PUBLICIDADE

Centrão coloca parentes e apadrinhados sem experiência na Telebras com salários de até R$ 40 mil

Estatal diz que indicados têm experiência e citou como exemplo o novo diretor de Governança, que foi responsável pela instalação da loja da Oi em Imperatriz (MA), além de ter sido gerente de vendas

PUBLICIDADE

Foto do author Julia Affonso
Foto do author Vinícius Valfré
Atualização:

BRASÍLIA - O Centrão ampliou o cerco à Telebras no momento em que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende investir R$ 6,6 bilhões para levar internet a escolas públicas. A estatal integra o comitê que vai definir como os recursos serão aplicados. Nos últimos meses, expoentes do grupo político que integra o governo petista têm indicado aliados para cargos-chave em diferentes níveis da companhia, por intermédio do senador Davi Alcolumbre (União-AP). Procurada, a Telebras diz que os indicados têm experiência.

PUBLICIDADE

No final de outubro, o Conselho de Administração da Telebras aprovou o nome do policial civil do Tocantins Wallyson Lemos dos Reis Oliveira para o cargo de diretor de Governança. No currículo, ele informa ter feito um curso online na área de telecomunicações com carga horária de 30 horas. O agente foi apadrinhado pela senadora professora Dorinha Seabra (União-TO), que o apresentou ao ministro das Comunicações, Juscelino Filho, também uma indicação do União Brasil.

A Lei das Estatais prevê, em seu artigo 17, que integrantes de Conselho de Administração das empresas públicas e indicados para os cargos de diretor “serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento”. O nome de Wallyson Oliveira foi aprovado por maioria de votos - e não por unanimidade - no Comitê de Pessoas, Elegibilidade, Sucessão e Remuneração da Telebras. A ata da 129ª reunião do colegiado registrou que o presidente do comitê, Lauro Arcângelo Zanol, apontou que o policial não cumpria requisitos para ocupar a vaga, como possuir notório conhecimento compatível com o cargo para o qual foi indicado.

No centro da foto: O senador Davi Alcolumbre (União-AP) apadrinhou a ida de Juscelino Filho para o comando do Ministério das Comunicações. Foto: Weslley Galzo/Estadão 

Ao Estadão, a Telebras citou que o policial “foi responsável pela instalação da loja da Oi Brasil em Imperatriz (MA), e se tornou gerente de vendas da referida filial” como prova de sua experiência no setor. “Está iniciando o curso de Governança Corporativa em Empresas Estatais no Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.” O curso de governança citado pela estatal é oferecido de forma online e custa R$ 3,5 mil. As videoaulas são gravadas e liberadas aos alunos, que podem assisti-las a qualquer momento.

Deputado emplacou sobrinho na Telebras com salário de R$ 27 mil

Com orçamento de R$ 865 milhões, a Telebras é vinculada ao Ministério das Comunicações. O comando foi compartilhado por dois grupos políticos: o do União Brasil e o do Progressistas, do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Como mostrou o Estadão, integrantes da equipe que trabalhou com o ex-ministro Fábio Faria (PP-RN) foram mantidos por Juscelino Filho durante o Governo Lula em duas secretarias da pasta.

O União Brasil, de Alcolumbre, emplacou Juscelino Filho como ministro, a secretária-executiva da pasta, Sônia Faustino Mendes, e ficou também com o controle da Telebras. O senador indicou ao menos 9 nomes na estatal, incluindo a diretora administrativo-financeira, Tatiana Rúbia Melo Miranda. Também foram abrigados na companhia o advogado do Amapá George Arnaud Tork Façanha, como gerente de compras e contratos, e a ex-deputada e aliada de Alcolumbre, Marcivânia Flexa (PCdoB-AP), como assessora da Presidência.

O partido ainda apadrinhou a contratação e a ascensão do sobrinho do ministro do Turismo, Celso Sabino (União-PA), na estatal. Sem experiência na área e apenas com um mandato de vereador de Belém, Celso Sabino Sobrinho foi promovido na companhia, em outubro, recebeu um expressivo aumento salarial e passou a gerenciar toda a área comercial da empresa na Região Norte. O salário dele pulou de R$ 16 mil para R$ 27 mil em seis meses.

Publicidade

Já o ouvidor da Telebras, João Evangelista Guedes Filho, foi secretário parlamentar entre 2007 e 2009 do então deputado Efraim Filho (União-PB) - hoje senador.

Setor de conectividade concentra bilhões de reais

O setor da conectividade, cobiçado pelo Centrão, concentra bilhões para investimentos, principalmente os provenientes do Leilão do 5G e do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust). A verba será usada pela Estratégia Nacional de Escolas Conectadas (Enec), criada pelo governo Lula em setembro. O recurso já está em caixa e independente de verba do orçamento público, o que tem provocado interesse de lideranças políticas do grupo.

A Telebras é um dos órgãos que compõem o comitê executivo da Enec. Caberá ao colegiado operacionalizar a destinação dos R$ 6,6 bilhões que o governo conta para providenciar internet para escolas públicas. Uma das responsabilidades será definir critérios de contratação e manutenção do serviço.

PUBLICIDADE

Hoje, a estatal já é responsável por levar internet a diversos pontos do País e, atualmente, administra o programa Governo Eletrônico - Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac), do governo federal, que oferece conexão a mais de 17 mil unidades de ensino do País. O programa está em vias de mudança de contrato.

As trocas recentes na estatal chegaram até a cúpula da empresa. O presidente da Telebras, Frederico de Siqueira Filho, empregou um primo de sua mulher como seu chefe de gabinete na estatal. O advogado Romualdo Braga Rolim Neto foi admitido em julho e, pela função, recebe um salário de R$ 26 mil.

