Chiquinho Brazão, preso há um ano, continua deputado e já custou R$ 1,8 milhão à Câmara

Gabinete do parlamentar, com 24 pessoas, continua funcionando enquanto plenário não julga caso; procurada, assessoria ainda não se manifestou

Foto do author Levy Teles
Foto do author Gabriel de Sousa

BRASÍLIA – Preso há exatamente um ano sob a acusação de ser o mandante do assassinato da ex-vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, o deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) mantém o mandato parlamentar e seu gabinete continua operando mesmo com o congressista estando em um presídio federal.

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Nesse período, Brazão custou aproximadamente R$ 1,8 milhão aos cofres públicos. Ele recebeu R$122,6 mil em salários, e o gabinete dele, com duas dezenas de funcionários, R$ 1,6 milhão.

O parlamentar continuará exercendo as funções até o plenário da Câmara dos Deputados votar a sua cassação, aprovada no Conselho de Ética em agosto de 2024. O novo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB) não sinalizou em que data levará a questão para análise de seus colegas.

Chiquinho Brazão foi preso em março de 2024 e continua recebendo salário de deputado federal mesmo estando na cadeia. Foto: Mario Agra/Câmara dos Deputados

Procurados, nem Motta e nem a equipe de Brazão responderam às perguntas da reportagem. O advogado Cléber Lopes, responsável pela defesa do deputado, disse que não tem ingerência sobre o processo na Câmara e afirmou que fará a melhor defesa no caso dele no plenário da Casa.

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A relatora do caso no Conselho de Ética, deputada Jack Rocha (PT-ES), diz que ainda não recebeu nenhuma previsão da presidência da Câmara sobre quando a proposta irá à votação no plenário.

O caso já poderia ser votado no final do ano passado, quando a Câmara era presidida por Arthur Lira (PP-AL), mas o assunto acabou deixado de lado. Correligionários de Marielle criticam a demora.

“A manutenção do mandato de Chiquinho Brazão até agora é a demonstração cabal de uma blindagem absurda operada em articulação pela extrema-direita e parte do centrão”, afirma o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ).

Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) fala que a Câmara está sendo omissa. “É um absurdo que ele ainda mantenha o mandato e demonstra algum nível de omissão da Câmara. O que me leva a perguntar se dentro da Câmara não tem braços milicianos que protegem Chiquinho Brazão”, diz.

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O plenário da Câmara aprovou manter Brazão preso pouco mais de duas semanas depois da detenção. A votação terminou com 277 votos a favor, 129 contra e 28 abstenções. Parlamentares do PL votaram contra a proposição porque, segundo eles, a prisão não foi em flagrante – condição que permite a detenção de um parlamentar.

Esse placar terminou com uma aprovação apertada. Assim como poderá acontecer na votação pela cassação do mandato dele no plenário, são necessários 257 votos para esse tipo de votação.

A estrutura de apoio parlamentar a Brazão segue ativa em Brasília e no Rio de Janeiro. É no Estado fluminense que se concentra a maior atividade. São 24 funcionários lotados na unidade que custaram, entre março de 2024 até hoje, R$1,6 milhão.

Segundo um funcionário ouvido pelo Estadão, maior parte do foco do gabinete está em continuar o trabalho de assistência social promovido por Chiquinho Brazão. Mesmo na prisão o parlamentar ainda faz uso do imóvel funcional, na capital federal.

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Dentro do gabinete, a estrutura não mudou após a prisão do deputado. O papel de parede que estampa a área interna continua o mesmo. Uma delas estampa uma frase de Brazão: “Buscar medidas que facilitem o dia a dia do brasileiro - que diminuam as aflições e gerem mais qualidade de vida para a população é o meu dever”.

Gabinete de Chiquinho Brazão continua estampado um ano após prisão do parlamentar Foto: Levy Teles/Estadão

A atividade parlamentar do deputado fluminense é praticamente nula. Neste ano, ele apenas subscreveu a dois requerimentos que propõem a criação da Frente Parlamentar da Baixada Fluminense do Rio de Janeiro e a Frente Parlamentar Mista de Dados Abertos e Governo Digital.

Mesmo assim, ele continua recebendo o salário dele como deputado. Em todo o ano, foram, R$ 122,6 mil. Na maior parte dos meses, ele recebeu apenas uma fração do valor bruto de aproximadamente R$ 44 mil, já que parlamentares que não registram presença em sessões plenárias têm parte do salário deduzido a cada ausência não justificada – no total, são 91.

Como mostrou o Estadão em 2023, Chiquinho Brazão gastou R$ 200 mil da própria cota parlamentar para abastecer veículos num posto de gasolina de um sócio dele mesmo.

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A Polícia Federal (PF) acusa Chiquinho Brazão, o irmão dele e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ), Domingos Brazão, e o delegado da Polícia Civil fluminense Rivaldo Barbosa de serem os mentores do assassinato de Marielle. Os irmãos são apontados pela investigação como mandantes do crime, enquanto o delegado é suspeito de agir para proteger os dois e é acusado de participação no planejamento do assassinato.

O ex-policial militar Ronnie Lessa, que participou do assassinato, disse em delação premiada que Domingos e Chiquinho foram os mandantes do crime. Segundo Lessa, os irmãos colocaram Marielle Franco tinha se tornado uma “ameaça” à expansão de negócios de milicianos.

Ele ainda disse que a exploração de atividades criminosas no local, como “gatonet” e transporte clandestino, poderia render mais de US$ 20 milhões (cerca de R$ 100 milhões).

Ainda nesta segunda-feira, 24, integrantes da família Brazão realizaram um protesto em defesa da “justiça pelos irmãos Brazão” na frente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. “Hoje faz um ano de uma das maiores injustiças que ocorre aqui no Brasil”, disse Kaio Fonseca, filho de Domingos em um vídeo publicados nas redes sociais. Ele afirma que a delação de Ronnie Lessa é “mentirosa”.

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