Chapa Lula-Alckmin une esquerda sem conseguir atrair ‘frente ampla’

Aliança entre petista e ex-tucano será lançada neste sábado; ex-governador foi diagnosticado com covid e participará por vídeo do evento

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Foto do author Beatriz Bulla
Por Beatriz Bulla e Luiz Vassallo
Atualização:

A chapa que reúne o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) será lançada oficialmente neste sábado, 7, em um evento na capital paulista. Considerada a aliança mais surpreendente até o momento da pré-campanha eleitoral, a dobradinha Lula-Alckmin – dois históricos adversários políticos – não vai estar no palco do evento. O ex-tucano foi diagnosticado com covid-19 e vai participar do ato por vídeo.

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Com os direitos políticos recuperados após a prisão na Lava Jato, Lula lidera as pesquisas de intenção de voto, seguido pelo presidente Jair Bolsonaro. O petista consolidou uma aliança no campo da centro-esquerda – com PSB, PCdoB, PSOL, Rede, PV e Solidariedade –, mas não conseguiu fechar acordos para uma almejada “frente ampla” contra Bolsonaro.

A dobradinha com o ex-adversário político a despeito da resistência na esquerda do PT foi bancada por Lula. Foi também seu gesto mais ousado na tentativa de convencer os eleitores de que pode conseguir unir contra Bolsonaro até setores da sociedade que o rejeitam. Desde que a união foi selada, no entanto, a campanha do ex-presidente se viu em meio a um apagão no comando da comunicação e fogo amigo. Bolsonaro recuperou fôlego nas pesquisas.

A campanha tentava buscar apoio de líderes partidários do centro político para uma foto diversa no palco do Expo Center Norte. Neste período, no entanto, Lula intensificou discursos para a militância, gerou a preocupação entre apoiadores e críticas de opositores.

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“Isso não foi alcançado (a foto com líderes partidários do centro). É um processo em construção, mas demos um passo importantíssimo nessa direção”, afirma o advogado e líder do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, um dos principais aliados de Lula atualmente. “É o maior arco de alianças, a partida é muito legal, é de um lugar mais avançado do que os anteriores, mas não é suficiente, porque essa eleição tem um desafio adicional, estamos enfrentando o bolsonarismo”, disse Carvalho.

O ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin durante anuncio do apoio do Solidariedade ao petista Foto: Werther Santana/Estadão

A interlocutores, Lula afirma que tentará passar a ideia, neste sábado, de que será um presidente de todo o Brasil, e não apenas das hostes petistas. O discurso foi previamente discutido com os integrantes da pré-campanha para evitar que Lula saia do script e cometa o que vem sendo contabilizado como gafes. A promessa entre petistas é de que o afago à esquerda enquanto a base digeria a aliança com Alckmin dará lugar a um ritmo concreto de campanha na rua e busca pela ampliação das alianças.

“É a candidatura de Lula mais centrista de todas, até pela característica da eleição, que é uma eleição plebiscitária. A presença do Alckmin sinaliza para isso, mas não basta”, diz Cláudio Couto, cientista político da FGV.

De todas as alianças já feitas, dizem os petistas, duas foram diferenciadas: a parceria com o empresário José Alencar e agora com Alckmin. Desta vez, esperam que o impacto seja maior do que o pacto de 2002, que tornou Lula palatável ao empresariado após três candidaturas frustradas. Mais do que um nome com entrada apenas com empresários, como Alencar, a imagem de Alckmin é considerada pelos petistas mais próximos a Lula como a encarnação “do próprio centro”, na figura do PSDB tradicional.

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O PT espera que Alckmin desarme o espírito contra Lula, demonstre a disposição do ex-presidente em fazer um governo moderado – e não só uma campanha – e abra caminhos junto ao agronegócio e à classe média. Para ver isso traduzido em votos, o ex-governador deverá se descolar de Lula a partir de agora.

“Ainda que o Alckmin tenha saído do PSDB, é inevitável olhar para essa aliança como a aliança dos partidos que organizam as eleições presidenciais no Brasil desde 1994: PT e PSDB. A união é esse sinal de que é momento de união de adversários para derrotar uma candidatura que se coloca num extremo, que é a de Bolsonaro”, afirma Vitor Marchetti, cientista político e professor da Universidade Federal do ABC.

Apoio do PSOL foi costurado por Guilherme Boulos

Na esquerda, o apoio notável foi o do PSOL. Nascido para fazer oposição ao PT, o partido fez uma inflexão histórica ao abrir mão pela primeira vez de um nome próprio na disputa à presidência. A articulação foi costurada por Guilherme Boulos, o que garantirá ao líder do MTST espaço na coordenação de campanha do petista e um dos principais lugares no palco deste sábado.

“O que mudou no PSOL é o significado do que é o Bolsonaro. Foi uma decisão política de unidade para combater um pesadelo”, afirma o deputado federal do PSOL Ivan Valente, um dos fundadores do PT.

O PT tem apoio de seis partidos na candidatura à presidência deste ano. Em quantidade, é mais do que Lula conseguiu nas disputas de 2002 e 2006, das quais saiu vencedor. Na prática, no entanto, o ex-presidente ainda espera conseguir apoio do Avante e ampliar a entrada no MDB, apesar da resistência de Michel Temer, e no PSD. Setores dos dois partidos já apoiam Lula. Nos bastidores, nomes do PSDB também admitem voto no petista – mas, no momento, apenas no segundo turno.

“A frente ampla está caminhando, mas devemos insistir ainda com os partidos que jogam com o centro. À medida que o centro vai definhando, podemos não só as siglas, mas os governadores, ainda que estejam em outros palanques, e o povo em geral”, afirma o deputado Paulinho da Força, presidente nacional do Solidariedade. A legenda é considerada a única que acena mais à centro-direita na coligação atual.

Rompida com o petista, Marina Silva, que foi ministra no governo Lula, também vem sendo cortejada, por intermédio do ex-prefeito e pré-candidato ao governo de São Paulo, Fernando Haddad (PT).

“Lula vai precisar compensar com apoio social (na centro-direita) a aliança partidária mais restrita e conversar com o empresariado e setores que, embora possam ter outras preferências, diante da falta de alternativa podem se dispor a conversar com o candidato que representaria o campo democrático”, afirma Cláudio Couto.

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