O presidente da Telebras, Frederico de Siqueira Filho (à esquerda), tomou posse na estatal em maio. Cerimônia teve a presença do ministro das comunicações, Juscelino Filho, e do secretário de Telecomunicações, Maximiliano Martinhão. Foto: WILTON JUNIOR

A companhia afirmou ao Estadão que “a chefia de gabinete é um cargo de natureza especial e de estrita confiança do presidente de qualquer órgão, entidade, autarquia ou empresa no governo, assim como ocorre na iniciativa privada”. Segundo a Telebras, o advogado “foi contratado para o cargo por ser um profissional da restrita confiança do presidente da empresa, possuir experiência jurídico-administrativa adequada e pleno atendimento aos requisitos inerentes ao cargo”. (Leia mais abaixo)

Quem é o novo diretor de Governança da Telebras

Wallyson Oliveira entrou na estatal, na semana passada, para substituir o atual diretor de Governança, Luiz Fernando Ferreira Silva, que havia sido admitido na função em maio. A princípio, o policial vai atuar até abril do ano que vem em “complementação de mandato” de Ferreira da Silva. O salário será de R$ 40 mil.

Publicidade

O novo diretor de Governança da Telebras fez, ao todo, três cursos em um site online que oferece aulas de forma gratuita. O portal cobra R$ 37,90 para o estudante obter um certificado digital de conclusão das atividades. Há cursos sobre os mais variados temas. Wallyson Oliveira registrou no currículo ter feito outros dois, além aulas sobre Telecomunicações: Administração Pública e Administração Pública Direita e Indireta - este com carga de 10 horas.

A empresa que oferece as aulas afirma que os certificados emitidos após a conclusão dos estudos são válidos como um documento “técnico profissionalizante ou de graduação ou de pós-graduação e não dá direito de assumir responsabilidades técnicas”.

Políticos do Centrão não se pronunciam

Os senadores Davi Alcolumbre, Efraim Filho e professora Dorinha Seabra não se manifestaram.

Procurada, a Telebras disse que Wallyson Lemos dos Reis Oliveira “foi responsável pela instalação da filial da Oi Brasil em Imperatriz(MA), e se tornou gerente de Vendas da referida filial”. Segundo a estatal, Oliveira trabalhou na Polícia Civil entre 2009 e 2015. “Nesse período, conduziu a elaboração do planejamento estratégico para implantação da Subsecretaria da Polícia Comunitária do Estado do Tocantins e se tornou coordenador estadual de Polícia Comunitária”, afirmou a companhia.

“Coordenou e supervisionou a conformidade da área com as políticas, diretrizes e metas estabelecidas pelo governo local e coordenou a equipe na elaboração e gestão de projetos de expansão e aquisição de bens junto à Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), do governo federal. Também liderou a abertura de conselhos municipais de Segurança Pública e passou a coordenar as atividades relacionadas a esses conselhos.

A estatal destaca ainda que Wallyson Oliveira graduou-se em Direito em 2015. Fez ainda uma pós-graduação em Direito Administrativo e uma especialização em Direito Digital e Proteção de Dados. Em 2016, foi cedido para a assessoria jurídica do Procon do Tocantins e, em seguida, ao Tribunal de Justiça e no Governo do Estado.

“Avançando em suas qualificações, está fazendo mestrado em Proteção Jurisdicional e Direitos Humanos pela Escola Superior de Magistratura do Estado do Tocantins e está iniciando o curso de Governança Corporativa em Empresas Estatais no Instituto Brasileiro de Governança Corporativa”, registrou a companhia.

Publicidade

Perguntada sobre o motivo de ter trocado o diretor de Governança em menos de seis meses, a estatal afirmou que “a designação de membros para compor a Diretoria Executiva da Telebras é uma prerrogativa do Ministério das Comunicações”. “Os nomes designados para ocupar diretorias são submetidos ao colegiado do Comitê de Pessoas, Elegibilidade, Sucessão e Remuneração da Telebras para análise e manifestação sobre a adequação do candidato ao cargo”, apontou.

A estatal também se manifestou sobre a contratação do primo da mulher de Frederico de Siqueira Filho, presidente da Telebras. “Romualdo Braga Rolim Neto é advogado, com experiência de quase 20 anos em execução de processos administrativos, atividades jurídicas e gestão de equipes nos gabinetes da Secretaria da Receita Estadual da Paraíba, na Assembleia Legislativa da Paraíba, na Procuradoria Geral daquele estado e na Procuradoria Geral do município de João Pessoa”, destacou. “O profissional é credenciado técnica e profissionalmente para o cargo.

Ao Estadão, a companhia também afirmou que George Arnaud Tork Façanha, Marcivânia Flexa e João Evangelista Guedes Filho “foram contratados pela Telebras pela larga experiência em suas especialidades e por estarem plenamente habilitados a contribuir para o desenvolvimento da Telebras nos cargos/funções em que atuam”. Segundo a estatal, “nenhum profissional” da estatal “tem qualquer vínculo” com a nova política de conectividade do governo Lula.

“A Telebras tem assento no referido Comitê, ao lado de membros desses dois ministérios (Comunicações e Educação), dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e de Minas e Energia (MME); da Casa Civil da Presidência da República; Anatel; FNDE; BNDES e a RNP (Rede Nacional de Pesquisa)”, afirmou. “A Telebras não tem nenhuma ingerência na constituição ou na coordenação desse comitê.”

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.