Disputa pelo comando da ‘Fiesp do agro’ vai parar na Justiça

Fazendeiro Paulo Junqueira trava batalha pelo controle da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo, que congrega 235 sindicatos rurais, e tenta reverter decisão que derrubou sua chapa; atual direção da Faesp nega qualquer perseguição

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Foto do author Gustavo Côrtes
Atualização:

Com o apoio de aliados do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o fazendeiro Paulo Junqueira trava uma briga na Justiça para tentar se candidatar à presidência da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp), uma entidade que congrega 235 sindicatos rurais patronais e tem orçamento da ordem de R$ 60 milhões. Em outubro, ele protocolou uma chapa com mais de 50 produtores e dirigentes sindicais do setor, mas foi barrado por não apresentar a documentação necessária dos integrantes do grupo. Agora, tenta reverter a decisão na Justiça, apontando perseguição, o que a atual direção da Faesp nega.

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A preferência por Junqueira dentro do governo Tarcísio se dá não apenas pela proximidade com o empresário, que foi doador de campanha do governador em 2022, mas também pelos desentendimentos de integrantes da gestão com o adversário dele, Tirso Meirelles, atual vice-presidente da Faesp, que ocupava o comando do Sebrae-SP durante a transição. Na época, Tirso barrou a tentativa do governo de nomear Guilherme Campos (PSD-SP) na superintendência do órgão, tendo atuado para sustentar Marco Vinholi. No fim, nenhum dos dois ficou com a função e, agora, integrantes do governo querem dar o troco.

Ao tentar se candidatar ao comando da Faesp, porém, Paulo Junqueira recebeu notificação enviada pela entidade registrando falta de requisitos como a comprovação de pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) nos dois anos anteriores e o certificado de cadastro no INCRA. Diz ainda que Junqueira não informou o próprio RG.

Empresário Paulo Junqueira tenta se candidatar ao comando da Faesp Foto: Reprodução/Instagram Sindicato dos Produtores Rurais de Ribeirão Preto

O ruralista afirma, porém, ter juntado parte dos papéis que faltavam 72 horas após ser notificado e que os entregou na sede da entidade na data limite para o ato. Queixa-se ainda do tempo curto para cumprir as exigências. O edital de convocação para inscrição das chapas foi publicado no Diário Oficial no dia 4 de outubro, uma quarta-feira, e estabeleceu prazo de cinco dias para a apresentação de candidaturas. Foram contabilizados dois dias do fim de semana seguinte, o que, segundo ele, tornou o período exíguo para resolver pendências burocráticas.

Junqueira acusa seu adversário na disputa, Tirso Meirelles, de instrumentalizar o poder que detém na vice-presidência da entidade para inviabilizar uma chapa de oposição. Tirso é filho do presidente da organização, Fábio Meirelles, um produtor rural de 96 anos, dos quais metade passou no cargo.

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“Eles (Fábio e Tirso) puderam ver todos os documentos da nossa chapa para ver o que faltava e o que estava certo, mas não nós temos nenhum deles. Não sei se eles entregaram todos os documentos que foram exigidos de nós. Quando eu oficiei a Faesp pedindo essas informações, alegaram que não podiam fornecer por causa da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). É uma capitania hereditária, um feudo familiar. “, protesta Junqueira.

A diretora jurídica da Faesp, Angela Gandra Martins, rebate a versão e garante que a comissão eleitoral tem independência. Segundo ela, Junqueira não foi capaz de cumprir os ritos exigidos no estatuto da organização e agora tenta desmoralizar os Meirelles.

“Não houve nenhuma barreira para o Paulo. Ele denegriu. A democracia não é atacar pessoas, é apresentar propostas. Agora, sabendo que tem uma eleição, é preciso seguir as regras. Existe uma visão de que a Faesp é uma dinastia. O Dr. Fábio foi eleito pelos sindicatos.”

