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Coluna do Estadão

| Por Roseann Kennedy

Roseann Kennedy traz os bastidores da política e da economia

ACM Neto resume governo Lula em uma palavra: ‘ultrapassado’

Vice-presidente do União Brasil diz que governo demora para cortar gastos, mas garante apoio do partido na aprovação do ajuste fiscal se as medidas forem boas para o País; em entrevista exclusiva à Coluna, o ex-prefeito fala das conversas da sigla com Pablo Marçal, classifica de ‘inocentes’ os que pensam que a eleição de Trump será determinante para Jair Bolsonaro e avalia o próprio futuro político

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O vice-presidente do União Brasil, Antônio Carlos Magalhães Neto, define o governo Lula com uma palavra: “ultrapassado”. Para ele, o petista faz uma gestão analógica, presa a programas antigos e ainda deixa órfãos os eleitores que o escolheram por falta de opção. Neto também avalia que o petista deveria olhar menos para a esquerda e mais para o País, entretanto joga fora a oportunidade de fazer uma construção nacional para tirar o Brasil da polarização

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“Quem elegeu Lula não foi o PT nem a esquerda, foi uma parcela do eleitorado de centro, que rejeitou mais Jair Bolsonaro do que Lula, e por isso o elegeu. Só que esse eleitorado ficou órfão. Lula deu as costas para essa parcela do País”, afirmou em entrevista exclusiva à Coluna do Estadão.

ACM Neto critica a demora do presidente da República para fazer o ajuste fiscal e melhorar as contas públicas. O ex-prefeito entende que os cortes de gastos deveriam ter ocorrido já no primeiro ano do governo. Entretanto, ressalta que se o pacote fiscal apresentar boas medidas, seu partido votará favoravelmente. “Se forem medidas de racionalização do gasto público, de aumento da eficiência do governo, de aumento da produtividade da gestão pública, da eliminação de despesas desnecessárias, eu vou ser o primeiro a defender”, promete.

Presidente da Fundação Índigo, espécie de think tank do partido, Neto considera improvável o União Brasil compor chapa com Lula em 2026, apesar de hoje ocupar três ministérios. Para ele, a tendência da sigla é apresentar candidatura própria do governador de Goiás, Ronaldo Caiado.

ACM Neto confirma conversas do União Brasil, desde o início do ano, com o empresário Pablo Marçal, e diz que não vai vetar ou embargar o diálogo. Mas pondera ser necessário verificar em quais termos seria a aproximação do ex-coach ao partido e se ele estaria disposto a corrigir erros. Sobre a empolgação dos bolsonaristas com a vitória de Donald Trump, classifica de “inocentes” os que acreditam que o resultado nos Estados Unidos será determinante para o destino de Jair Bolsonaro em 2026.

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Nesta entrevista, o baiano fala ainda do próprio futuro político. Diz ainda não saber se disputará o governo estadual e que não será “candidato de si mesmo, por vaidade”, mas aposta ter mais chances em 2026 e admite candidatura se “for um desejo realmente do eleitor baiano”.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista

ACM Neto, vice-presidente do União Brasil Foto: Divulgação?Instagram @acmnetooficial

Acabaram as eleições municipais. Qual é o foco do União Brasil agora?

O foco principal nesses dias que sucedem a eleição municipal é tentar dar suporte e apoio aos prefeitos eleitos pelo partido, sobretudo nas maiores cidades do Brasil, para o início das suas gestões. Tanto que o partido reuniu os prefeitos das 150 maiores cidades eleitas pelo União Brasil, para falar de transição de governo, de primeiras medidas de governo, de planejamento estratégico. O União Brasil acredita muito que o trabalho desses prefeitos pode servir de vitrine para o partido. Elegemos quatro capitais, elegemos quase 600 prefeitos, então, a gente aposta nessa base, que está polarizada em todo o País.

Já é preciso ter foco na disputa para a Presidência da República?

É óbvio que, a partir de agora, o tema 2026 começa a tomar corpo e é inevitável que a gente comece a se preparar para 2026. O partido ainda não iniciou uma discussão formal interna sobre o assunto, mas ganha corpo que eu, particularmente, sou um dos defensores que o partido possa apresentar sua candidatura própria à Presidência da República. Nós temos um grande nome que pode liderar esse projeto que é o governador do Estado de Goiás, Ronaldo Caiado.

