceiros que tentem desembaraçar o bem ou liberá-lo às margens da lei também deverão ser punidos caso o presente esteja retido.

Questionado sobre a viabilidade da tramitação e aprovação no Congresso, Pedro Paulo disse que ainda está iniciando as articulações e que vai conversar com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O parlamentar sugeriu que aprovar a lei seria uma resposta à sociedade na esteira do caso.

“Em uma Câmara com cerca de 13 mil projetos de lei, tudo depende da vontade política. Se o presidente da Câmara entender que é algo que precisa estar na legislação, isso se resolve em um dia, em uma hora. A apresentação do projeto vem muito para chamar a atenção sobre esse espaço vazio na lei, a necessidade de regras melhor desenhadas”, disse Pedro Paulo.

Questionado sobre a proposição do deputado fluminense, o ministro Gilmar Mendes disse entender que já há previsões legais a este respeito. “Se não me engano, já tem regras sobre limites. Teria de olhar, eu sei que tem limites para algo do qual você (autoridade) pode se apropriar”, disse.

Segundo Pedro Paulo, o regramento sobre o tema é todo infralegal, no nível da Controladoria-Geral da União (CGU) e Tribunal de Contas da União (TCU).

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