O publicitário Sidônio Palmeira, marqueteiro de Luiz Inácio Lula da Silva na campanha de 2022, tem dito a ministros, em conversas reservadas, que “o governo é melhor do que a percepção popular”, mas precisa “sair da polarização” com os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro. Sidônio começou a atuar como consultor de Lula na crise política do Palácio do Planalto com o Congresso, bem antes da tragédia climática no Rio Grande do Sul e, morando em Salvador, vem agora quase toda semana a Brasília.
Pesquisas que chegaram ao Planalto, nos últimos dias, revelam que a avaliação do governo Lula, embora tenha melhorado, ainda é menor do que a expectativa da população para o terceiro mandato do presidente.
Deputados do PT reproduziram o sentimento detectado nas pesquisas, em recentes reuniões com ministros como Rui Costa (Casa Civil), Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Luiz Marinho (Trabalho), ao reclamar da falta de uma estratégia de comunicação no governo.
Na avaliação dos parlamentares, a ajuda da equipe de Lula ao Rio Grande do Sul, destruído por fortes chuvas, mostrou que a solidariedade transcende a política partidária. Nem mesmo em um momento dramático como esse, porém, as fake news saíram de cena e o receio é que tudo possa piorar na disputa para as eleições municipais de outubro.
Na tentativa de se aproximar de eleitores que desaprovam sua gestão, Lula tem citado “Deus” e “família” cada vez com mais frequência em seus discursos. Ao falar sobre a calamidade que destruiu o Estado onde perdeu para Bolsonaro, em 2022, ele também vem destacando a importância do agronegócio para a economia. As referências têm motivo: o agro e o segmento evangélico reúnem grande parte do eleitorado bolsonarista.
O conceito de que “família é sagrada”, por exemplo, foi usado por Lula para explicar por que ele vetou trechos de um projeto de lei, aprovado pelo Congresso, que proíbe a saída temporária de presos – a chamada “saidinha” – para visitar parentes em datas comemorativas.
“O que nós vetamos? A proibição de o cidadão ou cidadã que não tenha cometido crime hediondo, estupro, crime de pedofilia, poder visitar parentes. É coisa de família. Família é coisa sagrada, base principal da organização de uma sociedade”, disse o presidente, em café da manhã com jornalistas, no dia 23 de abril.
Em 2 de maio, após ver de perto a devastação em cidades gaúchas, Lula escreveu no X (antigo Twitter): “Como cidadão, eu vou rezar para que a chuva não castigue mais pessoas no Rio Grande do Sul. Como governante, farei tudo o que for possível para auxiliar os governos municipais e estaduais a remediar os danos às milhares de famílias.” No último dia 5, na segunda visita àquele cenário de guerra, o presidente voltou a se referir às orações que tem feito. “Sou um homem que crê muito em Deus”, afirmou.
O slogan “Fé no Brasil”, que embala a atual campanha do governo nas redes sociais e na TV, traz a concepção de que conquistas sociais e econômicas não são feitas nem para a esquerda nem para a direita. “É bom para todo mundo”, resume a propaganda, que tem o objetivo de quebrar a polarização, como aconselhou Sidônio, e joga luz sobre a família.
A campanha tanto mostra uma família em torno de uma mesa, num almoço de domingo, como, em outro filme, exibe os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento), Luiz Marinho (Trabalho) e Márcio França (Empreendedorismo) divulgando notícias positivas.
“Renda das famílias aumentou como não se fazia há mais de 27 anos”, diz Haddad. “Nós acabamos de fechar o mês de março com a menor taxa de desemprego no trimestre desde 2014″, destaca França.
Na prática, Lula acena para setores até hoje refratários à sua gestão, como o dos evangélicos e o do agronegócio, e tenta atrair a classe média. Embora sua queda de popularidade tenha estancado, de acordo com a maior parte das pesquisas em poder do Planalto, o cenário ainda é preocupante para o governo. E, com essa divisão do País, é ruim para todo mundo, principalmente em tempos de catástrofe, como a que atinge o Rio Grande do Sul, aliada à ausência de planos preventivos para evitar novas tragédias no meio ambiente.
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