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O União só lançará candidato se houve apoio e composição do centro-direita ou dá para ir com a direita rachada?

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Não necessariamente o campo da direita e centro-direita precisa ter apenas um candidato. O ideal é que tivesse apenas um, que esse processo de escolha estivesse em bases racionais, considerando o País como um todo, avaliando os erros cometidos no passado, projetando qual é o perfil que o brasileiro quer para o futuro. Então, o ideal seria que houvesse uma unidade, mas pode ser que essa unidade não aconteça. Como ainda temos dois anos para a eleição, muita água vai correr debaixo dessa ponte e ninguém tem bola de cristal, existem variáveis que ainda não estão claras agora. Então, nesse momento, o que nos cabe é assumir uma posição e dar um passo dentro dos limites do que a gente pode fazer, que é exatamente no União Brasil.

Existe alguma hipótese de estar no palanque com Lula, fazer composição já desde o primeiro turno?

Eu não posso falar pelo conjunto do partido. Naturalmente, existem bases do União Brasil que são mais próximas do governo. O partido, através da Câmara e do Senado, tem representantes no ministério do Presidente Lula, mas o meu sentimento em relação à maioria do partido é da construção de um projeto diferente do projeto do PT, diferente do projeto do presidente Lula. Eu acho que a maioria do partido pretende construir um projeto diferente e, portanto, vai ser antagônico com o projeto do PT e do governo federal.

E esse sentimento foi reforçado pelo resultado das urnas nas eleições municipais?

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Há um recado claro das urnas, um recado que mostra que o PT foi o principal derrotado nas eleições de outubro deste ano. Imagine o partido que comanda o governo federal, que é o próprio governo, eleger apenas um prefeito de capital, que foi Fortaleza. Portanto, a gente percebeu que o eleitor deu uma clara demonstração que não quer o radicalismo, que não aceita os extremos, que entende a necessidade de política de resultado e escolheu por um caminho mais focado em gestão. E aí, é claro, anima a gente essa possibilidade de construir algo que pegue uma parte do centro, da centro-direita e também da direita para 2026.

Pablo Marçal representa parte do radicalismo na política e o União Brasil vem conversando com ele para eventual filiação. Haveria veto a ele no União?

Eu não suposto trabalhar com vetos. Em 2024, agora, a União Brasil chegou a dialogar com o Pablo Maçal a respeito de um projeto para a Prefeitura de São Paulo. Nós chegamos à conclusão que o melhor caminho era apoiar a reeleição do prefeito Ricardo Nunes, e não há nenhum arrependimento dentro do partido pela opção feita. Eu diria que a União Brasil foi decisiva para a eleição do prefeito Ricardo Nunes. Se tivesse apoiado o Maçal, poderia ter dado tempo de televisão que ele não teve, estrutura política, base de militância que o União Brasil tem na capital e mostrou com a eleição de vereadores. Mas também tenho muito claro que Maçal demonstrou que tem capital político, afinal de contas, chegou a quase 30% dos votos em São Paulo praticamente sozinho. Por outro lado, ao longo da campanha também demonstrou um enorme despreparo e os erros que ele cometeu acabaram sendo fatais e contribuíam decisivamente para ele não ir para o segundo turno e se inviabilizar no processo. O Maçal está disposto a rever, a aprender e a construir diferente para o futuro? Eu ainda não sei. Acho que o diálogo não deve ser embargado, não deve ser vetado, mas é preciso saber em que condições uma aproximação poderia se dar e com que objetivos.

A eleição de Donald Trump causou euforia no bolsonarismo. Isso seria suficiente para o União Brasil ir junto com Bolsonaro, eventualmente, numa chapa em 26?