Tiro Meirelles, vice-presidente da Faesp, e filho do atual presidente, é adversário de Paulo Junqueira na disputa Foto: DIVULGAÇÃO

Os adversários da família dizem que representantes inscritos na chapa de Junqueira não conseguiram emitir documentos que comprovassem sua filiação sindical porque os presidentes de seus sindicatos apoiam Tirso.

“Desde o começo do ano, a eleição está aberta. O Dr. Fabio avisou que não sairia. Dissemos ao Paulo que ele poderia formar uma chapa. Os sindicatos há anos estão com o Dr Fabio e veem uma continuidade”, justificou Angela.

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Junqueira fez um pedido de tutela antecipada com o objetivo de obter liminar que o mantivesse na disputa. A juíza Marcia Sayori Ishirugi, da 23ª Vara do Trabalho de São Paulo, não atendeu ao apelo e realizou uma audiência com as partes nesta quarta-feira, 22, em que tentou, sem sucesso, costurar um acordo. O caso agora aguarda julgamento.

Entidade congrega mais de 200 sindicatos espalhados pelo Estado

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O imbróglio não se dá ao acaso. A Faesp mantém sob seu guarda-chuva 235 sindicatos rurais patronais distribuídos pelos 645 municípios paulistas. Também é acionista da Agrishow, principal feira do setor no País e que gerou R$ 13,29 bilhões em negócios na última edição, realizada em maio deste ano.

A organização ostenta um orçamento anual de aproximadamente R$ 60 milhões, acumulados mediante parcelas de contribuições sindicais, parcerias com governos e empresas e repasses do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), do sistema S, para oferecer cursos para produtores do campo.

O naufrágio de sua chapa na disputa pela Faesp frustrou aliados do governador Tarcísio de Freitas. O deputado estadual Lucas Bove (PL-SP) destacou o advogado Ygor Lucas Gomes da Costa, lotado como assessor em seu gabinete, para acompanhar o processo. Produtor rural, o parlamentar representa o agronegócio na Assembleia Legislativa e também recebeu contribuição financeira de Junqueira em sua campanha. Parte do secretariado de Tarcísio também não esconde a preferência por Junqueira.

“A preferência não é em relação a mim. É uma oxigenação. Não pode uma pessoa com 100 anos dirigir uma instituição tão importante. É igual ao PSDB, que ficou aqui 30 anos no poder e agora teve uma troca. A partir do momento que a chapa for montada, eu posso buscar apoio do governador, do ministro da Agricultura”, afirma Paulo Junqueira.

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Embate com o governo começou ainda na época do Sebrae

A preferência de aliados de Tarcísio por Paulo Junqueira se explica também por outro embate. O grupo do governador já havia entrado em rota de colisão com Tirso Meirelles ainda no período da transição de governo, quando este ocupava a presidência do Sebrae-SP. Na época, Guilherme Afif Domingos, atual secretário especial de Projetos Estratégicos de São Paulo, tentou emplacar o ex-deputado federal Guilherme Campos (PSD-SP) na superintendência do órgão.

Tirso e um grupo de tucanos fizeram pressão para manter Marco Vinholi no cargo. Diante do impasse, uma solução intermediária foi adotada. Nelson Hervey Costa assumiu a superintendência e Vinholi passou para o posto de diretor técnico.

Com isso, Campos ficou sem espaço no governo do Estado e, meses depois, foi nomeado para a superintendência regional do Ministério da Agricultura em São Paulo. Seu partido, o PSD, é base do governo Lula e comanda a pasta, com Carlos Favaro.

Paulo Junqueira é presidente do Sindicato Rural e da Associação Rural de Ribeirão Preto e foi um dos doadores das campanhas de Tarcísio e também do ex-presidente Jair Bolsonaro em 2022. Ele doou R$ 160 mil para um e R$ 106 mil para o outro. Sua casa de quatro suítes em Orlando, na Flórida, abrigou o ex-presidente durante parte do período em que passou nos Estados Unidos após perder a reeleição para Lula. Ele também ofereceu um almoço a Bolsonaro e aliados em sua fazenda durante a Agrishow, realizada em Ribeirão Preto, onde foi carregado a tiracolo pelo ex-presidente.

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