No momento em que o governo federal é pressionado a rever os gastos públicos, tem ganhado força entre economistas, mas também dentro do Palácio do Planalto, a avaliação de que o arcabouço fiscal desenhado pelo Ministério da Fazenda e aprovado pelo Congresso há menos de um ano é capenga e precisará ser revisto já em 2025.
Para a diretora de macroeconomia do Santander, Ana Paula Vescovi, o arcabouço fiscal tem uma “contradição interna”. “Tem o fato de que um grupo de despesas são indexadas à arrecadação. Então, veja, ainda que o governo consiga bilhões de arrecadação para fazer frente ao equilíbrio nas contas públicas prometido até 2026, isso implicaria, automaticamente, um aumento de gastos que não cabe no teto de gastos do arcabouço, que seria destruído”, afirmou a economista em entrevista ao vodcast Dois Pontos, do Estadão.
As despesas indexadas à arrecadação são aquelas que crescem proporcionalmente à entrada de dinheiro nos cofres do governo. No caso da saúde, há um piso de 15% da receita corrente líquida. No caso da educação, de 18% na receita líquida de impostos. Esses porcentuais voltaram a valer com o fim do teto de gastos do governo Michel Temer, extinto pelo arcabouço fiscal.
Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, o arcabouço fiscal, como está, não funciona. “Vai ter que ser alterado de novo, de alguma forma, com muita dificuldade no ano que vem. A gente vai ter em 2027, no próximo mandato, um arcabouço fiscal que olhe com mais equilíbrio para arrecadação e gasto”, avaliou na entrevista.
Nas contas de Vale, se mantido o nível de despesas, não há possibilidade de o governo Lula cumprir a meta de déficit zero em 2025, e nem chegar ao superávit no ano seguinte. Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, vão apresentar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva um “cardápio de opções” para cortar despesas, mas há dúvidas sobre o interesse real do petista em frear os gastos em ano eleitoral. Sergio Vale estima que seriam necessários R$ 350 bilhões de arrecadação para zerar o déficit sem cortar nenhuma despesa.
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