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Comitê de Bolsonaro culpa Guedes por estagnação eleitoral do presidente; leia bastidor

Auxiliares do presidente confidenciam, reservadamente, que o titular da Economia “mais atrapalha do que ajuda” a campanha, após casos do Farmácia Popular, Merenda e Auxílio Brasil

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Foto do author Felipe Frazão
Atualização:

BRASÍLIA - O ministro da Economia, Paulo Guedes, virou alvo de fogo amigo no comitê do presidente Jair Bolsonaro. Nas reuniões de coordenação da campanha, em Brasília, Guedes é responsabilizado pelo cenário desfavorável e pela estagnação do presidente em pesquisas de intenção de voto.

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A queixa já existia, mas se ampliou. Auxiliares do presidente confidenciam, reservadamente, que o titular da Economia “mais atrapalha do que ajuda” a campanha. Na avaliação de aliados de Bolsonaro, Guedes abriu flancos, nas últimas semanas, para que adversários agissem contra Bolsonaro.

A campanha passou a lidar com uma onda negativa de notícias econômicas depois que o governo enviou ao Congresso a proposta de Lei Orçamentária Anual de 2023. Com a peça, Guedes municiou a oposição com o corte de 60% dos recursos do programa Farmácia Popular, para beneficiar o direcionamento de verbas ao orçamento secreto, como revelou o Estadão. A redução de R$ 1,2 bilhão afetará a distribuição de ao menos 13 medicamentos de asma, diabetes, hipertensão e até fraldas geriátricas.

O comitê de campanha do presidente Jair Bolsonaro tem se queixado da atuação do ministro Paulo Guedes. Foto: Miguel Schincariol / AFP

Sob pressão, o próprio Guedes veio a público para dizer que, após a eleição, o presidente enviará ao Congresso uma mensagem para “reelaborar” o orçamento. O ministro disse que o orçamento secreto “comprime gastos dos ministérios e, acidentalmente, pode ter um desencaixe”.

O total de recursos para os medicamentos caiu de R$ 2,04 bilhões no Orçamento de 2022 para R$ 804 milhões no projeto de 2023, enviado ao Congresso em 31 de agosto. Um corte de R$ 1,2 bilhão. Para o orçamento secreto, foram reservados R$ 19,4 bilhões.

O orçamento elaborado pela equipe de Guedes previu recursos para pagamento de R$ 400 no Auxílio Brasil, a partir do ano que vem, em vez dos R$ 600 propagandeados pela campanha bolsonarista. Tanto Bolsonaro quanto Guedes dizem que os recursos estão garantidos, seja por meio de um decreto de calamidade ou pela taxação de grandes fortunas. Mas a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a explorar que a promessa de Bolsonaro não é confiável, porque prometeu uma coisa (R$ 600) e fez outra (R$ 400).

Também entrou na conta do ministro a escassez de recursos para a merenda escolar, escancarada por atitudes como professores que carimbam crianças para não repetirem a refeição e escolas nas quais quatro estudantes repartem apenas um ovo. Como mostrou o Estadão , os repasses federais ao Programa Nacional de Alimentação Escolar não são reajustados desde 2017 e Bolsonaro vetou a correção dos valores pela inflação. O governo repassa somente R$ 1,07 por aluno em creche, R$ 0,53 em pré-escola e R$ 0,36 nos ensinos fundamental e médio.

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Há queixas de que Guedes não conseguiu resolver a inflação nos alimentos, por exemplo, enquanto dados mostram o avanço da fome do País. A economia é ainda o maior obstáculo para a reeleição do presidente, na avaliação de integrantes do núcleo de coordenação da campanha.

Bolsonaro enfrenta dificuldades eleitorais justamente na parcela mais pobre da população, que depende de programas sociais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera, em pesquisas de diferentes institutos, as intenções devoto de pessoas que ganham até dois salários mínimos.

Dados da pesquisa da Quaest/Genial Investimentos, divulgados nesta quarta-feira, dia 20, mostram que 75% dos eleitores não perceberam redução do preço dos alimentos, em contraposição à queda nos combustíveis, notada por 81%. Na energia elétrica, 50% não viram impacto. Além disso, 59% dos eleitores consideram que as medidas econômicas do governo têm como objetivo ajudar a eleição de Bolsonaro, enquanto 36% acham que o motivo seria melhorar a condição de vida das pessoas.

Para integrantes do comitê, os cortes impactaram a capacidade de Bolsonaro tirar proveito político do pacote de benefícios injetados pelo governo de forma inédita, às vésperas da campanha, com aval do Congresso.

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Ala política entende que os benefícios chegaram tarde demais e reconhece que o retorno eleitoral foi para Lula, como indicam as pesquisas. Ministros do Centrão contava com série de benesses concedidas pelo governo durante a campanha, garantidos somente até o fim do ano, como trunfo para alavancar Bolsonaro. O pacote teve aumento do Auxílio Brasil para R$ 600, aumento do vale-gás, pagamento de ajuda de R$ 1 mil a caminhoneiros e taxistas e gratuidade para idosos no transporte coletivo.

O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, defendia que o benefício tivesse chegado a R$ 800. Integrantes da campanha lembram que Guedes chegou a anunciar o auxílio emergencial, pago durante os meses de pandemia em 2020, em somente R$ 200. O valor subiu por negociação política no Congresso.

O Ministério da Economia não quis se manifestar sobre as críticas. Guedes já afirmou que a responsabilidade pelos cortes não é sua, mas da Casa Civil. “Ministro da Economia não corta nada. Quem corta é a Casa Civil”, disse quando questionado sobre o impacto no programa Farmácia Popular, apontando diretamente para o ministro Ciro Nogueira (Progressistas), um dos mais influentes na campanha e com poder sobre o orçamento. Integrantes da equipe do ministro dizem que os acordos políticos não foram de Guedes. O corte linear de 60% dos gastos ocorreu para acomodar no Orçamento do ano que vem a previsão de R$ 19,4 bilhões em emendas do orçamento secreto, controlado pelos aliados de Bolsonaro no Centrão, conforme havia sido previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Bolsonaro optou por não vetar essa reserva.

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Apesar da insatisfação interna na campanha, os principais trunfos que estrelam as propagandas de Bolsonaro na TV, rádio e nas redes são da área econômica: recuo no desemprego para 9,1%, menor taxa em sete anos, projeções de crescimento do Produto Interno Bruto, que atingiu 1,2% no segundo trimestre, a deflação nos últimos dois meses e as baixas no preço de combustíveis e energia. Sobre o valor de R$ 600 do auxílio social, que não surtiu o efeito político esperado e favoreceu Lula, os aliados do ministro dizem que foi definido dentro de critérios para respeitar a responsabilidade fiscal.

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