A cobertura do atentado ao Riocentro rendeu ao Estadão o Prêmio Esso de Reportagem de 1981. O Jornal do Brasil, por sua vez, ganhou na categoria Jornalismo. À época, com a proliferação de laudos falsos e ocultação de provas, a imprensa desempenhou papel fundamental para o desmonte da versão de que militares teriam sido vítimas, e não articuladores do atentado.
Os jornalistas que trabalharam na apuração dos fatos guardam até hoje histórias dramáticas sobre a pressão da censura. “A gente tinha feito um pacto. Falávamos ‘Isso aqui é sério’. Não tinha só o furo. Tínhamos de ficar vivos. Não sabíamos que bicho ia dar”, afirmou Antero Luiz, vencedor do Esso, em conferência da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).
Repórter da sucursal do Estadão no Rio, Antero Luiz publicou reportagens que ajudaram a trazer à tona características do explosivo usado no ataque ao Riocentro e a confirmar que o artefato explodira no colo do sargento Guilherme Pereira do Rosário. O sargento estava no banco de carona do Puma, dirigido pelo capitão Wilson Machado.
Domingos Meirelles, que também trabalhava na sucursal, conta que a equipe desenvolveu uma estratégia para driblar a censura. Com o aval do chefe de reportagem Ruy Portilho, as matérias eram colocadas em envelopes e enviadas de avião para a sede do jornal, em São Paulo, ainda “brutas”. A edição era feita lá, longe da rede de censores cariocas.
Faroeste
Quando as bombas explodiram nas imediações do Riocentro, em 30 de abril de 1981, os ataques com explosivos já eram uma triste rotina no Brasil. A edição de 10 de maio de 1981 do Estadão, um domingo, relacionava 38 atentados ocorridos nos 16 meses anteriores. Nenhum deles havia sido esclarecido até aquele momento.
De abril a setembro de 1980, militares inconformados com o processo de abertura do regime detonaram dezenas de bancas de jornais em várias cidades, como Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG) e Belém (PA). No dia 12 de agosto de 1980, vários estudantes se feriram quando uma bomba explodiu no Colégio Social da Bahia, em Salvador (BA). Composta por Renato Russo em 1979, a música “Faroeste Caboclo”, da banda de rock Legião Urbana, faz uma referência aos atentados da época.
Na canção, o protagonista João de Santo Cristo se recusa a ajudar um “general de dez estrelas” que o procura com dinheiro. “Não boto bomba em banca de jornal nem em colégio de criança. Isso eu não faço, não”, diz o personagem nos versos.
Então deputado federal pelo PMDB do Rio, o advogado Marcelo Cerqueira foi alvo de dois atentados: em 10 de julho de 1980, uma bomba incendiou o carro dele em frente à sua casa; em 2 de abril de 1981, outro artefato explodiu na varanda da residência, no bairro carioca de Santa Teresa, por pouco não atingindo sua mulher e a filha de cinco meses.
“Ali foi o último suspiro da ‘tigrada’”, disse Cerqueira ao Estadão, usando um termo cunhado pelo jornalista Elio Gaspari, autor de uma série de livros sobre a história da ditadura, para se referir ao grupo mais radical de militares ligados ao aparato de repressão do regime. “A ‘tigrada’ era um movimento no interior da repressão para não permitir a abertura que o presidente da República (o general João Figueiredo) havia prometido e estava empenhado em fazer”, contou ele.
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