Não, claro que não. Uma eleição do Trump, por si só, determinar o que vai acontecer em 2026 é uma inocência. Quem pensa dessa forma está sendo inocente. É claro que a eleição do Trump traz alguns reflexos. Primeiro, a gente não sabe como vai ser a relação institucional, política e econômica entre Brasil e Estados Unidos. Qualquer efeito na economia repercute na política e na eleição. Segundo, a eleição dele pode, no primeiro momento, ter um efeito psicológico, e não é superficial, afinal de contas, Trump deu uma virada que muitos não imaginavam, sobretudo olhando o que aconteceu em 2020 nos Estados Unidos. Agora, isso influencia o eleitor lá em 26, eu acho que muito menos do que as pessoas imaginam. O jogo está muito mais aqui dentro e depende muito mais da dinâmica local. Agora, a vitória do Trump mostra que a sociedade como um todo, em vários lugares do planeta e, de certa forma, isso aconteceu na eleição agora, de 24, no Brasil, tem hoje uma inclinação muito mais para a centro-direita e para a direita do que para a esquerda.

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O senhor vai ser candidato ao governo da Bahia em 2026?

Não sei ainda. Desde que passou a eleição de 2022, eu me mantive ativo no meu papel de fazer oposição aqui no Estado, afinal de contas, eu disputei contra o PT, perdi a eleição. Tive uma participação ativa agora na eleição municipal, saindo de maior, os resultados foram amplamente favoráveis, sobretudo nas minhas cidades. O União Brasil vai governar cinco vezes mais pessoas em municípios do que o PT, a partir do próximo ano. Então, isso tudo nos anima. Agora, a decisão de uma candidatura ao governo só vai acontecer mais adiante, no momento certo, e tem que ser natural. Eu não serei candidato de mim mesmo, nem pela vaidade de ser candidato, porque já fui e tive quase metade dos votos. Eu só serei candidato se for de um projeto e se for desejo realmente do eleitor baiano. Se a gente sentir que há espaço para isso, eu estou à disposição, não vou me furtar a esse projeto.

O senhor faz duras críticas ao governo Lula, conseguiria resumir o governo Lula com uma palavra?

Se eu tivesse que resumir o governo em uma só palavra, seria ultrapassado. A gente tem um governo analógico, um governo preso a programas do passado, que foram reeditados sem o mesmo brilhantismo, sem o mesmo resultado, a mesma eficiência. A gente tem um governo sem novidades, que não disse ainda que veio, que não sinaliza para o futuro. E mais do que isso, é um governo que está jogando fora uma baita oportunidade de fazer uma construção nacional mais ampla, de construir caminhos que tirassem o Brasil dessa polarização, um governo que fosse menos para a esquerda, menos para o PT e mais para o País. Porque quem elegeu Lula não foi o PT, quem elegeu Lula não foi a esquerda, quem elegeu Lula foi uma parcela do eleitorado de centro, um eleitorado que estava incomodado com Bolsonaro, que rejeitou mais Bolsonaro do que Lula, e por isso elegeu Lula. Só que esse eleitorado ficou órfão. Lula deu as costas para essa parcela do País.

E acredita que o governo Lula fará mesmo o ajuste fiscal?

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Quanto ao ajuste fiscal, aí há mais um erro. Como prefeito que fui durante oito anos, e peguei Salvador com o pior índice da Firjan - Federação das Indústrias do Rio de Janeiro - de contas públicas. Eu deixei em primeiro lugar. Fizemos superávit nos oito anos da minha gestão, mesmo enfrentando crise econômica no País, impeachment de presidente, aquele período de quebradeira da Lava Jato, pandemia. Então não é só discurso, eu tenho comigo o meu currículo e o que eu fiz. A gente faz ajuste fiscal, organiza as contas públicas no começo da gestão. E o atual governo já jogou dois anos fora. Estão dizendo agora que vão fazer. A gente precisa ver esse pacote. Uma coisa é certa: o governo não pode apostar no caminho de aumentar imposto e de pedir cheque em branco ao Congresso. O caminho tem que ser o do corte do desperdício, da racionalização, da gestão pública, da eliminação de absurdos que ainda acontecem, de privilégios, etc. Agora, para isso, o PT tem que estar disposto a cortar na própria carne e a adotar medidas que são diferentes do discurso que eles levam para o palanque e para as ruas. Espero que aconteça. Como dirigente partidário, se forem medidas de racionalização do gasto público, de aumento da eficiência do governo, de aumento da produtividade da gestão pública, da eliminação de despesas desnecessárias, eu vou ser o primeiro a defender.